José Manuel
O ano era 1973, e eu na instrução pra cima e pra baixo neste Brasil continental.
Eram de três a quatro turmas de
comissários por ano, devido à futura chegada do DC-10 no ano seguinte, e o
volume de promoções ao novo equipamento era muito grande, precisando de
reposições em todos os cargos e equipamentos com urgência no setor nacional.
Era realmente muito trabalho,
mas tinha que ser executado e o era por doze instrutores, e eu um deles.
Estava habilitado tecnicamente
no AVRO, no ELECTRA, no FH-227, no B-727, e no B-707. Só não voava o 14-Bis,
porque o máximo de equipamentos permitidos era cinco. Isso significava ter
feito o curso de todos eles e provas no DAC para obtenção dos certificados.
E voava todos eles, dia sim
outro também, fora os relatórios de cada um dos futuros tripulantes
habilitados.
Então, num belo dia, a minha
escala dizia que eu iria a Fortaleza, saindo do Rio, via Recife, e Natal.
Pernoitaria em Fortaleza e no
dia seguinte voltava por Natal, Recife, Rio e prosseguia por São Paulo até
Porto Alegre. Àqueles que não conhecem, aviação parece ser cansativo, e
realmente é. Muito!
Mas éramos jovens e voar o
727, aquele belo avião, o “Cadillac dos céus " era mais que uma aventura,
era um prazer indescritível.
Era novo, silencioso, de última geração à época, um ar-condicionado perfeito, uma delícia para voos do nordeste e norte. Um serviço de bordo primoroso, pensado nos mínimos detalhes, coisa que as novas gerações, tanto de tripulantes como passageiros, jamais conhecerão, nem em sonhos.
A programação de escala foi
rigorosamente cumprida, tanto na subida como na descida, e chegamos a Porto
Alegre por volta das 15h depois de ter decolado de Fortaleza às 7h da manhã.
Fomos então para o hotel, e
assim que cheguei ao quarto, banho tomado, mala desfeita, deitei-me na cama,
moído de cansado e…. o telefone tocou!
– Zé Manuel... (logo pensei no
Plínio), mas era o D'Avila, Gerente da DSB em Porto Alegre.
– Tudo bem Sr. D'Avila, em que
posso ajudar?
– Estamos com um problema aqui
no aeroporto. Nosso AVRO está na pista para o voo do interior, os passageiros
retidos na estação, o voo está atrasado uma hora porque o Comissário escalado
não apareceu.
– Então?
– Então, estou te requisitando
para fazer o voo e uma kombi está indo te buscar.
– Tudo bem, mas e a
regulamentação e o seguro de toda a tripulação?
– Já está tudo providenciado
com a tripulação técnica e o Diretor se responsabiliza pela tua regulamentação.
Diante disso, a única
alternativa foi colocar o uniforme ainda quente de Fortaleza e rumar na minha
sempre amiga kombi azul e branca, para as asas do AVRO à minha, espera na
pista.
– Boa tarde, Comandante, me
apresentando, e como o senhor já deve estar ciente estou chegando de Fortaleza
e vou estourar a regulamentação no meio deste voo
– Tudo bem, José Manuel,
estamos cientes e não podemos deixar quarenta passageiros no aeroporto.
– Por mim tudo bem, Capitão,
só queria saber da sua ciência sobre o fato.
– Faça apenas o que puder e se
precisar estamos aqui para ajudar.
– Ok, pode então ordenar o
embarque.
E aí, decolamos para Bagé,
depois Livramento, depois Uruguaiana, depois Alegrete, depois Santa Maria,
chegando de volta a Porto Alegre às 2h horas da madrugada.
Foi épico, pois não sabia se
sorria por ter levado todos a seus destinos, honrando o nome da VARIG, ou se
chorava de tanta dor no corpo!
3h da manhã, sentava de novo
na mesma cama e não me recordo se tomei banho, tampouco se tirei a roupa,
depois de ter acordado às 5h da manhã em Fortaleza, ou vinte e uma horas de
uniforme!!!
No dia seguinte embarquei como
passageiro num 727 em Porto Alegre e só acordei na chegada ao Rio.
Esse foi o meu recorde. Uma
hora a mais que Rio, Luanda, Abidjã, Lisboa.
Título e Texto: José Manuel
– a VARIG, ao longo de 32 anos me deu muito mais do que apenas algumas horas
extras de uniforme.
O navio do desenho animado
The Plaza, 5th Ave – Central Park
O prazer em escrever
O alcance dos sonhos
Sonhos e pesadelos
As ervas da ira (quinta e última parte) Quando não há noções de civilidade
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