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Foto: DR (retirada daqui) |
Os escândalos no âmbito do Ministério
dos Transportes, em licitações da Petrobras, na área elétrica (Furnas), na
prefeitura de Campinas e até nas obras de recuperação de regiões devastadas
pelos temporais no Rio têm despertado indignação na imprensa e na opinião
pública. O andamento do processo do “mensalão”, no STF, sem dúvida, reforçará a
atenção a esses malfeitos recentes.
Não pretendo aqui voltar aos eventos
em si, bem relatados por revistas, jornais e noticiários de rádio, TV e
internet. Restrinjo-me a comentários sobre mitos subjacentes nas análises dos
fatos.
O primeiro mito é o de que, no tocante
às questões federais, trata-se “de herança do governo Lula, que a administração
Dilma começa a combater”. É uma meia-verdade: a herança maldita é do governo
Lula-Dilma para o governo Dilma; de um governo do PT e seus aliados para outro
governo do PT e seus aliados. “Começa a combater”? Os escândalos na esfera
federal, como no caso dos Transportes, não foram apontados pelo próprio governo
ou pela oposição, mas pela imprensa. E seus eventuais desdobramentos parecem
ser alimentados hoje pelas ameaças e contra-ameaças dos próprios protagonistas
dos malfeitos.
Outro mito tem a premissa de que
“todos os governos sofrem esse drama do fatiamento dos cargos, que leva à
corrupção”. Nem tanto! Isso depende das atitudes dos que nomeiam, dos que
mandam, e do comportamento do próprio partido-eixo do governo, começando pelo
presidente. Uma coisa é a composição política, inevitável num presidencialismo
de coalizão, como o denominou Sérgio Abranches. Outra é transformar a política
num verdadeiro mercado, formal ou paralelo, de negócios.
Por que é assim? Não estamos diante de
um tema fácil, de caracterização totalmente objetiva. Há um fator aparentemente
intangível, que tem grande importância explicativa. Desde a sua fundação até
chegar ao poder, o PT aparecia como o verdadeiro depositário da ética na vida
pública, embora seu desempenho à frente de algumas prefeituras sugerisse que o
título não era tão merecido.
O comportamento do PT no poder federal
– o oposto do discurso de quando estava na oposição – criou um clima na base de
“Deus está morto” na vida pública. E, se isso aconteceu, então não haveria mais
pecado. Eu acompanhei de perto a metamorfose petista, em toda sua envergadura,
e estou plenamente convicto do seu impacto devastador sobre os padrões da
política brasileira.
Depois de um ano da primeira eleição
de Lula, analisando o que já se delineava como estilo de governo, qualifiquei o
esquema partidário petista como uma espécie de bolchevismo sem utopia, em que a
ética do indivíduo é substituída pela ética do partido. Em nome desse partido,
tudo vale, tudo é permitido, tudo é justificável. Essa é a lógica que embasou a
proclamada “mudança” do petismo. Uma mudança, obviamente, para pior no que
concerne à vida pública.
Na administração pública, quando o mau
exemplo vem de cima, não há moralidade que resista. Isso se expressa de forma
perfeita nos gestos de Lula e de seu partido, que passaram a mão na cabeça dos
líderes do mensalão e dos aloprados, reabilitando-os, e até de malfeitores de
partidos aliados. Por que não ser compreensivos e carinhosos com aqueles que
foram “vítimas” de excessos ou inabilidades “perdoáveis”? Criminosos foram
tratados como vítimas da imprensa e de supostas conspirações intra ou
interpartidárias, como se, na origem dos desmandos, não estivesse o desvio de
recursos públicos.
O desenfreado mercado de trocas entre
dinheiro público e apoio político, que lesa os contribuintes, não decorre do
sistema político brasileiro, como gostam de asseverar alguns analistas, ainda
que o aperfeiçoamento dos controles possa contribuir para alguma melhora na
situação. É consequência da ação de partidos e de pessoas, capazes de degradar
a política em qualquer sistema. Essa degeneração de valores não conduz a uma
forma eficiente e estável de governar, até porque o fatiamento de cargos e as chantagens
tornam-se sem limites, contemplando mais e mais facções e subfacções,
alastrando-se de forma descontrolada por todas as esferas da administração
pública, acentuando a falta de planejamento e de rumos do governo.
Título e Texto: José Serra, 12-07-2011 (por e-mail)
Edição: JP
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