Aqueles que lutaram contra a corrupção são
punidos, conservadores são perseguidos, censurados ou cancelados, e os
corruptos se regozijam à nossa custa
Rodrigo Constantino
Um foi o braço direito de Lula durante a primeira gestão nacional petista, que mergulhou o país nos maiores escândalos de corrupção da história. Comunista de carteirinha, revolucionário que participou de atividades criminosas no passado, ele buscou refúgio em Cuba depois que os militares impediram a tomada de poder pelos discípulos de Fidel Castro na década de 1960. Lá, foi treinado como guerrilheiro, soldado comunista, com o codinome “Daniel”. Voltou clandestino para o Brasil, casou-se, teve filho e, após a anistia, se mandou para regressar uma vez mais ao seu projeto de poder.
O outro é um famoso advogado
criminalista com lista extensa de clientes políticos e notórios corruptos. É
muito bem pago para defender essa turma, gosta de hábitos luxuosos e de expor
seu estilo bon vivant, é excêntrico e já despachou no Supremo
Tribunal Federal de bermuda, para demonstrar seu grau de intimidade e
influência na corte. Pela repercussão negativa, acabou pedindo desculpa, mas a ousadia
deixou sua marca: não há toga capaz de impor o devido respeito a quem apresenta
lista tão poderosa de clientes.
Ambos são amigos. Ambos estavam em Paris, na França, quando saiu a decisão do TSE de cassar o mandato de Deltan Dallagnol. Ambos publicaram uma foto juntos fazendo o “L” com a mão e rindo. A imagem viralizou, pois ilustra com perfeição a total inversão de valores em nosso país hoje. Os bandidos e defensores de bandidos estão à vontade, contentes, rindo de orelha a orelha e consumindo rios de dinheiro — muitas vezes obtido dos nossos impostos. Eles acham graça de quem tenta levar o Brasil a sério. Eles montaram um circo e, nesse cenário, o palhaço é o povo.
Vergonhahttps://t.co/v4T3EeAFJa
— Paula Schmitt (@schmittpaula) June 7, 2023
O Brasil cansa. Tentar
consertar algo com problemas tão estruturais e enraizados é realmente uma
missão homérica. A Operação Lava Jato recuperou para os cofres públicos bilhões
de reais, houve confissões, delações, indícios e provas, e finalmente
condenações. Não só na primeira instância, mas por desembargadores e até
ministros supremos. O povo trabalhador e honesto alimentou a esperança de que
algo finalmente mudaria no país. Doce ilusão.
Sejamos
realistas: até aqui foi vitória plena dos corruptos. E nada disso seria
possível sem muita gente influente se deixar corromper também
O império corrupto sempre
contra-ataca. E a vendeta precisa ser total, para dar o recado, para deixar
claro que quem ousar desafiar esse status quo será punido. O
povo apostou na vitória dos mocinhos contra os bandidos, mas o Brasil não é um
filme do James Bond, e sim um bordel com donos, e eles não querem nenhum
resquício de moralidade. “Restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos!”,
disse com ironia o humorista Stanislaw Ponte Preta. O Brasil optou pela bagunça
geral. Muitos decidiram se lambuzar no mel estatal. E para manter essa situação
era preciso acabar com a esperança dos que lutam para combater a corrupção.
A história, claro, não acabou
ainda. A vida continua. A esperança é a última que morre. A ousadia dos
canalhas pode produzir um efeito bumerangue. A arrogância dos poderosos impunes
pode plantar as sementes para um movimento ainda mais forte de libertação à
frente. Mas sejamos realistas: até aqui foi vitória plena dos corruptos. E nada
disso seria possível sem muita gente influente se deixar corromper
também.
Veículos de comunicação
participaram desse conluio com vontade. Economistas renomados “fizeram o ‘L’”
embarcando na narrativa patética de “salvar a democracia” com um bajulador dos
piores tiranos do planeta. Militares resolveram se curvar e prestar continência
aos comunistas corruptos em troca de privilégios, carguinhos ou promoções,
traindo o povo. Não há como um projeto nefasto desses avançar sem apoio de boa
parte de uma elite podre, míope ou alienada.
O resultado é este: tudo piora
bem rápido no país. A inércia das reformas liberais do governo anterior permite
algum respiro e tempo ao atual desgoverno, mas é questão de meses até a conta
do populismo chegar. Aqueles que lutaram contra a corrupção são punidos,
conservadores são perseguidos, censurados ou cancelados, e os corruptos se
regozijam à nossa custa. Enquanto isso, os tucanos que acreditaram em Lula como
uma espécie de Mandela numa frente ampla moderada para pacificar o país
confessam sentir medo agora, mas o orgulho os impede de pedir perdão e
reconhecer a lambança que fizeram com o país.
Repito: a esperança é a última
que morre. Sem ela, resta o niilismo, o pânico, a depressão profunda. Mas a
esperança também pode ser a grande falsária da verdade, como sabia Baltasar
Gracián, o jesuíta do Século de Ouro Espanhol. É preciso ser realista, até se
pretendemos ter alguma chance de reverter esse quadro sombrio. A negação da
realidade nunca é boa estratégia. Temos de partir de premissas verdadeiras. E o
fato é que, até aqui, os corruptos levaram todas, venceram as batalhas mais
importantes, estão com a faca e o queijo nas mãos, e muitas guilhotinas afiadas
para degolar cabeças e mostrar quem manda nesta republiqueta de bananas chamada
Brasil. Salve-se quem puder!
Título e Texto: Rodrigo
Constantino, Revista Oeste, nº 168, 9-6-2023
O desastre vem mais devagar
Revista Oeste nº 168: Carta ao Leitor
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