O confisco que a GoFundMe fez das doações para os caminhoneiros canadenses é um ataque vil e elitista à democracia
Brendan O'Neill
O confisco pela GoFundMe dos
fundos dos caminhoneiros que estão protestando contra as regras sobre a
vacinação no Canadá é, a meu ver, um dos atos mais notórios e antidemocráticos
já realizados pelas elites canadenses que controlam a World Wide Web. Esses
caminhoneiros, trabalhadores tão essenciais, revoltaram-se contra uma nova
regra criada pelo primeiro-ministro, Justin Trudeau, no começo do mês,
estipulando que caminhoneiros que atravessarem a fronteira entre o Canadá e os
Estados Unidos precisarão ser vacinados ou serão colocados em quarentena depois
de cada viagem. É uma exigência absurda. E prejudicaria seriamente a
possibilidade de alguns motoristas de ganhar a vida.
Então os caminhoneiros se revoltaram. Eles atravessaram o Canadá com caminhões enormes, no que passou a ser conhecido como o Freedom Convoy — ou Comboio da Liberdade — antes de parar na capital, Ottawa, onde estão bloqueando as estradas e provocando escândalos entre os liberais de classe média, que não conseguem entender por que esses brutos não continuam transportando sacos de couve para o supermercado do bairro e param de exigir seus irritantes direitos.
Houve uma enxurrada de apoio. Canadenses e americanos cansados do corona-autoritarismo estão aplaudindo os caminhoneiros por fazer um grande buzinaço coletivo contra o consenso elitista da covid-19. Apesar dos melhores esforços de políticos e colunistas descolados para retratar os caminhoneiros como membros do QAnon sobre rodas, como uma versão motorizada da Marcha sobre Roma de Mussolini. Muitas pessoas sabem que, na verdade, eles são trabalhadores decentes que apenas se opõem ao Estado dificultar um pouco mais suas vidas.
Um movimento revoltado e
estranhamente pacífico
As pessoas também sabem que o
conjunto de tentativas woke de deslegitimar o Freedom Convoy
apontando comentários de “extrema direita” feitos por um pequeno punhado de caminhoneiros
é uma tática tão antiga quanto o próprio capitalismo. Oponentes de elite da
organização da classe trabalhadora sempre usaram difamação e insinuações para
tentar neutralizar uma multidão. Ao enxergar essa campanha de difamação pelo
que ela é, muita gente decidiu dar alguns dólares para os caminhoneiros. Mas o
GoFundMe teve outra ideia. A empresa afirma que os 10 milhões de dólares
canadenses arrecadados pelo site, em uma página chamada “Freedom Convoy 2022”,
não serão entregues aos caminhoneiros. Ela cita relatórios da polícia sobre
“violência” no comboio.
Que violência? Onde? Milhares
e milhares de pessoas se juntaram aos protestos dos caminhoneiros e, no
entanto, só houve três prisões. Uma pessoa foi detida por posse de arma, outra
por “danos” e mais uma por fazer uma ameaça nas redes sociais. Em se tratando
de protestos de massa, foi nível muito baixo de comportamentos supostamente
criminosos.
O ataque woke ao
Freedom Convoy é descaradamente elitista
Certa vez, visitei um
acampamento do Occupy, na catedral de St Paul’s, em Londres, e vi pelo menos
três delitos na uma hora que passei lá: urinar em público, ameaça e perturbação
da paz por homem sob o efeito de heroína que ficava gritando “VÁ SE FODER”. Para
um movimento de massa revoltado e furioso, o Freedom Convoy é estranhamente
pacífico. A “violência” de que o GoFundMe fala é claramente um pretexto
oportunista para uma decisão política de punir os caminhoneiros.
Na sexta-feira, a empresa
publicou uma declaração afirmando que o Freedom Convoy era um movimento
pacífico quando começou, mas que de lá para cá “se tornou uma ocupação”. E, por
isso, “mais nenhum fundo será encaminhado diretamente aos organizadores do
Freedom Convoy”. Em vez disso, os 9 milhões de dólares canadenses que continuam
nos cofres do GoFundMe serão distribuídos para organizações beneficentes
“confiáveis” ou devolvidas para os doadores que preencherem um formulário.
Dois pesos, duas medidas
Como que para deixar bastante
claro que tudo isso é muito político, o Facebook removeu uma página que
promovia um Freedom Convoy em Washington, DC e apagou a conta pessoal do
caminhoneiro que a criou. “É censura na sua melhor forma”, disse o homem em
questão. Ele não está errado. Parece um caso clássico de as novas oligarquias
do capitalismo se alinhando ao establishment político — neste
caso, o primeiro-ministro, Justin Trudeau — para diminuir e silenciar os gritos
de pessoas simples que desafiam o consenso.
Quer venha dos guardiões
assustadoramente poderosos da internet ou dos críticos dos caminhoneiros, o
ataque woke ao Freedom Convoy é descaradamente elitista. As
pessoas que condenam os bloqueios dos caminhoneiros em Ottawa são as mesmas
pessoas que teriam aplaudido as marionetes chiques do movimento Insulate
Britain quando elas tomaram a M25 e outras vias importantes do Reino Unido.
Os politicamente corretos
preocupados que o Freedom Convoy tenha se tornado uma ocupação — o horror! —
sem dúvida foram fãs do Occupy Wall Street e do Occupy St Paul’s. A
razão para essa hipocrisia de “dois pesos, duas medidas” é totalmente clara. Os
movimentos Insulate Britain e Occupy foram criados por pessoas eloquentes e de
boa formação que, com todas as suas pretensões radicais, na verdade repetiram
os consensos de autodesprezo do capitalismo do século 21. Ao passo que os
caminhoneiros de boné e buzina do Freedom Convoy e da ocupação de Ottawa são
pessoas da classe baixa que lutam contra os consensos políticos e morais das
novas elites governantes. Então o primeiro grupo é considerado descolado e pode
continuar existindo, enquanto o segundo precisa ser detido de todas as formas
necessárias.
A nova classe dominante
A interferência anticlasse
trabalhadora do GoFundMe na distribuição dos fundos faz parte da arrogância cada
vez maior do Vale do Silício. Esses milionários e bilionários que não prestam
contas e controlam setores-chave da internet deixaram escancaradamente clara
sua disposição para interferir na vida democrática. Temos o Twitter e o
Facebook censurando Donald Trump, presidente dos Estados Unidos na época. O
Spotify está sofrendo pressão para silenciar ou pelo menos repreender
vozes anti-woke, como Joe Rogan. Diversas redes sociais
controlam rigidamente o que podemos dizer sobre sexo, gênero, raça, imigração e
outras questões, e silenciam qualquer um que desvie da linha “correta”. Essas
empresas exercem um enorme controle sobre a praça pública do século 21. Estão,
unilateral e alegremente, punindo e excluindo qualquer um que desvie dos
ditames morais na nova classe dominante.
A privação de fundos dos
caminhoneiros revoltados leva tudo isso um passo além. Essa é uma empresa com
fins lucrativos (o capitalismo) agindo contra os interesses dos motoristas de
caminhão enfurecidos (a classe trabalhadora). No passado, as pessoas boicotavam
empresas e corporações que quebravam sindicatos, em um esforço de mandar uma
mensagem para os arrogantes reis do capital. Proponho fazermos o mesmo agora.
De minha parte, eu não vou mais usar o GoFundMe, agora que descobri que a empresa
está disposta a confiscar milhões de dólares dos trabalhadores cujo único crime
é acreditar que suas informações médicas não deveriam ser uma barreira para o
seu direito de ganhar a vida.
O nosso congresso e a constituição de 1988 é o CAVALO DE TROIA que ULISSES Guimarães nos deixou.
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