José Manuel
Um espetáculo à parte este icônico hotel do século XIX, na esquina da quinta avenida com o Central Park, um dos lugares mais bem situados para um hotel dessa categoria.
Em todos os anos que voei para Nova Iorque, estive por duas vezes no seu gigantesco e lindo hall, me deliciando com a arquitetura desse famoso hotel.
Quem não conhece, vale a pena
ver as fotos no Google, para ter uma ideia da sua imponência, ou ver o filme
“Esqueceram de mim 2" que foi ambientado nesse hotel, com o pequeno Macaulay
Culkin.
Para se desfrutar de um
apartamento básico, pode começar a pensar em desembolsar quase três mil dólares
pela diária, ou um café da manhã no valor de trezentos dólares.
Certamente e sem dúvida
alguma, nunca me hospedei lá, mas um colega nosso, infelizmente in memoriam,
o Sólon Braga, trabalhou lá por dois anos antes de ser tripulante da Varig, nos
repassando o que era de glamuroso esse estabelecimento hoteleiro.
Mas, se nunca me hospedei lá,
e só conhecia a história pelo Sólon e pelas duas vezes que visitei o seu lobby,
o que está fazendo esse hotel por aqui nas minhas memórias?
Bem, vou tentar contar essa história o mais detalhado possível, pois mais uma vez algo muito forte estava ali comigo para me proteger, como de outras vezes.
A partir do ano de 1983,
iniciei minhas escalas fixas com a minha esposa Irene, o que perdurou até
quando me aposentei, ou seja, por dezessete anos ininterruptos.
Foi um período muito tranquilo
na minha vida de aeronauta, pois tínhamos os mesmos interesses e gostávamos de
passear muito em todos os pernoites.
Nova Iorque era um desses
pernoites mágicos que a cada época nos oferecia dezenas de opções. Aos poucos,
juntos fomos descobrindo intensamente a Big Apple.
Assim como toda a metrópole,
Nova Iorque é uma cidade perigosíssima principalmente a "turistas"
desavisados.
E nós tripulantes, ao longo de
nossas viagens, fomos desenvolvendo "modus operandi" de sobrevivência
naquela selva de pedra.
Por exemplo, andar sozinho nas
calçadas, nunca encostado nas paredes e de preferência na rua, encostado nos
carros estacionados ao longo do meio fio. Bolsas jamais a tiracolo e sim no
peito ou barriga. Em duplas, o mais junto possível e olhar 360°, atento aos
pontos cardeais. Calças, preferencialmente jeans e nada de bolsos laterais.
Pois é, nas duas vezes que
desrespeitei esse protocolo de segurança, levei um troco nada agradável. Uma, em pleno Toys “R” Us com uma bolsa a
tiracolo e a minha carteira dentro, ao levantar os braços para pegar um brinquedo
em uma prateleira alta, senti a bolsa leve e tive o desprazer de nunca mais ver
os documentos retirados com perícia por um estilete em um talho no nylon! Sorte
que nunca andava com passaporte na rua e nada a ver com este texto.
A outra foi pior, muito
pior...
Certo pernoite decidimos ir à
Macy's e, ainda hospedados no Roosevelt, pela manhã saímos pela 45th em direção
ao Times Square, para passar primeiro pela Rádio Shack e depois prosseguir à
esquerda pela Sétima Avenida para pegar a Broadway até à famosa loja de
departamentos. Como o trajeto era longo ida e volta, resolvemos levar um
carrinho de malas, a fim de não carregar nada.
Após virar à esquerda no Times
Square, ainda na sétima, logo no primeiro quarteirão, nós, de braço dado e eu à
direita da Irene, com o carrinho na mão direita, sentimos nossos "sensores
de ré" alertando uma aproximação muito rápida por detrás de nós.
Nesse dia, estava usando uma
calça com bolsos laterais, contrariando o protocolo de sempre usar jeans.
Por via de dúvidas havia
colocado meu dinheiro e crachá no bolso esquerdo junto à Irene.
De repente, senti meu bolso
direito ser invadido por uma mão, mas como estava preparado por um
“alerta" anterior, reagimos com muita força, muito rápido e estardalhaço, chutando
e lançando o carrinho em todas as direções. Eram três rapazes escuros e eles
não esperavam a nossa reação, fugindo em disparada. A tentativa de roubo tinha sido frustrada!
Roubo?
Com o susto, nos encostamos à
parede de um prédio para nos refazermos e logo alguns transeuntes vieram nos
perguntar se estávamos bem. Refeitos, senti algo no meu bolso e apalpei. Eram
duas coisas, uma seringa hipodérmica fina com agulha e uma chave. Recoloquei
ambas rapidamente no bolso com cuidado para não chamar a atenção e iniciamos
uma caminhada em zigue-zague rumo ao nosso destino.
Fomos conversando, com atenção
redobrada, e uma coisa estava muito clara.
Ou tinha sido um atentado, ou
uma tentativa de culpabilidade. Ainda não tinha conseguido ver que tipo de
chave era aquela, o que só faria na toalete do Macy's, por segurança.
Uma vez na toalete, no
reservado, com a porta fechada, tirei calmamente os dois objetos do bolso com
cuidado para não me espetar, limpei com papel a seringa, envolvi-a com o mesmo
papel e ali mesmo descartei-a.
E a chave?
Sim, era uma chave de um
apartamento de hotel. Do Plaza Hotel!,
aquele da esquina com o Central Park.
Fiz a mesma limpeza digital
com a chave, depois embrulhei-a e levei-a comigo para fora da toalete até
encontrar a Irene e contar-lhe o que estava no meu bolso.
Consideramos que ela deveria
ser descartada o mais rápido possível e ali mesmo numa lixeira dos corredores
do Macy's.
E assim foi feito, fizemos o
que tínhamos que fazer lá dentro e retornamos ao nosso hotel pela quinta avenida
com os sentidos todos em alerta.
Resumindo, não foi uma
tentativa de assalto.
Foi provavelmente uma
tentativa de incriminação por algo que ocorreu, ou um assalto na rua a um
hóspede, ou mesmo um assalto a um dos quartos do Plaza Hotel.
Eles deveriam estar sendo
perseguidos e por isso o barulho da chegada junto a nós, querendo se livrar
tanto da chave como da seringa. Por isso fugiram tão rápido.
Mas e a seringa? Qual teria
sido a intenção? Apenas se livrar dela?
O que tinha a ver uma chave e
uma seringa cheia?
Não vamos saber nunca o que
realmente ocorreu, aliás nem queremos, mas nos mostrou um outro lado da Big
Apple, um lado extremamente deprimente.
Anteriores:
O prazer em escrever
O alcance dos sonhos
Sonhos e pesadelos
As ervas da ira (quinta e última parte) Quando não há noções de civilidade
As ervas da ira (parte IV) A delinquência nunca compensou
Ira Levin é um homem, um escritor
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