Mário Florentino
Os estudiosos da ciência
política têm dedicado bastante atenção, nos últimos anos, ao que se
convencionou chamar de “qualidade da democracia”. Esses estudos avaliam as
democracias através de vários critérios, para além da existência de eleições livres
e justas, incluindo as liberdades civis, a existência de freios e contrapesos
(“checks and balances”), a participação dos cidadãos nas instituições
democráticas, o dinamismo da sociedade civil, a igualdade no acesso aos
recursos e ao poder, ou a liberdade dentro de diferentes grupos na sociedade,
entre muitos outros critérios.
Várias instituições publicam
anualmente os seus “rankings” de qualidade da democracia. A nível global as
coisas não são animadoras. Por exemplo, o Democracy Index (desenvolvido pela
EIU - Economist Intelligence Unit), concluiu que em 2020 quase 70% dos países
diminuíram o seu indicador no ranking (na maior parte dos casos em consequência
dos confinamentos relacionados com o Covid-19 e da prisão de jornalistas
acusados de desinformação). Vários países baixaram a sua classificação de
“democracia completa” para “democracia imperfeita” ao longo dos últimos 10 anos
(incluindo os Estados Unidos, a França e a Bélgica, por exemplo).
Em 2020, existiam apenas 23
democracias completas em todo o Mundo (correspondendo a 14% dos países e a 8,4%
da população), menos 3 do que em 2006. Em contrapartida, os regimes
autoritários passaram de 55 para 57, nesse mesmo período, estando neste momento
mais de 35% da população mundial a viver em ditaduras.
A nível nacional, o panorama não é melhor, infelizmente. No índice da EIU, já tivemos a classificação de 8,16 (numa escala de 0 a 10), em 2006, e baixámos para os 7,90 de 2020, já depois de termos também descido para a classificação de “democracia imperfeita” em 2011. No Ranking do V-Dem, Varieties of Democracy (um instituto de investigação independente, fundado pelo Banco Mundial e outras instituições), Portugal baixou a sua classificação em todos os indicadores considerados, de 2019 para 2020. Finalmente, no Corruption Perception Index (publicado pela organização não-governamental International Transparency), temos em 2020 uma classificação inferior à que tínhamos em 2016, tendo sido ultrapassados neste período, por exemplo, pela nossa vizinha Espanha.
Mas, deixando os números e as
estatísticas de parte, quem acompanha atualidade política neste canto da Europa
não pode deixar de concluir que a democracia e o Estado de Direito já tiveram
melhores dias. O mais recente sinal da degradação das instituições foi a forma
arrogante, prepotente e até mal-educada, como o nosso primeiro-ministro se
dirigiu a um deputado da Nação, esquecendo-se que o seu papel no Parlamento é
precisamente o de dar explicações aos deputados, legítimos representantes do
Povo. Com este tipo de comportamentos, não admira que o nosso lugar nos
rankings da qualidade da democracia esteja continuamente a descer, como aliás
um ex-Presidente da República também lembrou no seu mais recente artigo no
Expresso.
Fica Bem 👍
Prémio Nobel da Paz. Os
jornalistas Maria Russa, das Filipinas, e Dmitry Muratov, da Rússia, ganharam o Prémio Nobel “pelos seus esforços na salvaguarda da liberdade de
expressão, condição imprescindível para a democracia e para a paz duradoura”.
Num momento em que a liberdade de expressão está sob enorme pressão, em vários
países, incluindo em Portugal, e também devido ao fenómeno complexo da
digitalização e das redes sociais, é muito importante que o Comité Nobel mostre
este sinal de preocupação. Parabéns aos corajosos jornalistas premiados.
Fica Mal 👎
Serviço Nacional de Saúde.
Durante o ano e meio de pandemia, António Costa e a ministra Temido, não se
cansaram de elogiar o SNS e a sua performance no combate à pandemia. Não duvido
que tenham sido elogios merecidos - nomeadamente aos profissionais - mas é no
mínimo estranho que, mal acaba a pandemia, o SNS esteja a “rebentar pelas
costuras” e num estado lastimável em todo o país. Só no Hospital de Setúbal
demitiram-se 87 dos 90 médicos, com uma carta duríssima onde relatam a
“situação dramática” e de “ruptura iminente”. Afinal parece que o SNS está bem
pior do que nos queriam vender.
Título e Texto: Mário
Florentino, Benfica, 11 de outubro de 2021
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