Carina Bratt
A ROSE é quase uma vizinha. Mora num prédio duas quadras abaixo do meu condomínio. Está vendendo um vestido de noiva. Segundo o anúncio colado na banca de jornais do seu Antero, “Sem uso. Urgente! Tratar pelo telefone (27) 9-8843-00-Bolinha Ó”. Lindo, maravilhoso, inigualável. Uau! Fico me perguntando o motivo da criatura estar se desfazendo de uma coisa tão cara. Não conheço a Rose, nunca a vi mais gorda, nem mais magra. O que me deixou intrigada, ‘Sem uso!’. O que passa na cabeça de uma pessoa eliminar de seus guardados uma peça que nunca foi usada?
Estranhei! Pensei em ligar
para o telefone e indagar diretamente seus reais motivos de passar à frente
essa galhardia (vestido de noiva, para euzinha, que sou leiga, é um negócio de
ventura e opulência) somente usada em uma ocasião especial. Aí pensei com meus
devaneios: o que diria a ela? Tenho onze anos e assim que a Rose ouvisse a
minha voz saberia que sou uma menina. Na sequência, descobriria que o meu
interesse não se redundava em outra coisa, senão o de ‘meramente especular’.
Quem sabe, chateada, desligasse o telefone na minha linda carinha concluindo
que entrei em contato mais para ‘tirar um pelo’, ou sacanear.
Se eu tivesse mais idade, ou
andasse às vésperas de trocar alianças, argumentaria que o feitio de quem o
confeccionou não bateu com o meu santo, embora tivesse dito e redito, várias
vezes, ao estilista, como o queria, depois que ficasse pronto. Na esteira de
ainda ser uma garota na flor da idade, um costume de noiva não iria me
beneficiar em nada. Todas as minhas amigas têm a mesma faixa que eu, onze,
quinze, logo, nenhuma de nós precisaria de uma indumentária desse porte. Pelo
menos por agora...
A dúvida, entretanto,
persistia: ligaria, não ligaria, mataria a droga da 'intrometidice', ou
deixaria a coisa quieta e esqueceria, de vez, a loucura que me atormentava? Meu
Deus! Essa enrascada do ‘por que?!’ não dava tréguas. Seguia firme e forte me
atazanando a cabeça e deixando a minha paciência com os nervos à flor negra do
desespero imaturo. O que fazer? Ir em frente? Indagar? Bem que gostaria! Porém
não poderia. Apesar desse diabinho me agastando, carecia seguir até um desfecho
que me acalmasse a alma esbugalhada. A praga da ‘enxeridação’ atrelada ao meu
desejo mórbido de um desfecho lógico aflorara forte demais e martelava os meus
neurônios
Me veio o despautério de pedir ajuda à amiga Carla. A Carla tem dezoito anos, e um espírito inquieto de trinta. Pronto. Resolvida a questão. Acionaria a Carla e fim de papo. Mandei vê. Passei o número do celular da tal da Rose e esperei para ver o que ela descobriria. Nosso papo foi rápido e rasteiro como o de alma atribulada à procura de reza:
Título e Texto: Carina
Bratt. De Vila Velha, no Espírito Santo. 22-5-2022
Que fim levaram as gírias?!
Mãe
De um anjo Muritibano
Pra sempre
Pequenos arranjos para gritos sem ecos
[As danações de Carina] Somos como instrumentos de uma orquestra parada, à espera do maestro
Pra não dizer que não falei do amor...
Lindo texto. Parabéns. A cada novo título me surpreende. Você nasceu pra brilhar.
ResponderExcluirAparecido Raimundo de Souza
Vila Velha ES.