![]() |
Foto: Fabian Bimmer/Reuters |
O Estado de S.Paulo
A presidente Dilma Rousseff
tem fortes motivos para se preocupar com a enxurrada de euros, dólares e libras
lançada nos mercados por três dos maiores bancos centrais do mundo rico. Essa
inundação de moeda - tsunami, segundo ela - é realmente prejudicial ao Brasil e
a outras economias em desenvolvimento. Mas nenhum problema será resolvido com
sua peroração contra as políticas fiscal e monetária adotadas para combater a
crise nos Estados Unidos, na zona do euro e no Reino Unido. A presidente exibe
uma evidente inclinação para um velho esporte latino-americano - atribuir aos
outros toda a responsabilidade por seus infortúnios e fazer muito menos que o
necessário e possível para corrigir as próprias deficiências. Ela tem um motivo
legítimo para preocupação, mas os brasileiros têm dois: o efeito cambial da
inundação monetária e a pouca disposição do governo para cuidar seriamente dos
problemas internos de competitividade.
A chanceler alemã Angela
Merkel prometeu e já deve ter explicado à presidente brasileira a estratégia
europeia de combate à crise, determinada em grande parte pelos políticos da
Alemanha. Essa estratégia inclui um forte aperto fiscal na maior parte dos
países, porque quase todos enfrentam graves desajustes orçamentários e têm
pouco espaço para aumentar seus gastos. De fato, até poderiam gastar um pouco
mais e aumentar o estímulo fiscal à recuperação, como propõem as autoridades
brasileiras, mas isso os líderes alemães não aceitam. A crise tem sido atenuada
pela expansão monetária promovida pelo Banco Central Europeu (BCE), formalmente
autônomo em relação aos governos da zona do euro. O dinheiro emitido para
operações de socorro - cerca de 1 trilhão só a partir de dezembro - tem dado
algum alívio aos Tesouros e alguma segurança adicional aos bancos.
Ontem, um repórter perguntou à
presidente Dilma Rousseff, na Alemanha, se, ao se queixar à chanceler alemã, o
governo brasileiro não estaria sugerindo uma intervenção na política,
legalmente autônoma, do BCE. "Não" respondeu a presidente, "e
sabe por quê? Por que estão interferindo na nossa." Não está claro se ela
entendeu a pergunta, mas pelo menos quanto a um ponto não há dúvida: sua
resposta indica uma confusão entre fatos muito diferentes.
Qualquer decisão econômica tomada num grande país ou bloco importante pode afetar positiva ou negativamente a economia de outros países, sem, no entanto, violar sua autonomia. Brasília não violou a autonomia argentina, quando sancionou a desvalorização do real em janeiro de 1999. Foi uma ação direta sobre o câmbio. No caso da enxurrada de euros, o efeito cambial é indireto. Tampouco se pode atribuir aos dirigentes do BCE a intenção de mexer indiretamente no mercado cambial ou de criar uma barreira protecionista - acusação formulada pela presidente brasileira. Ao contrário do BCE e do Federal Reserve, dos Estados Unidos, o governo chinês tem uma clara política de subvalorização cambial, muito raramente citada pelo governo brasileiro.
Políticas cambiais pertencem,
ainda, à jurisdição exclusiva de cada país, embora afetem diretamente as trocas
internacionais. Mas o assunto, apesar do justificável empenho brasileiro,
continua fora da pauta oficial da Organização Mundial do Comércio (OMC). Muito
menos sujeita ao controle externo é a política monetária, e há excelentes razões
para isso. O governo brasileiro não deveria esquecer esse fato.
As autoridades de Brasília,
podem, no entanto, fazer muito, internamente, para tornar a empresa nacional
mais eficiente e mais capaz de competir. Poderia ir muito além das ações
defensivas, incluídas nesse conjunto as medidas de controle do fluxo de capitais.
Antes das novas ações do BCE já se esperava um ano ruim para as exportações.
Projeções do Banco Central do Brasil divulgadas em dezembro já indicavam uma
grande redução do superávit comercial.
A expectativa de crescimento
recém-anunciada pelo governo da China - 7,5%, depois de muitos anos com taxas
entre 9% e 10% - reforça os motivos de preocupação, mas não traz novidade
radical. Apenas confirma a inércia do governo brasileiro diante das
ineficiências e custos excessivos da economia nacional.
Título e Texto: Editorial do
Estado de S. Paulo, 06-03-2012
Colaboração: Rafael Picate
Relacionados:
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-