Ou: Disputa do dia 26 será, sim, entre
progressistas e reacionários
Reinaldo Azevedo
Os respectivos pronunciamentos
feitos pelos três principais candidatos à Presidência da República refletem o
que foi a campanha até aqui e os lances, vá lá, até certo ponto dramáticos
destes últimos dois meses, mormente depois da queda do avião que conduzia
Eduardo Campos, no dia 13 de agosto. Começo por aquele ao qual se deve dar mais
atenção no momento. Marina Silva, candidata derrotada do PSB, leve como há
muito tempo não se via, sorridente, com ar pacificado, acenou com o apoio ao
tucano Aécio Neves. Reproduzo trecho de sua fala:
“Sabemos que o Brasil sinalizou
que não concorda com o que está aí, e sabemos que uma boa parte do Brasil,
desde 2010, vem dando sustentação a uma mudança que seja qualificada. A postura
que eu tive quando não foi aceito registro da Rede pode ser uma tendência. Eu
assumi um compromisso com a mudança indo apoiar o Eduardo Campos (…) O Brasil
sinalizou que não concorda com esse projeto, que quer uma mudança qualificada,
temos uma clareza do que representamos. Nós vamos fazer essa discussão, os
partidos individualmente, e depois vamos dialogar, mas, estatisticamente, a
sociedade mostra isso, não há de tergiversar com o sentimento de 60% dos
eleitores”.
Ora, as palavras fazem
sentido, não é mesmo? Marina, assim, deixa claro, com todas as letras, que
tanto Aécio Neves, do PSDB, como ela própria representam a mudança. É cedo para
dizer se ela vai dar um apoio formal ao candidato tucano, mas a sua fala parece
apontar para isso. E que fique claro: na nova ou na antiga políticas, um apoio
no segundo turno não implica, necessariamente, se comprometer com o futuro
governo. Aliás, o primeiro turno de uma eleição pede o voto da convicção; o
segundo, o da possibilidade. De resto, Marina não deve ignorar que a sua
meteórica ascensão, logo depois de se fazer candidata, se deu com os votos
daqueles que estavam interessados em apear o PT no poder. Parte deles voltou ou
migrou para Aécio. Mas um mesmo sentimento une os dois eleitorados.
Aécio também fez um aceno à
união, embora não tenha se referido diretamente a Marina Silva — e nem seria o
caso. Disse: “A minha primeira constatação é que este sentimento de mudança
amplamente presente no Brasil foi vitorioso no primeiro turno. Os candidatos de
oposição somados foram vitoriosos, tiveram a maioria dos votos. E é isso que
nós temos que buscar agora no segundo turno. Eu me sinto extremamente honrado
em ser o representante desse sentimento nessas três semanas que nos separam da
eleição”, afirmou.
O tucano mandou a mensagem
também a Pernambuco, que votou esmagadoramente com Marina e elegeu um senador
do PSB: “A ele [Eduardo Campos], aos seus ideais e aos seus sonhos também, a
minha reverência. E nós saberemos transformá-los em realidade. Portanto, é hora
de unirmos as forças. A minha candidatura não é mais a candidatura de um
partido político ou de um conjunto de alianças. É um sentimento mais puro de
todos os brasileiros que ainda têm capacidade de se indignar, mas
principalmente a capacidade de sonhar”.
Aécio sabia bem, enquanto
falava, que, mesmo no PSDB, ele chegou a ser, num dado momento, um dos poucos
que ainda acreditavam. Não tergiversou em nenhum momento, não fraquejou, não
desanimou. Enfrentou, sim, Marina Silva — afinal, havia uma única vaga em disputa
no segundo turno, mas foi um confronto leal.
Dilma Rousseff, a
presidente-candidata do PT, certamente surpresa — com o seu desempenho bem
abaixo do que indicavam as pesquisas, e com o de Aécio bem acima —, foi a que
transmitiu mais tensão no discurso, no tom e na aparência. Mesmo no que deveria
ser uma fala de agradecimento, percebeu-se, mais uma vez, a pregação do medo.
Disse: “O povo brasileiro não quer de volta o que nós podemos chamar de
fantasmas do passado, que quebraram esse país três vezes, com juros que
chegaram a 45%, desemprego massivo, arrocho salarial e jamais promoveram,
quando tiveram a oportunidade, políticas de inclusão social e redução da
desigualdade”.
Bem, o Brasil não quebrou três
vezes; o aumento real de salário mínimo foi maior nos governos FHC do que no da
própria Dilma, e o controle da inflação significou, com o Plano Real, uma das
medidas mais efetivas em favor da inclusão social de que se têm notícia. Mas
não me estenderei sobre isso agora. O que foi verdadeiramente notável no
discurso da presidente foi a promessa de que ela fará um governo diferente.
Insistiu muito que será uma gestão nova, com ideias novas e pessoas novas.
Chegou a afirmar que entendeu o recado das urnas. Ou por outra: Dilma prometeu
que, se reeleita, não dará continuidade ao governo… Dilma!
Já deu para sentir o que vem
por aí. Aécio, com o possível apoio de Marina, tentará fazer uma disputa sobre
o futuro do país, e Dilma insistirá em travar uma batalha de versões sobre o
passado. O eleitor terá de optar entre os discursos progressista e reacionário.
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, 6-10-2014
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