Rui Ramos
Como se combate o jihadi cool? Não é
argumentando: é privando-o de coolness. É associando o jihadismo à impotência e
à futilidade. Por isso, a sua derrota militar é fundamental.
Recapitulemos o que consta
sobre o assassino de Orlando. As redes sociais mostram-no em poses narcisistas; a ex-mulher
lembra um marido misógino, violento e pouco religioso; os colegas de trabalho
retiveram a sua propensão para o racismo e a homofobia. O que é que um
indivíduo assim procurou no jihadismo? Muito provavelmente, a adrenalina da
transgressão e o poder sobre os outros. Teria o jihadismo a mesma atracção para
este viciado em selfies se consistisse em movimentos derrotados?
O jihadismo tem certamente
complexas histórias regionais na Ásia e em África. Mas do ponto de vista dos
seus recrutas ocidentais – 4000, segundo algumas estimativas –, “jihadi cool” é um ângulo relevante. Para milhares de jovens
como Omar Mateen, a guerra santa não é a experiência religiosa da tradição, mas
a possibilidade de encarnar o matador do jogo de vídeo, o vilão do filme de
super-heróis, o mauzão do gangsta rap. A jihad proporciona-lhes selfies
imponentes, e não é por acaso que os jihadistas ocidentais deixam rastos tão
grandes nas redes sociais. Como se combate um fenómeno destes? Não é
argumentando: é privando-o de coolness. É associando-o à impotência e à
futilidade. É por isso que a sua derrota militar é fundamental.
Não é possível, a menos que o
Ocidente realize finalmente o pesadelo policial de Orwell, controlar toda a
gente e prevenir todas as iniciativas. É necessário dissuadir os potenciais
recrutas da jihad. Mas isso não se faz pelo expediente de discursar solenemente
sobre a democracia, ou ensinar tolerância nas escolas. Tudo isso irá apenas
acumular-se na pilha de coisas que o jihadista despreza. Ser mal visto é algo
que o jihadista suporta bem. O que ele não suportará é fazer figura de falhado.
A Al-Qaeda deixou de ser cool
quando Bin Laden foi morto. Porque o jihadi cool só funciona com carrascos
impunes na brutalidade com que, de bandana e cartucheira, desafiam todos os
poderes e passam todos os limites. No Médio Oriente, segundo uma sondagem recente, a simpatia juvenil pelo Estado Islâmico –
sempre minoritária — diminui. Por horror aos seus crimes? Certamente, mas
também por horror aos seus insucessos no campo de batalha. A derrota estraga
todas as marcas.
Há demasiada gente no Ocidente
convencida de que o jihadismo é uma reacção às injustiças do planeta, e de que,
portanto, será preciso corrigir a última imperfeição do mundo, antes de
conseguir disputar recrutas ao califa. Mas Omar Mateen, misógino, racista e
homofóbico, não parece o tipo de jovem idealista pressuposto por essa teoria.
Talvez não seja preciso tanto esforço para mudar o mundo. Quando os combatentes
do Estado Islâmico não tiverem tempo para degolar e tirar selfies, por estarem
demasiado ocupados a fugir e a esconder-se, não haverá provavelmente tantos
Omar Mateen disponíveis para matarem ou para se fazerem explodir em nome do
califa.
Mas qual é a probabilidade de
as potências ocidentais se empenharem na humilhação militar da jihad em África
e na Ásia — numa campanha que servisse, não para inaugurar democracias, não
para levantar Estados, mas para demonstrar decisivamente que os jihadistas
estão destinados a perder? A reacção ao massacre de Orlando não permite
ilusões. Se os políticos americanos não conseguem sequer chegar a um acordo
acerca do problema, que insistem em definir em termos rigorosamente paroquiais
(a venda de armas?, os imigrantes?), como esperar que se
entendam sobre uma solução? Ninguém se atreverá a ir além da esporádica
operação de drones. Para uns, porque mais do que isso seria imperialismo; para
outros, porque as populações locais não merecem. Haverá, assim, que continuar a
confiar nos labirintos das guerras regionais para reduzir o Estado Islâmico e
os seus clones. Os selfies da jihad não vão acabar tão depressa.
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