terça-feira, 26 de outubro de 2021

[Estórias da Aviação] Open skies, ônibus alados e a presidência

José Manuel

Corria o ano de 1995, eu, felizmente, tinha conseguido fazer o meu processo de aposentadoria especial, com sucesso, antes que o celerado da Av. Foch conseguisse fazer uma lambança na vida dos Aeronautas.

1995 significava dez anos após o término do regime militar, época em que o país viveu seus 21 anos de melhores momentos, de paz e progresso em todas as áreas.

Foi também o melhor período da VARIG, pois assim como o regime militar, a Pioneira priorizava a ordem e o progresso, tendo como diretrizes exatamente a ordem, o respeito e o trabalho consciente, no sentido de gerar profissionais e formar uma empresa sólida e progressista em todos os seus atos empresariais.

No ano de 1995, apesar de até então eu só ter visto um nosso DC-10 vazio no trecho Orlando-Miami, porque em todos os trechos todas as nossas aeronaves andavam sempre cheias, pairava algo no ar não muito claro e eu sentia isso. Nos dez anos anteriores a pseudo redemocratização aboletada no poder desde Sarney, vinha criando uma profunda recessão em nosso país, que começou a minar a base sólida anterior e a estrutura das grandes empresas como a VARIG, por exemplo.

Para desmistificar de vez a falácia de que as administrações VARIG foram as culpadas pela falência, vamos fazer uma retrospectiva do que se sucedeu no período compreendido entre 1985 e 1995

1º) Seis padrões monetários nesse período.

2º) Sete planos econômicos mirabolantes, culminando com o oitavo, o plano Real, por milagre ainda vigente e cambaleante.

O pior deles, em 1991, praticado pelo celerado possuído da ocasião fez pior com a nossa empresa, do que a atual pandemia virótica. O dinheiro simplesmente sumiu da vida de todo mundo. Foi sequestrado por elllle!

E as obrigações aqui e no exterior? E os leasings? E o combustível? E os quase vinte mil funcionários? E peças de reposição? Quem pagaria por isso tudo?

Se fôssemos um país sério, isso tudo teria sido ressarcido pela UNIÃO à época por ter sido a causadora potencial desse caos econômico.

Mas, como sempre, se esqueceram de que a conta sempre chega, e agora "chegou“ para a União, e muito salgada!

E os desvairos alucinados de praticar um  "Open Skies" para poder fazer uma empresa de ônibus voar para o exterior?

E a nossa terceira fonte de sustento do Aerus que ELLLLE simplesmente suprimiu, reduzindo um acordo de trinta anos a menos de dez, criminosamente, iniciando a liquidação do nosso fundo Aerus?

Aqueles que adoram falar bobagens, parece que não se recordam, mas estarei aqui sempre para lembrar!

Precisa desenhar o que nós, simples mortais, sofremos nessa época com essa balbúrdia e principalmente a VARIG, empresa aérea fortemente alicerçada e dependente de moeda forte estrangeira, sofreu na sua administração?

Gostaria muito de conhecer essa fórmula mágica que muitos dizem conhecer para se manter uma empresa aérea gigante como a VARIG, num cenário político-monetário caótico como o que o Brasil viveu nessa década. Cartas para a redação, por favor!

Sua base estrutural simplesmente começou a criar fissuras visíveis, e só não percebeu quem vivia em Marte e não dava a mínima para a sua empresa, para o seu trabalho e para o seu futuro. Eu dava, e muito!

E por isso, percebia tudo isso, eu sentia que algo não ia bem.

Então nessa época, em 1995, comecei a fazer uma campanha nos meus voos, para que nós liberássemos 10% dos nossos salários por determinado tempo como uma nossa colaboração à recuperação da empresa, por que afinal isso por óbvio, iria reverter em nossa saúde laboral.  Só não apanhei uma surra, por milagre apesar de ouvir toda a sorte de impropérios e ser relegado a um ostracismo temporário.

Não me importei a mínima com ataques pessoais, como sempre, pois eu sabia lamentavelmente o que iria ocorrer com o meu futuro, e temia pelo futuro da empresa.

E onze anos depois, em 2006, chegou o que eu, no íntimo, sabia e mais cristalino impossível.

Então, na minha visão e com toda a certeza, o início do desmanche da nossa empresa está forte e diretamente ligado a dois fatores preponderantes, como o narrado acima e mais um detalhe que passou desapercebido por muitos, mas que foi diretamente proporcional ao modo de como a empresa passou a se comportar gerencialmente, numa determinada época.

Infelizmente, neste caso, desconheço o cerne e as nuances dessa mudança, mas isso era muito visível.

Saindo da esfera externa e com tudo de ruim que aconteceu nessa década perdida, passamos às vísceras da nossa empresa, pouco visíveis à grande maioria, mas não desapercebidas por mim que acompanhava tudo sobre uma outra ótica além da minha função no voo.

De 1970 a 1990, ou durante vinte anos a VARIG teve no seu quadro de administração, ótimas cabeças técnicas e pensantes, mas um dos melhores, talvez o maior expoente, Sérgio Prates como diretor, tinha uma cabeça excepcional em gestão de empresas.

Foi por essa época que o seu nome, Sérgio Prates, administrador de empresas com currículo e uma experiência ímpar à frente da Diretoria do Serviço de Bordo, foi fortemente ventilado muitas vezes para a presidência da empresa, o que era dado como certo não só por todo o corpo de colaboradores da sua diretoria, como também por outras áreas na empresa.

Eu mesmo acreditava piamente nessa possibilidade, pois vivenciei todas as vitórias que a VARIG conquistou dentro e fora do país no período de sua administração. Infelizmente e custamos a acreditar, naqueles 180° de guinada abrupta da empresa em seu capital intelectual, naquele ano de 1990, e a saída do cargo que ocupava, não totalmente compreendido por todos, até hoje, do homem que ajudou a dar vida, a dar luz à estrela da Pioneira, tornando-a uma das melhores do mundo.

Teria sido um grande presidente com toda a certeza, pois a liderança nata, o conhecimento técnico-intelectual do que fazia, o seu trabalho como Diretor de uma das principais áreas da empresa, lhe davam toda a expertise necessária para levar a VARIG, mais longe do que foi, apesar dos problemas político-econômicos, o que com certeza teria, senão soluções, um jogo de cintura hábil, para enfrentar a maioria, inclusive as investidas de políticos corruptos que assediavam a VARIG por ganhos pessoais, pois nas suas veias corre o mesmo tipo de sangue daquele que foi o maior Variguiano em todos os tempos: Ruben Berta.

Título e Texto: José Manuel – Houve erros? Certamente, mas esse foi de longe o pior. Infelizmente! Outubro 2021

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