sábado, 24 de dezembro de 2011

Portugal e Socialismo: como a coisa funciona ao rés-do-chão


Ramiro Marques

Viciados em Socialismo

Os professores são, a par dos enfermeiros, um grupo profissional que se habituou à ideia de que o Estado tem a obrigação de dar emprego certo, permanente e seguro a todos os diplomados que deixam as universidades e politécnicos com um diploma que diz "licenciado ou mestre em ensino ou em enfermagem".

Durante décadas, assim foi. Os governos ficaram reféns dos sindicatos e dos interesses corporativos e foram insuflando a bolha dos serviços públicos, inchando-a para acomodar todos os diplomados em ensino e enfermagem que, anos após ano, iam saindo das universidades e politécnicos com um diploma na mão.

Escudados em estatutos da carreira que eram autênticas vias rápidas para o topo, o vício do socialismo entranhou-se nestes dois grupos profissionais. A pouco e pouco, a fraqueza dos governos foi acomodando e formatando os serviços públicos de educação e saúde aos interesses corporativos e à cultura dos direitos adquiridos e do emprego certo para toda a vida. A pressão dos sindicatos e a fraqueza dos governantes foram criando mil e um regulamentos, normas e regimes de exceção que tornaram os sistemas autênticos monstros ao serviço das clientelas corporativas, aumentando-lhes o tamanho ao ritmo das pressões dos que também queriam entrar neles. Até que o socialismo estoirou como estoira sempre que o dinheiro dos outros acaba.

E estoirou em junho de 2011 quando o Governo Socialista, incapaz de cumprir os compromissos com os salários e pensões, se viu obrigado a pedir assistência financeira à troika.
Foi então que a bolha começou a minguar. Não por vontade dos governantes; apenas porque o dinheiro acabou e a troika obriga a um programa de emagrecimento.

De repente, o mundo dos professores e enfermeiros começou a ruir. Um mundo laboriosamente construído com o dinheiro dos outros e que era um paraíso, sempre em construção, na direção da perfeição, pendurado num Céu de direitos adquiridos e conquistas civilizacionais.

O mundo ruiu. E o que propõem professores e enfermeiros? Que acabem com a concorrência e e liberdade de cada um escolher a sua vocação e assumir as responsabilidades e os riscos da escolha.

Já que o Estado deixou de poder dar emprego certo, permanente e seguro a todos os diplomados em ensino ou em enfermagem, os viciados em socialismo exigem agora que o Estado feche os cursos que formam professores e enfermeiros. A solução é: acabem com a concorrência e voltem a colocar o Estado e os governos reféns de grupos profissionais protegidos.

O socialismo faliu? Qual é a solução? Mais socialismo.

Não resisto a contar uma história que ilustra o que disse atrás. É a história de duas pessoas que eu conheço, uma delas muito próxima.

A Teresa fez a licenciatura em Engenharia Biológica no Técnico. Optou pela investigação, ficou no Técnico a fazer o mestrado e o doutoramento. Primeiro com bolsa de investigação, depois de doutoramento e, por fim, de pós-doutoramento. Atualmente faz investigação numa universidade com uma bolsa de pós-doutoramento. Vários artigos científicos publicados nas melhores revistas internacionais. Tem 34 anos de idade, ganha 1300 euros por mês, não tem direito a subsídios de férias nem de Natal. O contrato é temporário. Corre o risco de ficar sem nada assim que a bolsa de pós-doc termine. Isso não a preocupa. Tem uma rede de contactos internacionais e sabe que o Mundo é o seu local de trabalho. Fala fluentemente inglês e francês. Nunca teve emprego certo nem sequer direito a subsídio de desemprego ou a subsídio de férias ou de natal. Se a Teresa adoecer, perde os projetos e fica sem bolsa.

A Isabel terminou a licenciatura de professora do 1º CEB em 1999. Nunca esteve desempregada. Primeiro, lecionou numa escola privada. Depois, entrou para o sistema público. Aos 28 anos de idade já estava efetiva. Ganha mais do que a Teresa, até 2012 teve direito a 14 salários por ano, tem emprego seguro, certo e permanente. Se a Isabel meter baixa prolongada, mantém a segurança no emprego e o direito a ser avaliada de Bom para todo o período de duração da baixa, possa ser ela de um mês ou de vários anos.

A Teresa aprendeu a gostar do risco e sabe que o futuro dela depende daquilo que ela for capaz de fazer para rentabilizar o talento e os conhecimentos.

A Isabel está viciada em socialismo. Tem apenas 34 anos de idade mas volta e meia fala na reforma e não pára de lamentar a perda dos direitos adquiridos.

Duas mentalidades, duas culturas, duas formas de encarar a vida e o mundo. Portugal precisa, como de pão para a boca, de portugueses como a Teresa.
Texto: Professor Ramiro Marques, no “ProfBlog”, 24-12-2011
Colaboração e Título: Ari
Edição: JP

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