“Devemos defender com
redobrado vigor os valores democráticos, multiculturais e laicos que
caracterizam nossa civilização, mas ao mesmo tempo nos precavermos,
anteciparmos e termos a capacidade de enfrentar os psicopatas sedentos de
sangue”
O mais sinistramente curioso e
significativo do atentado com carro bomba e do massacre de jovens em Oslo é que
a chacina praticada por um (aparentemente) solitário fanático de
extrema-direita cristã (!) poderia perfeitamente tê-lo sido pelos djhadistas da
Al Qaeda. Ou seja, para manifestar seu ódio ao islã, Anders Breivik praticou
atentados que pareciam levar a marca registrada de Osama Bin Laden. Mas seus
alvos foram prédios públicos do governo e adolescentes noruegueses, não
imigrantes muçulmanos. Da mesma forma que a imensa maioria de vítimas do
terrorismo islâmico no Iraque, Paquistão, Argélia, Afeganistão, Yemen, Somália,
Arábia Saudita e outros países onde o terrorismo djihadista esteve mais ativo é
constituída de muçulmanos.
A simetria perfeita dos
psicopatas de um ou outro bando mostra perfeitamente o quanto a referência
religiosa ou cultural é totalmente acessória, mais um pretexto do que uma
justificação, por mais elaborados e prolixos que sejam seus discursos. É
impressionante como o matador de Oslo usa exatamente as mesmas técnicas, armas
e ferramentas de comunicação – carros bomba com explosivos feitos de
fertilizantes agrícolas, uso da internet e das redes sociais para veicular suas
idéias – que os djihadistas. Mais: a referência às cruzadas como foco de um
enfrentamento entre islã e cristianismo.
Anders Breivik |
A diferença entre Anders
Breivik e Mohament Atta, o chefe dos terroristas de 11 de setembro, é que
Anders não se dispôs de forma alguma ao martírio. Assim que a policia norueguesa
se aproximou, ele deixou seu poderoso armamento e entregou. Seu objetivo é
claro: esse frio psicopata deseja a glória de tornar-se um preso famoso, um
líder político, que, nas condições benevolentes do sistema penal daquele país
nórdico, poderia sair após 20 anos, com cinquenta e poucos anos. Fica na
situação que Bin Laden gozaria se o comando do Navy Seals não o tivesse
executado sumariamente. Receio que a publicidade em torno dele, de seu
manifesto de 1500 páginas, de sua operação técnica e taticamente eficiente e
implacável, na tradição nazista, não produza sua corte de seguidores.
A conclusão, que vale
inclusive para o Brasil, é que devemos defender com redobrado vigor os valores
democráticos, multiculturais e laicos que caracterizam nossa civilização, mas
ao mesmo tempo nos precavermos, anteciparmos e termos a capacidade de enfrentar
os psicopatas sedentos de sangue que encontram na intolerância religiosa,
étnica, racial ou ideológica pretexto para matar. Pode acontecer em qualquer
lugar improvável. Até na Noruega…
Alfredo Sirkis, Congresso em Foco, 26-07-2011
* Deputado federal pelo
Partido Verde (RJ), do qual é um dos fundadores, tem 60 anos, e foi secretário
de Urbanismo e de Meio Ambiente da cidade do Rio de Janeiro e vereador.
Jornalista e escritor, é autor de oito livros, dentre os quais Os carbonários
(Premio Jabuti de 1981) e o recente Ecologia urbana de poder local. Foi um dos
líderes do movimento estudantil secundarista, em 1968, e viveu no exílio
durante oito anos.
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