João Marques de Almeida
Este é o problema para Costa: discutir as
causas que levaram a termos de colocar 4 mil milhões para salvar a CGD faz-nos
regressar ao mundo socialista que provocou um resgate e 4 anos de austeridade.
Vou começar com factos, e
citando o Expresso (jornal que ninguém pode acusar de ser contra o actual
governo ou mesmo contra o PS):
– A CGD “emprestou em 2006
quase 300 milhões de Euros para Vale de Lobo. Além de dar crédito, a CGD
tornou-se acionista.”
– A CGD concedeu igualmente um
crédito de 476 milhões de Euros a uma empresa espanhola, a Artlant, para
construir uma fábrica em Sines. Tal como com Vale de Lobo, a CGD tornou-se
acionista.
– Emprestou cerca de 800
milhões de Euros ao grupo Espírito Santo, ao grupo Lena e ao empresário
angolano António Mosquito, os quais nunca serão recuperados.
– Emprestou ainda cerca de 360
milhões de Euros a Joe Berardo para comprar ações do BCP. Outro crédito que
jamais será recuperado.
Ou seja, à volta de 2 mil
milhões de Euros perdidos. Quem vai pagar estas perdas? Nós. Todos os
portugueses. O governo acabou de nos informar que vamos ter que injectar 4 mil
milhões de Euros na Caixa. Para onde foram os 2 mil milhões? Quem ganhou
dinheiro com estes “empréstimos”? O governo não quer que os portugueses saibam
nada sobre o que se passou. Parece que, para o governo, os portugueses servem
para votar e para pagar. De resto, devem ficar calados e aceitar tudo na santa
ignorância.
Por mais que o governo queira,
o passado não o larga, nem nos larga a nós. Quando todos queremos olhar para o
futuro, a Caixa leva-nos de volta à “arqueologia socrática”. Foi entre 2005 e
2010, com Sócrates em São Bento, que a Caixa mais perdeu dinheiro. O modo como
o governo de então tratou o banco do Estado mostra muito bem o sentido de
impunidade dos anos de Sócrates. O engenheiro colocou no banco um amigo e
camarada, Armando Vara, sem qualquer qualificação que o recomendasse para o
cargo. Essa administração emprestou dinheiro a Berardo para comprar ações do
BCP. Depois, como acionista de referência do BCP, Berardo votou a favor
daqueles que lhe concederam créditos para integrarem a nova administração do
BCP. Eis, o nosso capitalismo socialista no seu melhor. Ainda falam eles do
“capitalismo selvagem”. Sabem muito bem do que falam.
Este é o grande problema para
Costa: a discussão das causas que levaram à necessidade de os portugueses
pagarem 4 mil milhões de euros para salvar a Caixa faz-nos regressar ao mundo
socialista que provocou um resgate e quatro anos de austeridade. O “resgate”
dos portugueses à Caixa faz recordar “2011”. Por isso, a Caixa será o maior
problema politico para o governo. E António Costa já o percebeu. O PM, porém,
continua a dizer que a Caixa é um banco de referência para a estabilidade
financeira nacional. Um banco de referência torna-se acionista de um projecto
turístico algarvio? Torna-se sócio de uma empresa espanhola privada num
projecto petroquímico? Empresta dinheiro a um empresário para comprar ações no
BCP? Coloca na administração do banco um militante do PS, sem o mínimo de
qualificações? Isto é gozar com os portugueses.
Mais uma vez, a teimosia de
Passos Coelho está a assustar a oligarquia nacional. Já começaram as pressões
para o PSD desistir da comissão de inquérito parlamentar. Até já se fala em
potenciais sucessores na liderança dos sociais-democratas. A antipatia de
muitas elites políticas em relação ao anterior PM não tem nada a ver com
questões ideológicas ou doutrinais. As nossas elites são demasiado cínicas para
levar ideias políticas a sério. Foi o modo como lidou com o BES que fez de
Passos um problema para a oligarquia. E agora está a comportar-se do mesmo modo
em relação à Caixa. A verdade assusta muita gente. E quem não se incomoda com a
verdade torna-se uma ameaça.
O Presidente da República está
perante o momento mais importante desde que chegou a Belém. Vai ajudar a
silenciar o que os anos Sócrates fizeram à Caixa? Ou vai tratar os portugueses
como cidadãos adultos com o direito de saberem a verdade? Sobretudo quando lhes
pediram para pagar 4 mil milhões de euros sem nada terem feito para isso. Tal
como outros povos, um dia os portugueses também se vão zangar. Para quem julga
que a paciência dos lusitanos é inesgotável, estude com atenção o que se está a
passar no Brasil com o Lava Jato. No outro lado do Atlântico, muitos dos que se
julgavam impunes estão hoje na prisão ou sob investigação.
Título e Texto: João Marques de Almeida, Observador,
19-6-2016
Grifos: JP
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