segunda-feira, 12 de maio de 2014

A roupa dos covardes

Francisco Vianna

Uma turba, que defende os interesses da ditadura de Maduro, obriga de forma humilhante uma estudante oposicionista a ficar nua e a permanecer assim num gramado da Universidade Central da Venezuela. Foto de Yoani Sánchez

A blogueira oposicionista cubana, Yoani Sánchez, nos envia de Havana uma matéria em que conta com detalhes a agressão sofrida por uma estudante pela intolerância política de ‘universitários’ chavezistas, na Venezuela, à sua oposição ao regime, acompanhada da foto acima onde se vê a vítima com os seios nus, apenas de calcinhas, servindo de chacota a um bando de marmanjos covardes, a maioria encapuçados sob os olhares complacentes de um policial.

A moça estava expondo suas obras de arte e, de repente, sentiu-se como se estivesse na Havana dos anos oitenta com o escândalo ocorrido com a exposição “Nove Alquimistas e um Cego”, e que terminou com seu fechamento e a satanização de muitos artistas.

A pele nua do corpo é um desafio, um protesto, num país onde o poder ainda hoje se apresenta de verde oliva, de mangas compridas, uniformes quentes que escondem em vez de mostrar.

As ditaduras lidam muito mal com a nudez. Consideram-na impura, suja, humilhante, e desaforada, quando na realidade é o estado natural e primevo do ser humano ao chegar nesse mundo. São pacatos os tiranos, pacatos e timoratos. Assustam-se com qualquer gesto libertário e com a demasiada pele exposta percebendo-a como um gesto desafiante. Pensam assim porque – no fundo – veem o corpo humano como algo impuro e obsceno. Daí o fato de despirem seus confrontantes ideológicos se constituir numa das práticas repressivas que mais empregam. Acreditam que o desposar suas vítimas de suas roupas os reduzem a simples animais inferiores. Trata-se do mesmo mecanismo mental que lhes leva a chamar de “vermes”, “carrapatos” ou “baratas” a quem os critica.

Na Ucrânia, feministas se desnudam para protestar contra o governo indiano por suas medidas repressivas às mulheres. “Não sou prostituta!” e “a Ucrânia não é bordel”, é o que dizem os cartazes...

Num cubículo sem janelas um guarda obriga um preso político a se despir completamente; num quarto de onde ninguém pode escutar seus gritos, três mulheres remexem por baixo da roupa de uma cidadã que acabou de ser presa; num albergue de uma escola rural os banheiros com chuveiros não têm cortinas para que nenhum estudante possa possuir para si o restrito território de seu próprio corpo; numa sala fria e cinzenta os judeus eram desnudados antes de entrar nas câmaras de gás. Desnudar para humilhar, desnudar para desumanizar, desnudar para matar. É a prática antiga da covardia dos autoritários...
As imagens que chegam da Venezuela confirmam que ainda se pratica a privação da roupa como castigo moral. Uma jovem é posta nua por um grupo que procura degradá-la ao expor, contra a sua vontade, cada centímetro de sua pele e das partes íntimas de seu corpo.

Na verdade, acabam tornando-a um ícone de formosura, de pureza violentada, de candura aviltada. Não, não há sujeira no corpo humano, não há nada do que se envergonhar em permanecer nua perante tal grupo de pobres coitados e manter a altivez acaba por desconcertá-lo e envergonhá-lo.

Pois que se envergonhem bastante essas bestas uniformizadas, que se aproximam de suas débeis vítimas usando armaduras e escudos militares para enfrentar pessoas simples, quase caladas, e desarmadas. Que se envergonhem esses que se escondem por baixo das desonrosas vestes do medo e da covardia.
Título e Texto: Francisco Vianna, (da mídia internacional), 12-05-2014

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