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Foto: Givaldo Barbosa/O Globo |
Que raciocínio tosco o de Lula
ao traçar um paralelo entre gastos do governo com anúncios em rádio, televisão
e jornal, e gastos com patrocínio de congressos como o da União Nacional dos
Estudantes (UNE) realizado na semana passada, em Goiânia.
Lula está cansado de saber que
feijoada com paio nada tem a ver com Cid Sampaio. Mas como aposta na ignorância
alheia...
Cid Sampaio foi um político da
extinta União Democrática Nacional (UDN). Governou Pernambuco entre 1959 e
1963. Químico industrial e usineiro, se opôs ao golpe militar de 1964, mas em
seguida aderiu à Arena, partido do governo. Elegeu-se deputado federal. E, mais
tarde, como suplente, assumiu uma vaga no Senado.
Entrou nessa história por
causa do paio, que ganhou lugar aqui por causa da mania de Lula de apelar para
falácias. É mestre do engodo.
Por que o governo gasta muito
dinheiro com anúncios? Ora, para “vender suas realizações”. Em muitos casos,
para contar também com a boa vontade de uma imprensa servil, colaboracionista e
chapa-branca.
Anunciar, portanto, atende aos
seus interesses – dos legítimos aos inconfessáveis.
Um veículo de comunicação só
pode se comportar com independência, exercendo seu papel de fiscal rigoroso dos
poderes públicos e privados, se for economicamente independente.
É uma pena que por toda parte
tão poucos de fato o sejam.
Mas desses, registre-se, não
se queixam políticos como Lula. Pelo contrário.
Queixam-se, sim, daqueles que
não podem controlar de um jeito ou de outro. Daqueles que não se orientam por
sua cartilha ideológica. Daqueles que acertando ou errando teimam em tentar
corresponder às expectativas do distinto público.
A presidente Dilma Rousseff
tem demonstrado compreender melhor do que Lula para que serve a imprensa.
Um governo sábio tira partido
das críticas da imprensa para tentar governar melhor. Um governo sábio enxerga
na imprensa um aliado e aproveita suas denúncias para corrigir o que anda mal.
Quanto ao Congresso da UNE...
O dinheiro gasto com ele por
ministérios e empresas estatais atende a um único e censurável objetivo: o de
manter sob rédea curta, curtíssima, a mais conhecida das entidades estudantis.
Cooptá-la já não é mais
preciso. Cooptada ela já foi desde que chegaram ao poder os partidos que a
dominam.
Até o golpe militar de 1964, a
UNE freqüentava os salões da República, mas não era sócia dos seus donos. A
eles se opunha com alguma freqüência e com maior ou menor virulência.
Talvez por isso fosse
respeitada e temida. Mais de uma vez os presidentes Juscelino Kubistchek e João
Goulart, por exemplo, foram obrigados a negociar com ela.
Formalmente extinta pelo
golpe, a UNE sobreviveu ao incêndio de sua sede no bairro do Flamengo, no Rio,
articulou-se com o resto da oposição e liderou em todo o país gigantescas
manifestações de massa contra o regime dos generais.
As reivindicações específicas
dos estudantes cederam a vez à reivindicação coletiva por liberdade.
Em 2003, o partido que manda
na UNE há décadas, o PC do B, subiu a rampa do Palácio do Planalto junto com o
PT de Lula. E foi a partir daí que a UNE esqueceu a sua história e vendeu sua
alma.
Apequenou-se. Acabou entrando
para o elenco dos chamados “movimentos sociais”, todos eles alimentados por
verbas do governo.
A lei da anistia só prevê
reparações de caráter pessoal a familiares e vítimas da ditadura de 64.
O governo Lula aprovou outra
lei no Congresso para permitir que a UNE recebesse a título de reparação uma
bolada de R$ 44.6 milhões destinada à construção de sua nova sede – um prédio
de 13 andares, projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer.
Hoje, a UNE que em 1940
defendeu o fim da ditadura do Estado Novo, que em 1942 pregou o apoio aos
Aliados contra o nazismo, que em 1956 combateu nas ruas do Rio o aumento do preço
da passagem dos bondes, e que no início dos anos 60 criou o Centro Popular de
Cultura, não passa de uma fotografia desbotada pela ação do tempo.
Texto: Ricardo Noblat, O Globo, 18-07-2011
Edição: JP
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