José Manuel
11 de março de 1990, um domingo, eu e a Irene pernoitando em Nova Iorque, como sempre uma bela jornada, um frio de 11°C suportável, um belo dia para se estar na Big Apple, sem nada muito significativo, exceto algum passeio, um teatro ou um jantar diferente.
Segunda, 12, como de hábito, o
nosso retorno previsto com chegada à nossa casa na manhã de 13, uma terça-feira
como tantas outras, a única diferença era a expectativa que o país vivia em
torno da posse do novo presidente, Fernando Collor de Mello naquela mesma
semana, ou 15, quinta-feira.
Aquele nome com LLLLs
quadruplicados no sobrenome, punhos cerrados, olhar esbugalhado e pupilas
dilatadas, não me agradava desde 1985, quando fomos, eu e Irene, passar férias
em Miami e no retorno, esticamos até Maceió para conhecer melhor os prazeres do
nordeste.
Nossa estadia em Maceió foi
ótima em tudo, por tudo excetuando a campanha política para governador, desse
sujeito altamente demagogo, enrolador de um eleitorado pobre, num Estado
paupérrimo.
Já à época fiquei revoltado
com o volume e a qualidade visual da campanha milionária desse político coronel
terceiro mundista.
Mas eu estava de férias com
aquela que seria minha companheira por toda a vida e não seria um idiota que
iria estragar nossos prazeres simples, mas amados.
Em 1990, já de antemão sabia o
que iria acontecer com o nosso país nas mãos de um celerado da vez como aquele,
mas uma gota num oceano, não faz diferença alguma e era tocar a vida da melhor
maneira possível.
Eu estava certo e ele
correspondeu exatamente ao que pressentia.
Voltando ao Nova Iorque, na
subida do voo durante o meu plantão folheando o caderno econômico de algum
jornal, meu alarme interno disparou, ao ler que rumores diziam de um novo plano
econômico extremo, logo após a posse.
A mim não era nenhuma
novidade, a não ser as poupanças que tínhamos na Caixa Econômica e que serviam
de lastro à construção da nossa casa.
Isso significava que teria pouquíssimo tempo para resolver o que faria, entre a nossa chegada e a posse do possuído.
Depois de conversarmos naquele
mesmo domingo novaiorquino, resolvemos que no mesmo dia da nossa chegada, na
terça 13, iríamos à Caixa resgatar as nossas economias, sem a menor culpa.
E assim fizemos, cansados, mas
felizes pois pressentimos a tempo. E aí o que fazer com o dinheiro? Colocar em
outro banco nem pensar. Então separamos
algum para a construção e compramos, máquina de lavar nova, máquina de costura,
geladeiras novas e… um fusca verde ano 81/82 que sorriu para nós quando
passamos pela agência.
Foi esse fusca que nos levou
por mais de 15 anos ao mundo inteiro enquanto nos esperava de volta, fielmente
no aeroporto.
Apenas uma vez, enquanto
estávamos viajando e ele aqui na roubolandia, estacionado na infraero, como
sempre, sofreu um atentado com arrombamento e roubo de alguns órgãos vitais.
Então teve que voltar de reboque para a oficina e para sua casa.
Como não amar esse carrinho?
Durante esses anos tivemos e vendemos alguns irmãozinhos dele, mas jamais
passou por nossa cabeça nos desfazer do pequeno grande carro. Aí veio a
tempestade do Aerus e ele teve que ficar estocado por 20 anos, mas sabia, tinha
certeza de que um dia eu iria tratar dele.
O dia em que o liguei de novo
explodiu em alegria, de primeira, como se dissesse que havia valido esperar
tanto. Agora estou resgatando suas
feridas temporais, uma a uma e hoje fiz a primeira viagem longa com ele. Mais
de cem quilômetros e fomos conversando como antigamente. Foi e voltou feliz
comigo. Tomou seu primeiro banho geral hoje em tantos anos e está pronto para
um banho de loja e ficar radiante como antes.
Mas, e o causador involuntário
da nossa grande amizade?
Um dia depois da sua posse,
possuído que estava pelo demônio, fez com que muitos perdessem tudo, muitos se
suicidaram, muitos adoeceram e muitos desistiram de viver. Foi isso que ele fez
sequestrando o dinheiro do povo.
E esse mesmo possuído, foi
quem começou a destruição lenta da VARIG ao fazer o tal de "Open Skies“,
traindo seu país e tudo de bom que aqui havia em termos de aviação, deixando
que toda a espécie de abutres tomasse conta dos nossos céus.
Depois, não satisfeito, com
seu aliado menos confiável ainda, dono de ônibus sem asas, mas que os dois
achavam e queriam transformar em uma super empresa aérea, fizeram de tudo para
asfixiar a Pioneira cortando até a terceira fonte de custeio do Aerus. E o pior
é que conseguiram!
Perdeu a faixa, perdeu o cargo
e hoje é um zumbi odiado andando por aí sem ninguém lhe dar a menor atenção.
E nós? Bem, nós não só
lutamos, o que nos fortaleceu como homens, como vencemos a traição que ELLLLE
nos quis impingir.
Agora, a União que o devia
punir, está pagando caro pelos seus atos insanos.
E eu e o fusca verde estamos
morrendo de rir desse idiota, e de felicidade por estarmos juntos e passeando
outra vez.
Acredito que tudo na face da
terra tem a sua própria “alma". Depende muito do olhar de cada um, sobre
pessoas ou objetos.
Título e Texto: José Manuel
– hoje ele sorriu de novo, na velha estrada conhecida. Parecia uma criança
feliz correndo pela pista outra vez!
Anteriores:
As ervas da ira (parte III) – Gozador extrapolando limites
As ervas da ira (parte II) – Quando o demônio se incorpora
Eu, a Panair e o assombro das imagens
A Pedra da Gávea e o voo de Miami
As ervas da ira (parte I) – Um sonho quase desfeito
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