Mario Sabino
O populismo de esquerda e
direita é capaz de infectar até mesmo países altamente civilizados, caso do
Reino Unido. O Brexit representou uma vitória do populismo de direita, cujo
rosto é Nigel Farage, chefe do Independence Party.
Os motores do Brexit foram principalmente
a crise migratória e a xenofobia dos mais velhos – os britânicos com menos de
24 anos votaram maciçamente pela permanência do Reino Unido na União Europeia.
O excesso de regulação dos burocratas de Bruxelas contou para o “Leave”, mas
serviu como força auxiliar para a decisão que causou um terremoto nas bolsas de
todo o mundo e lançou uma sombra sobre o processo de globalização.
O populismo é o exato oposto
da racionalidade, demonstra o Brexit. Como escreveu David Cassidy, da “New
Yorker”, os seus partidários não ouviram a City, o ministro das Finanças, o
Banco da Inglaterra, o FMI, o governo americano e uma infinidade de grandes
economistas e empresários. Ao contrário do que diz toda essa gente respeitável,
os adeptos do “Leave” acreditam que o Reino Unido poderá se tornar uma Noruega
ou uma Suíça, países que rejeitaram a integração com o bloco, mas se beneficiam
de um status especial com as nações da UE.
É um engano. A economia do
Reino Unido, além de ser bem maior do que a norueguesa e suíça, é baseada na
exportação de manufaturados que perderão o acesso sem barreiras ao maior
mercado do planeta. Mercado, aliás, que está para integrar-se ao americano. UE
e Estados Unidos negociam a criação da maior zona de livre comércio do mundo –
e o Reino Unido ficará fora dela. Muito inteligente.
A massa ignara que votou pela
saída do bloco europeu deixou-se levar pelo discurso estúpido de Nigel Farage e
asnos do Partido Conservador, sem se dar conta de que a integração à UE foi
determinante para tirar o país da recessão na década de 80 e empurrar ladeira
acima a economia britânica nos anos que se seguiram. O thatcherismo não teria
dado resultados tão espetaculares sem a adesão ao bloco, apesar de todas as
bravatas da Dama de Ferro.
A burocracia da UE é exasperante?
Sim. A adoção do euro, sem união fiscal, foi desastrosa? Sim. A crise iniciada
em 2008 continua a bater forte, em especial no Sul do continente? Sim. Os
tropeços, contudo, não apagam o fato de que o bloco europeu é um sucesso
político -- amalgamou nações historicamente inimigas -- e econômico. Não há um
país que tenha empobrecido por causa da UE. Ela propiciou e acelerou o
enriquecimento de todos, absolutamente todos, que a integram. O Reino Unido não
ficará pobre, mas enriquecerá menos no seu esplêndido isolamento. A queda do
valor da libra é o sinal mais evidente do futuro britânico.
A saída da UE também causará
um problemão interno. Escócia e Irlanda do Norte votaram majoritariamente na
permanência do Reino Unido no bloco. Em 2014, no plebiscito que definiu que os
escoceses continuariam ligados à Inglaterra, um forte argumento utilizado nesse
sentido foi dado pela UE. Os principais líderes europeus afirmaram que, se a
Escócia saísse do Reino Unido, ela dificilmente seguiria no bloco. Agora, a Escócia
está fora da UE, por causa do atrelamento à Inglaterra. Escoceses já recomeçam
a falar em independência, dessa vez para voltarem ao bloco. Na Irlanda do
Norte, por seu turno, o Sinn Fein, o partido nacionalista, quer um referendo
para uni-la à Irlanda, que ficou rica graças à UE.
A ironia, nota David Cassidy,
é que o Reino Unido corre o risco de se esfacelar do ponto de vista político
antes de se desligar do bloco europeu, processo que deve demorar alguns anos
para completar-se.
Populistas são, acima de tudo,
idiotas.
Título e Texto: Mario Sabino, Antagonista, 24-6-2016
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-