Jarbas Passarinho
O mensalão chega ao limite dos
prazos judiciais para a sua apuração às vésperas de consumar a absolvição
coletiva dos denunciados, por efeito da prescrição voluntária. Os quatro anos
decorridos, entre hoje e a denúncia da “organização criminosa”, assim denominada
pelo honrado procurador-geral da República, Antônio Souza, ao Supremo Tribunal
Federal, em agosto de 2007, foram fruto de manobras protelatórias dos advogados
e da tardança tradicional da Justiça. Já causaram a prescrição do crime de
formação de quadrilha que pesa sobre José Dirceu, “chefe da quadrilha dos 40”,
assim qualificado na denúncia. Daí a preocupação com a possível prescrição
total em 2012, ano final para o voto do relator, Joaquim Barbosa.
O processo avança a passo de
cágado, agora sob a ameaça da declaração pública, intempestiva do voto
anunciado pelo ministro Ricardo Lewandowski, revisor do processo, a quem cabe
falar imediatamente e obrigatoriamente após receber o relatório, para opinar.
Dizendo-se compelido a ler e opinar sobre mais de 2 mil páginas do processo, de
que já recebera cópia e acaba de receber o original das mãos do ministro
Barbosa, alega só poder fazê-lo em 2013.
Nessa data, estaremos há um
ano de cumpridos todos os prazos para o voto final do ministro Joaquim Barbosa.
Então dois ministros de conhecida inclinação para votar contra os mensaleiros
terão deixado o STF por terem mais de 70 anos, obrigando-os à aposentadoria
compulsória. Informa a revista Veja — edição de 21 de dezembro de 2011 — que “o
voto anunciado do ministro Lewandowski criou um enorme mal-estar entre os
colegas do Supremo Tribunal Federal”, pois tornaria o processo totalmente
perempto.
Certamente não esperava que o
relator, mediante grande esforço físico e mental, iria remeter-lhe o processo
pronto para a revisão, como já o fez. Antecipou sua disposição de, recebido de
volta o relatório com o parecer do revisor, estará pronto para apresentar seu
voto final habilitando o STF a iniciar o julgamento em abril. No relatório,
antecipa voto, condenando desde logo José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares,
líderes do PT e Marcos Valério, organizadores “do mecanismo que possibilitou ao
governo de Lula desviar milhões de reais dos cofres públicos para financiar
campanhas políticas e subornar deputados”.
O desafio do maior escândalo
ocorrido logo no segundo ano do primeiro mandato de Lula abateu muito o então
presidente. Sua popularidade desabou de 80% para 20%. Dizendo-se traído, foi
acreditado. Cumpriu o conselho do seu ministro da Justiça, criminalista famoso,
e passou a dizer que se tratava de “inocente caixa dois”. Desde então, os
mensaleiros viraram vítimas de uma farsa.
A leniência de ontem é trocada
hoje pelo combate aos acusados de má conduta, exceção para o companheiro de
guerrilha. O atual ministro de Estado Fernando Pimentel é o caso. Companheira
de crença ideológica que perfilhou quando, ainda estudante, a hoje presidente
deixou-se empolgar pela paixão revolucionária que dominou o século 20. No
discurso de posse na Presidência da República declarou que não se arrependia e
tinha orgulho desse passado.
Já o ministro Pimentel, não.
Em resposta aos que o atacam da prática de suspeita relação financeira com a
Federação das Indústrias de Minas Gerais, quando deixou a Prefeitura de Belo
Horizonte, sempre foi democrata toda a sua vida e pela defesa da democracia
lutara contra a “ditadura militar”. Não é verdade. Desde sua filiação à facção
marxista Colina, de estudantes de Minas Gerais, usando codinome, foi colega da
jovem que hoje é presidente da República e do destacado líder Daniel Aarão
Reis, mais tarde preso e exilado. Pois é Daniel quem o desmente por escrito
para os jornais. Afirma que nenhum documento da guerrilha fala em luta pela
democracia. Confirma-o também para a mídia Fernando Gabeira, enquanto José Dirceu
acrescenta que a versão falsa foi um artifício usado a partir da luta pela
anistia, por ser mais aceitável para com a opinião pública.
Quando eclodiu a série de
desonestidades no Dnit do Ministério dos Transportes, o noticiário da mídia foi
profuso em relação às fraudes em vários dos convênios para transposição de
águas do Rio São Francisco para a região do semiárido do Nordeste. Obra de
vulto faraônico do PAC, está praticamente paralisada por falta de verba para
prosseguir os trabalhos. Aproveitando-se disso, houve quem se utilizasse da
ausência da fiscalização permanente e desviasse máquinas do patrimônio da União
para uso próprio ou para projetos do mesmo programa em curso, não importa.
Havia, entre os convênios,
alguns a cargo do Exército. Fiquei confiante como sempre na tradicional
reputação respeitável colhida pela Engenharia Militar de Construção. Os civis
responsáveis pelos desvios foram demitidos. A honestidade, nunca antes manchada
e por isso dela colhida em obras civis associadas, horrorizou-me vê-la pela
primeira vez moralmente ofendida. Temos orgulho desde a existência do Exército,
de centenas de anos, de conduta inatacável. Antes da eclosão pública e política
das fraudes, o Exército já havia aberto inquérito que certamente trará consequências
cuja gravidade é incompatível com generosidade para com quem enlameou a honra
da instituição.
Título e Texto: Jarbas
Passarinho, Correio Braziliense, 27-12-2011
Colaboração: Rafael Picate
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