segunda-feira, 4 de outubro de 2021

[Observatório de Benfica] Ética, Política e Eleições

Mário Florentino

Há duas formas de fazer política. Com ética ou sem ética. Há os políticos que colocam os seus próprios interesses à frente do interesse público. Que agem sem ética nem moral. Que mentem descaradamente para atingir os seus fins. Que manipulam, enganam os eleitores, que se servem da política. Dizem uma coisa hoje e outra amanhã, consoante o seu objetivo em cada momento. Usam esquemas de “baixa política” para derrotar os seus adversários e para se manter no poder.

A outra forma de fazer política é a oposta. Com ética, colocando o interesse público acima dos interesses pessoais e dizendo a verdade aos eleitores. Sem corrupção nem esquemas duvidosos. Sem abusos do poder. Com seriedade e transparência. É a política como atividade nobre, de serviço público, de rigor e competência. São as políticas públicas focadas no desenvolvimento do país e no médio e longo prazo. No bem da geração seguinte e não no resultado das próximas eleições.

Muitos comentadores consideram que a primeira forma de fazer política é a certa e a que compensa. Acham que é com ela que se ganham eleições. Elogiam os políticos que a seguem. Por exemplo, consideram o atual primeiro-ministro um “político genial” ou “o melhor da atual geração”, e admiram a forma como afasta todos os potenciais adversários do seu caminho (quem não se recorda da forma como substituiu Tó Zé Seguro da liderança do seu partido?). E pensam, esses comentadores, que um político com essas características é imbatível. Porque, consideram, quanto mais falso e manipulador, maior será o seu sucesso eleitoral. A política é assim, e nada há a fazer. Quem não for mentiroso e aldrabão, nunca terá sucesso, dizem.

E muitos eleitores também pensam o mesmo. Talvez isso seja uma das explicações para as abstenções elevadas. Dizem “os políticos são todos iguais”, ou “os portugueses têm os políticos que merecem, porque também são corruptos como eles”.

Ora, as recentes eleições autárquicas em Lisboa, mostram precisamente o contrário. Mostram que a primeira forma de fazer política nem sempre é a vencedora.  

Já nas eleições legislativas, em 2011, e em 2015 (neste caso também contra todas as sondagens), o mesmo tinha acontecido. A segunda forma de fazer política foi, nesses dois casos, premiada pelos eleitores (não esquecer que o PS perdeu as eleições em 2015). Votaram na verdade contra a mentira, na ética contra a falta dela.

O mesmo aconteceu em Lisboa, com a vitória da coligação “Novos Tempos” contra o Presidente da Câmara dos últimos seis anos. Não é necessário ser falso para ganhar eleições. Muitos lisboetas, na hora de colocar a cruzinha, terão avaliado e comparado os dois candidatos ao lugar. De um lado, estava Carlos Moedas, o “ministro da Troika”, dum governo que, enfrentando dificuldades, colocou sempre a verdade e o interesse nacional acima dos interesses partidários. Estava uma pessoa com carreira de prestígio, um gestor competente, um comissário europeu que foi elogiado por todos (incluindo pela esquerda e por Costa). E estava alguém que deixou um cargo profissional de luxo para se dedicar à causa pública, arriscando perder tudo.

Do outro lado, estava Fernando Medina, com a sua arrogância. Envolvido em várias polémicas que não soube justificar, desde o caso dos dados pessoais russos até ao mais recente caso da presidente da Freguesia de Arroios, em que, confrontado com a pergunta sobre se mantinha a confiança nela responde apenas: “sim” (quem sabe se com um simples “não” tivesse conseguido os 2300 votos que lhe faltaram para ganhar?).  

É, pois, a terceira vez, que a seriedade e a ética compensam. Os eleitores premiaram quem se apresentou com honestidade, competência e vontade de servir. E castigou quem lhe pareceu pouco transparente, quem prometeu mundos e fundos que não pode cumprir, quem disse hoje o contrário do que tinha dito ontem, quem lhe pareceu colocar sempre os interesses pessoais à frente do interesse comum.

E ganhou Lisboa. Novos tempos. 

Fica BEM 👍

A “libertação”. Oitenta e uma semanas depois de nos termos fechado em casa, tivemos finalmente a última fase do chamado desconfinamento. Nos cafés, restaurantes, lojas, vive-se finalmente um novo ambiente. De alegria. Nos dois restaurantes que ficam aqui mesmo em frente à minha casa, dá gosto ver as pessoas felizes, os amigos a rirem, as famílias a festejar o reencontro. Juntam-se as mesas e partilham-se histórias por contar. Até nos empregados se sente o sorriso, ainda que escondido atrás das máscaras. E a Baixa lisboeta voltou a encher-se de turistas. Há esperança de que um dia tudo volte a ser como era em 2019.

Fica MAL 👎

A Justiça. João Rendeiro foi condenado a mais de 16 anos de prisão, por vários crimes: burla qualificada, fraude fiscal, abuso de confiança, branqueamento de capitais, falsidade informática e falsificação de documentos. Num qualquer outro país da União Europeia estaria preso. Mas teve a sorte de ter praticado este rol de crimes em Portugal. Neste momento está em parte incerta (provavelmente numa ilha paradisíaca que não tenha acordos de extradição com o nosso país), e é procurado pela Europol e pela Interpol. Ri-se de nós e da nossa Justiça, enquanto goza os milhões que "roubou". Parece que tinha dado vários sinais de que estaria a preparar a fuga, mas todos perceberam isso menos o Tribunal. E a ministra da Justiça, candidamente, veio admitir que tudo isto causa algum desconforto social, mas que não se justifica mudar a Lei. É o Portugal que temos e a Justiça a que temos direito.

Título e Texto: Mário Florentino, Benfica, 4 de outubro de 2021

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2 comentários:

  1. Há muito tempo que eu venho dizendo: um dos nossos males é os "comentadores" avaliarem os políticos pela eficácia do seu jogo político e não pela eficácia das suas políticas.

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