terça-feira, 3 de maio de 2022

[Estórias da Aviação] O alcance dos sonhos

José Manuel

Por volta de julho de 1974, entreguei o meu cargo de instrutor no setor nacional, depois de mais de dois anos nessa função, o que valeu muita experiência para o meu futuro laboral na empresa.

Por coincidência, no dia em que encerrava esse ciclo, fui chamado a colaborar mais uma vez, sendo designado meio a toque de caixa para um curto baseamento em Lisboa, como já descrito em texto anterior, a fim de substituir um colega que se acidentou naquele baseamento.

Apesar de todas as urgências, em que esse processo se revestiu, acabou dando tudo certo, cobrindo a falta e também me pondo a par do que era uma aviação internacional, uma vez que a minha experiência até então havia sido apenas neste imenso Brasil.

Então, de retorno em agosto de 1974, fui definitivamente incorporado à RAI, ou Rede Aérea Internacional, desejo alimentado por todos que escolheram a carreira de Aeronautas.

Foi uma época de sonho, não só pelo descobrimento do novo, mas pelos pernoites que na sua maioria ainda eram com um, dois e até três dias inativos, dependendo da rota.

A VARIG entrava num processo de modernização com expansão de novas rotas, o gordão DC-10 mal havia chegado, sendo alocado nas rotas nobres de New York, Paris e Frankfurt.

Então, quem reinava soberanamente nestes primeiros anos pós a minha chegada ao setor internacional em 74, ainda era o flexa ligeira Boeig-707, onde me encontrava fixo.

Como as rotas não paravam de crescer naquela época de forte expansão, não havia equipamento disponível suficiente para cobrir todas elas, e as frequências a essas cidades ainda, entre 74 e 78 eram bastante esparsas pois apenas haviam chegado quatro DC-10, que logo foram alocados em rotas nobres.

Traduzindo, por exemplo o voo de Genebra tinha apenas uma frequência por semana, significando que a tripulação permanecia por três dias sem contar o dia da chegada e o da saída, esperando que a outra frequência chegasse para, retornar ao Brasil.

Isso era a glória, das glórias, principalmente para mim que iniciava o meu trabalho internacional, e já o fazia começando pela Suíça!

Nada poderia ser melhor que isso, para quem estava acostumado a dez escalas pelos sertões e campos de pouso empoeirados do Brasil.

Permanecer quase cinco dias na Suíça, era como tirar a sorte grande para nós.

O Hotel era deslumbrante, uma construção neoclássica no alto de uma colina, cujos talheres inclusive nos quartos eram todos de prata e uma vista maravilhosa da cidade, com o lago Léman fazendo o seu contorno.

Tudo aquilo era um sonho, difícil de acreditar. Para chegar ao centro e ao lago, descia-se por uma avenida linda onde pela primeira vez vi algo insólito.

Ao descer à cidade, na parte da manhã passávamos por uma caixa de metal cheia de jornais e aberta, na calçada.

Na lateral uma caixinha também aberta.

Quando voltávamos à tarde, os jornais tinham acabado e a tal caixinha estava cheia de moedas e… aberta!!

Foi o meu primeiro choque cultural e claro estaria aqui nas minhas memórias pois a visão daquilo foi uma das experiências mais marcantes e difíceis de esquecer, para um Sul-americano nada acostumado a esse tipo de civilidade.

A cidade de Genève, ou Genebra é linda, limpa e super agradável e era uma delícia passear por suas avenidas floridas ou navegar pelo lago Léman com o seu chafariz imenso.

Cidade sede europeia da ONU, ao navegar pelo lago tem-se uma visão do majestoso edifício sede, numa das margens do lago.

Tudo é bonito na cidade florida, fora é claro os passeios desde que alugando um carro, para se ir a lugares fantásticos. 

Um desses passeios que fizemos, fomos à cidade de Chamonix, 82 km de Genebra por uma estrada lindíssima e já na França, nos contrafortes do Mont Blanc que faz fronteira com a França a Suíça e a Itália.

Nesse passeio, nevava muito e conhecemos o pequeno centro da cidade, que com a neve se tornou mais interessante e acolhedor do que normalmente é. Uma delícia   fazer um lanche ou simplesmente tomar um chocolate “chaud" em um de seus bares ou restaurantes aquecidos.

Gostaria muito de lá voltar e curtir aquilo tudo outra vez.

Através de teleféricos chega-se a um dos vários topos onde se descortina uma vista fantástica dos três países. Cheguei a ir até ao Skywalk na agulha do Midi com 3.777 metros e uma vista fabulosa dos Alpes.

Passeio maravilhoso e inesquecível que faz parte de uma coletânea de sonhos que vivi e saboreei ao longo da minha vida.

Título e Texto: José Manuel – vontade de mergulhar neste texto e emergir ao lado do chafariz do Lago Léman. Muita saudade! Abril 2022 

Anteriores:
Sonhos e pesadelos
As ervas da ira (quinta e última parte) Quando não há noções de civilidade
As ervas da ira (parte IV) A delinquência nunca compensou
Ira Levin é um homem, um escritor
Um New York, um idiota e o fusca verde
As ervas da ira (parte III) – Gozador extrapolando limites 
As ervas da ira (parte II) – Quando o demônio se incorpora 

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