Sandro Vaia
A ferocidade implacável com
que a presidente da República Dilma Roussef se atirou à operação limpeza no
ministério dos Transportes, demitindo ou provocando a demissão de 16 pessoas em
menos de duas semanas, provocou um frisson nos meios políticos, desacostumados
à prática de ações tão enfáticas partindo do centro do Executivo contra
parceiros no usufruto do poder.
As reações são as mais
diversas. Os analistas políticos estão preocupados em tecer teorias explicando
as diferenças de estilo entre Dilma e seu antecessor.
Lula, todos se lembram, se
especializou em oferecer o aconchego do peito amigo aos transgressores
apanhados em flagrante cometendo malfeitos durante o seu governo.
Os mensaleiros eram, primeiro,
companheiros desavisados que faziam coisas erradas à sua revelia; depois foram
transformados em vítimas de uma pérfida conspiração
oposicionístico-midiático-policial-judiciária que ele se encarregaria de
desmascarar quando deixasse o poder.
Os compradores de falsos
dossiês para caluniar adversários numa campanha eleitoral, foram tratados quase
paternalmente como “aloprados”, meninos travessos que chutaram a bola da pelada
na vidraça da janela da vizinha.
O que espanta mais é que o
esquema encastelado no Ministério dos Transportes que a presidente parece
empenhada em destruir, foi montado durante os governos anteriores, com o
aparente beneplácito de seu antecessor e inventor, criador, conselheiro e
avalista político.
Impossivel acreditar que o
esquema escapasse ao olhar atento e agudo da chefe da Casa Civil e à sua fama
de implacável gerentona.
O que aconteceu, então? A
velha história da revolta da criatura contra o criador?
Menos. Não há nenhum motivo
para acreditar numa ruptura de idéias, princípios e afinidades entre criatura e
criador. Sempre que pode, Dilma presta tributo à “herança bendita” que lhe
deixou o antecessor, e este sempre retribui a gentileza com outros tantos
elogios e até propondo a candidatura de sua discípula à reeleição.
Dizem os analistas políticos,
os que ouvem nas entrelinhas e têm espiões nas ante-salas, que ele está
apoiando as ações da sucessora, mas está preocupado com a “governabilidade”.
Ele nunca foi tão ríspido com a base aliada, nunca sequer ameaçou tirar-lhes o
pirulito da boca.
O que parece mais provável é
que esteja ficando evidente a diferença de temperamento entre Dilma e Lula. O
PR, que é o partido aliado mais diretamente atingido pela razzia nos
Transportes, está recorrendo à chantagem direta como forma de ação política,
ameaçando retirar-se da base do governo assim que terminar o recesso. E quanto
mais o PR ameaça, mais a presidente parece irritar-se.
A impaciência, a irritação, o
pavio curto e a falta de cintura podem não ser exatamente um modelo de estilo
de atuação política, principalmente num país de achegos e conchavos.
E Dilma vai construindo seu
paradoxo: quanto mais inábil politicamente for, mais apoio terá na sociedade e
menos nos círculos onde se constrói a partilha do poder.
Sandro Vaia é jornalista. Foi
repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista
Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O
Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla)
sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez. E-mail: svaia@uol.com.br
Publicado no Blog do Noblat,
22-07-2011
Colaboração: Camila Silva
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