Barroso é um iluminista racional, um
defensor da tolerância, das minorias, do progresso, da democracia, das
liberdades — desde que todos esses conceitos sejam definidos por ele
Rodrigo Constantino
O ministro Barroso, do STF, disse nesta semana que enfrentar conteúdos ilegítimos e inautênticos na internet demandam algum tipo de regulação das plataformas digitais. Afirmou também que redes sociais muitas vezes amplificam o ódio e a mentira porque trazem mais engajamento. “Há uma contradição entre o bem e o mal, porque é o mal que traz mais lucro e, portanto, é preciso dar incentivos para que as plataformas não tenham essa intenção de amplificar o que seja ruim.”
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Foto: SCO/STF/Montagem Revista Oeste |
A declaração foi feita durante
palestra “Fake news e liberdade de expressão”, promovida pela Corte. “A grande
preocupação que precisamos ter é o fato de que as pesquisas documentam que a
mentira, o ódio e sensacionalismos rendem muito mais engajamento do que o
discurso equilibrado, razoável, verdadeiro”, disse o ministro. Barroso afirmou
que a questão da regulamentação “passou ao largo” das discussões sobre o PL das
Fake News. “Quando se fala nisso há uma grande preocupação das plataformas, mas
evidentemente que esse tema tem que vir a debate, e um debate transparente e
claro, de maneira bem aberta, ouvindo todos os lados da questão.”
Nossos ministros supremos
demonstram muito tempo disponível para debates políticos, mas não conseguem
comparecer ao Senado quando convidados pelos representantes do povo para
discutir ativismo judicial. Sobra tempo até para “lives” com youtubers
bobocas, e impressiona como esses ministros tentam influenciar no papel
legislador, sendo que não tiveram um único voto. Em especial Barroso, que já
confessou desejar “empurrar a história” no sentido que considera progresso.
Barroso gosta de acusar os
outros, de apontar dedos, mas olha pouco para o próprio espelho com um olhar
crítico
Não foi a primeira vez que Barroso se colocou como o Bem incorporado contra o Mal. Quando participou de evento nos Estados Unidos, bancado pelo bilionário Jorge Paulo Lemann, Barroso falou em nome da democracia e do Bem. Respondendo a uma pergunta da deputada Tabata Amaral, que recentemente declarou apoio a Lula, sobre o risco de Jair Bolsonaro ganhar as eleições, na visão dela, em decorrência do uso de fake news, Barroso afirmou que “é preciso não supervalorizar o inimigo”. Ele acrescentou: “Nós somos muito poderosos, nós somos a democracia, nós somos os poderes do bem”.
Gravíssimas as falas do Barroso durante a ‘Brasil Conference’ em Boston, EUA: “É preciso não supervalorizar o inimigo! Nós somos muito poderosos! Nós somos a democracia! Nós é que somos os poderes do bem! Nós é que ajudamos a empurrar a história na direção certa!”
— Lelia Adad (@AdadLelia) April 12, 2022
Inacreditável! pic.twitter.com/qgo5kJWOEf
Podemos notar um padrão aqui:
Barroso fala sempre em nome do Bem, enquanto os outros, se discordam dele, só
podem fazê-lo por maldade, por estarem repletos de más intenções. Barroso é um
iluminista racional, um ungido, um defensor da tolerância, da diversidade, das
minorias, do progresso, da democracia, das liberdades — desde que todos esses
conceitos sejam definidos por ele. Há um grupo político, revolucionário na
verdade, conhecido por tal postura fanática: os jacobinos, que lideraram a
Revolução Francesa, e que instauraram o Terror da guilhotina e deixaram como
legado a ditadura napoleônica.
Chesterton dizia não se
preocupar com a falta de crença em Deus numa pessoa, mas, sim, com o que ela
colocaria nesse lugar. Somos seres religiosos por essência, e mesmo o mais
cético dos agnósticos costuma canalizar esse sentimento religioso para algum
destino. A imensa quantidade de seitas modernas, como o veganismo e o
ambientalismo, atesta isso. E a maior “religião secular”, sem dúvida, é a
ideologia, ou o socialismo, agora redefinido como progressismo, para ser mais
específico.
O maior experimento dessa
“religião política” foi, certamente, a Revolução Francesa. Os jacobinos não
queriam apenas melhorar as coisas, emplacar reformas necessárias; eles
desejavam criar um mundo totalmente novo, do zero, com base apenas na “razão”,
seguindo o Zeitgeist do Iluminismo, que via avanços concretos
nas ciências naturais com a aplicação do conhecimento objetivo.
Na América, os revolucionários
também se encantaram com as ideias abstratas, mas havia o contraponto das
tradições conservadoras. Se Thomas Paine se inspirava nos caminhos franceses,
havia um John Adams para oferecer resistência e impedir o radicalismo. Paine
flertou com a mesma “religião” dos jacobinos, e chegou a escrever: “Está em
nosso poder começar o mundo outra vez. Uma situação similar à presente não
acontece desde os dias de Noé até agora”. Esse idealismo messiânico, que
ansiava por um milênio social e uma nova humanidade, não saiu pela tangente na
América, ao contrário do caso francês.
Esse clima francês de refundar
a humanidade acabou saindo do controle, e a “vontade geral” se mostrou um
aríete capaz de destruir tudo que encontrasse pela frente. A Revolução Francesa
inaugurou a era dos totalitarismos, com uma “religião cívica” servindo de
pretexto para a submissão plena ao Estado. As turbas não reagiram conforme o
esperado pelos iludidos democratas seculares. A religião dos jacobinos era
dogmática, tinha suas escrituras sagradas, seus profetas, rituais, e, como o cristianismo,
era uma religião da salvação humana.
O rio de sangue derramado
pelos revolucionários seria purificador, pensavam os crentes, que olhavam para
locais elevados demais a ponto de reparar nesse sangue todo. Era a “pureza
fatal” da ideologia jacobina, que guilhotinou inclusive seus principais
idealizadores e executores, que se mostraram imperfeitos demais.
Voltemos a Barroso: ele já
considerou Cesare Battisti um inocente, sendo que o comunista confessou seus
crimes depois. Ele já considerou João de Deus alguém com poderes
transcendentais, sendo que o médium foi acusado de abuso sexual em lote. Ele já
espalhou que os bolsonaristas desejam a volta do voto em papel, sendo que o
próprio site do TSE explica didaticamente que o voto impresso não tem nada a
ver com a volta da cédula de papel. E por aí vai…
Barroso gosta de acusar os
outros, de apontar dedos, mas olha pouco para o próprio espelho com um olhar
crítico. Falta-lhe humildade, para dizer o mínimo. Se Barroso é apenas um
oportunista hipócrita, não sei dizer. Mas há uma alternativa mais assustadora,
sombria: ele acreditar ser mesmo uma alma incrível com a
missão de purificar o mundo e salvar a democracia. Um ministro jacobino é
simplesmente algo temerário!
Título e Texto: Rodrigo
Constantino, Revista Oeste,
nº 124, 5-8-2022
FOTO ACIMA LEGENDADA DO MI"SI"NISTRO BARRANCOSO:
ResponderExcluir- Meu Deus, olhando para a minha foto eu me lembro do tempo em que queimava os pelos e os ossos nos quintos do inferno.
Aparecido Raimundo de Souza
de Itapetininga, interior de São Paulo