Branca Nunes
Os processos à espera de
julgamento no Supremo Tribunal Federal não formam uma fila por ordem de
chegada. Compõem uma aglomeração — e avançam ou permanecem estacionados de
acordo com os humores dos ministros. Uma decisão pode durar mais de um século:
só em 2020 a família real brasileira perdeu oficialmente para a União a posse
do Palácio Guanabara, reivindicada em 1895 pela princesa Isabel. Ou menos de
100 segundos, como a prisão do deputado Daniel Silveira decretada pelo ministro
Alexandre de Moraes. Criado para deliberar sobre questões constitucionais, o
STF ampliou de tal forma sua esfera de atribuições que, em 2018, decidiu que o
campeão brasileiro de futebol na temporada de 1987 não foi o Flamengo, mas
o Sport do Recife.
Os 11 superjuízes debitam a morosidade no andamento de muitos casos na conta do acúmulo de processos. O escândalo do Mensalão, devassado em 2005, só foi julgado em 2012. Assassino confesso da namorada, o jornalista Pimenta Neves ficou mais de dez anos em liberdade. Mas todos os ministros são auxiliados por equipes de bom tamanho, e sabem ser rápidos no gatilho sobretudo quando lidam com personagens que não gozam da simpatia da Corte. Nessa categoria, ninguém supera o presidente Jair Bolsonaro. Ele é mais que um alvo preferencial. É o inimigo número 1 do Supremo, atesta a assombrosa lista de 124 ações hostis movidas pelos ministros entre março de 2019 e agosto de 2021. Uma a cada sete dias.
A reportagem que reproduz a lista mostra outro assombro. No mesmo período,
mais de dez decisões da Corte favoreceram o ex- presidente Lula e outros réus
da Lava Jato. Hoje, das mais de 550 pessoas acusadas criminalmente na operação,
apenas uma continua atrás das grades: Sérgio Cabral, ex-governador do Rio,
condenado a 390 anos de cadeia. Ele e outros 11 ex-presos da Operação têm sua
trajetória resgatada na reportagem de Augusto Nunes.
A justificativa para essa perseguição a Jair Bolsonaro por parte do STF,
de grande parte da imprensa e dos autodenominados artistas e intelectuais é o
risco de um golpe de Estado encabeçado pelo presidente, com o apoio das Forças
Armadas. A tese é implodida pelo artigo de J. R. Guzzo. “Dar um golpe de
Estado, ao contrário do que acham os editoriais, os cientistas políticos
de esquerda e o governador João Doria, não é um negócio assim tão
simplesinho”, escreve Guzzo. “Então: ‘Bolsonaro’ e os ‘setores
antidemocráticos’ dão o golpe — aí o que acontece, na prática? Vão fechar
o Supremo e, caso sim, vão fazer o que com os 11 ministros? Prende? Deixa
solto? Põe o que no lugar do STF? A máquina da Justiça precisa continuar
funcionando; não vão parar as ações de despejo ou de cobrança. Outro problemão
é o Congresso. Fecha? Cassa mandato? Joga fora a papelada da ‘CPI’? O que vão fazer com a reforma tributária? Fica tudo igual?!”
As medidas tomadas pelo STF contra o presidente da República e aqueles que o
apoiam — ou simplesmente criticam alguns dos 11 ministros — têm gerado
precisamente o que o Supremo deveria impedir que existisse: insegurança
jurídica.
Boa leitura.
Branca Nunes
Diretora de Redação, revista OESTE, 27-8-2021
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