José Manuel
Foram várias as ervas
daninhas, que apareceram no meu "quintal " como a me desafiar. A
segunda erva da ira ocorreu exatamente no meu primeiro voo para BHZ (Belo
Horizonte), logo no primeiro mês de trabalho, coisa que jamais poderia pensar
que ocorreria.
Éramos sempre dois comissários
no Avro.
Tudo era novidade e para minha surpresa e júbilo fiquei hospedado logo de cara no melhor hotel de BH, o Del Rey. Eu e o colega ficamos no mesmo andar em quartos contíguos.
O Comandante tinha nos
convidado para jantar no próprio hotel, e no horário combinado lá estava eu
conversando e jantando, enfim, travando os primeiros contatos com um mundo novo
e deslumbrante para mim. O jantar foi ótimo com as experiências sendo
absorvidas, mas o referido colega não compareceu, o que achei bastante estranho
pois a minha visão de sociabilidade era outra.
No dia seguinte, bem cedo
desci para o desjejum e fechei a porta, deixando meus pertences dentro do
quarto. Em seguida retornei para a higiene adequada e vestir o uniforme.
Uma vez pronto, e ansioso,
pois não queria me atrasar logo no primeiro voo, ao sair do quarto, por
absoluto desconhecimento de regras, e inocência de copetinho, deixei a porta do
meu quarto entreaberta para facilitar o serviço da camareira, ou assim pelo menos
entendia.
Ato contínuo, desci ao lobby, entreguei a chave na recepção e fiquei aguardando a tripulação descer.
Em seguida rumamos para o aeroporto na indefectível kombi azul e branca, e decolamos de volta ao Rio.
O voo corria normalíssimo, e
eu adorando tudo o que se passava, apenas notei que algo não ia bem, apesar da
pouquíssima experiência, pois faltando
apenas vinte minutos para o pouso, o Comandante (in memoriam) apareceu na galley dizendo que havia recebido
um rádio do despacho de BHZ, com a informação de que material de conforto, tipo
lençóis, fronhas e cobertor do meu quarto haviam desaparecido, mas que ele
não acreditava, por termos conversado muito no jantar e ter
me achado uma pessoa sociável, educado, enfim uma pessoa agradável, tivesse feito aquilo.
Perdi o meu chão
momentaneamente e foram segundos infinitos até que eu reagisse e tomasse a
iniciativa de mostrar a minha mala.
Meu colega continuava
impassível ao meu lado até que o Comandante solicitou que ele abrisse a sua
mala.
A cena não poderia ter sido
mais constrangedora e repugnante pois o meu quarto todo estava dentro daquela
mala.
O colega, que nem sei se devo
chamá-lo assim, depois que desci, aproveitou a minha bobeada entrou no meu
quarto e fez uma festa digna de Agatha Christie, com a rouparia que eu havia
dormido!!
O Capitão me agradeceu, pediu
desculpas e retornou ao cockpit sem dizer uma palavra.
Ao pousarmos no Santos Dumont
os passageiros foram desembarcando e dois seguranças e uma kombi da empresa
aguardavam o ex-tripulante, ao pé da escada.
Uma cena que por mais que
queira, nunca saiu da minha cabeça pois o meu futuro, em minutos, foi do céu ao
inferno, sem escalas.
A minha sorte foi o hotel ter
telefonado ao despacho e este ter passado o rádio a tempo, pois se isso tivesse
ocorrido após o desembarque e o abandono da aeronave, não estaria aqui
escrevendo as minhas memórias.
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Os números esquecidos, a realidade e as consequências
As ervas da ira. (Prólogo)
O voo 100, o apartamento e Lisboa
[Estórias da Aviação - Extra] Fatos & Cronologia
A chegada do Jumbo e o bullying finito
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