Algumas vezes, as questões são complicadas e as respostas
simples.
Dr. Seuss
Tenho uma comadre de pular fogueira.
Como vocês devem saber, o compadrio de pulada de fogueira, no São João
nordestino, é uma coisa muito séria, dura para a vida toda. Só pulamos fogueira
para estabelecer compadrio com pessoas que gostamos e admiramos. Essa minha
comadre, Mabel de nome, casada com o médico Dr. Peri, de bigode à la Groucho
Marx, tem solução simples para os mais complicados problemas. Por exemplo, eu
dizia, fulano está muito gordo; ela respondia: pudera, come pouco; eu dizia,
fulano está sem dinheiro, coitado; ela respondia: pudera, trabalha demais.
E assim, ela, com minha ajuda, ia
construindo o mundo ideal: come-se muito para não engordar, trabalha-se pouco
para ter dinheiro, jogador de bola deveria ter a panturrilha na frente da
canela, a boca deveria ser na barriga, faltou água, não tome banho... E os
exemplos nunca acabavam. Ela sempre tinha uma palavra, uma sentença simples
para a solução dos mais intrincados problemas. Uma gênia, como diria Dilma.
Era, por esse dom, considerada a pitonisa grapiúna.
Vou colocar um problema. Se tiver
dúvida, ligo para ver se ela tem uma solução.
Para o direito, mors omnia solvit. Passando para linguagem de gente, a morte
resolve tudo. Se não houvesse morte, não haveria religião. As religiões sempre
nos acenam com algum lugar depois da morte: inferno, paraíso... Essa promessa
de uma vida melhor ou pior, depois da morte, mantém-nos ancorados, durante a
vida, a certos princípios. Ora, se há o bom e o ruim após a vida, o ruim só
pode ser destinado aos maus. Essa obviedade decorre de uma razão muito simples,
se não punirmos os maus, como haveremos de regalar os bons?
Voltemos ao princípio da conversa para
reestabelecer nosso pensamento. Como diria Chacrinha, aqui estou para
confundir, não para esclarecer. Então, fica combinado, a morte não existe e
somos imortais, porque outra consequência não poderia ser sacada da
inexistência da morte.
E daí? E daí é que se somos imortais
sempre existimos e sempre existiremos. Mas, um incrédulo ou um chato, que gosta
de atrapalhar as verdades e os raciocínios alheios, que não gosta de nos ver
eternamente felizes, mesmo sob hipótese, há de indagar se tudo que existe não
teve um princípio e um fim, com pontaria certeira para matar nossa tese no
nascedouro.
Respondemos ao incréu, chato,
atrapalhador, que o tempo só conta para as coisas finitas, que ele vive
agarrado ao tempo porque precisa estabelecer cronologia para tudo: segundos,
minutos, horas, dias, semanas, meses, ano... Essa necessidade de estabelecer e
medir o tempo é coisa da brevidade. Deus, que não é breve, não usa relógio.
Nunca vi uma reprodução sua com bolso ou algibeira para guardar relógio, ou com
rolex de ouro no pulso.
Ah, mas ele criou o mundo em seis dias
e descansou no sétimo, então... Então o quê? Quem estabeleceu esse calendário
da criação foi quem escreveu a bíblia, mesmo assim há uma grande discussão se o
estabelecimento desse calendário da criação é meramente alegórico: os dias de
Deus não corresponderiam aos dias dos homens. E mesmo que os dias da gênese
criativa correspondessem ao nosso tempo, isso não quer dizer que, para Deus,
eterno como é, o tempo contasse. E mais, se os seis primeiros dias
correspondessem ao nosso tempo, para dizer a extensão temporal de sua grande
obra, a partir do sétimo dia o tempo não mais teria significado. Se ele passou
a descansar no sétimo dia, esse dia, como um dia de bom baiano, como eu, nunca
mais acabou, ante a evidência de que ele entrou de férias eternas e nada mais
fez, desde então, ganhando eternidade o dia do descanso. E isso, como diz a
propaganda, com ritmo bom de samba de roda, “só se vê na Bahia”.
Mas estamos de novo nos desviando do
caminho originalmente traçado: somos eternos e o tempo não conta. Se eternos
somos, prescindimos de religião e de crença, que crença decorre da fé, que
decorre do mistério, que decorre do insondável, pois para a mente científica,
como diz Roger Scruton, crença é consequência, e não a causa, da compreensão (For the scientific mind belief is the
consequence, and not the cause, of understanding).
Garantida a eternidade, não teremos
Juízo Final, não seremos, lá na frente, julgados por nossos atos. Estaríamos
sem peias religiosas e agiríamos somente por convicção do certo e do errado,
não mais pelo temor do castigo divino. O nosso freio será somente a censura
pública e o castigo dos homens. Mas aqui temos outro problema. Qual temor de
condenação a anos de prisão se sempre teremos, após o cumprimento dessa pena, a
eternidade pela frente? Então a solução seria a pena de morte. Como somos
imortais, essa pena seria de aplicação impossível.
A coisa começa a complicar. Ou tememos
a nós mesmos e às nossas ações, ou o mundo vira uma balbúrdia para os imortais.
Se somos imortais, a natureza não nos daria filhos pois a perpetuidade do
gênero humano já estaria de antemão assegurada. Isso é uma coisa lógica, pois a
função, no caso a reprodutiva, decorre da necessidade. Cessada a necessidade, a
função, não mais necessária, segue a rota do desaparecimento, não é mesmo
Darwin? Teríamos uma vida sem sexo e sem
casamento. Se não há filhos, não há pais. Seríamos pais sem filhos e filhos sem
país. Aliás, esse tipo de relação não tem a menor lógica, eis que sempre
existimos, não decorremos da paternidade de ninguém. Sem sexo, sem filhos, sem
casamento, não haveria necessidade de haver macho e fêmea. Como a imortalidade
não tem condicionantes, também não precisaríamos comer ou beber, porque se
necessitássemos comer ou beber para viver, imortais não seríamos. Não comendo
nem bebendo, por menos que fosse, sempre pouparíamos algum e acumularíamos
riqueza incalculável e não seríamos pobres. No entanto, presente que sempre
haveria aqueles com maior capacidade, com maior disposição ao trabalho e de
grandes iniciativas, estes estariam imensamente mais ricos e, aí, por ser
sempre relativa, a pobreza continuaria a existir e, com ela, os pobres. Qual é
problema? O problema é que a imortalidade não eliminaria a pobreza.
Bem, não seríamos machos ou fêmeas, não
teríamos sexo, filhos, pais, irmãos, não comeríamos nem beberíamos, poderíamos
cair na pobreza relativa... E agora, que seríamos? Não sei. A única certeza é
que continuaríamos a existir para sempre. Mas “continuaríamos” não é um tempo
verbal adequado, que o eterno não é declinável, ele mora somente na terceira
pessoa do singular do tempo presente, ele “é”.
Ufa! A coisa começa a complicar. Não
vou conseguir parar e fechar o raciocínio. Ficou complicado, vou telefonar para
a minha comadre, a pitonisa grapiúna:
- Alô, comadre Mabel?
- Sim, é ela, compadre.
- Comadre, se não existisse a morte
e...
- A gente não morreria, compadre.
Tchau.
Título e Texto: Pedro Frederico Caldas
Colunas anteriores:
E a morte ,assim como o nascimento, são apenas as passagens de um estágio para outro ,mantendo e se adequando ao “hoje” .
ResponderExcluirAo morrermos devolvemos ao universo a matéria que tomamos emprestada, para que seja utilizada em outros de “nós”.
Tudo segue uma ordem , e só será possível modificar com o retorno a matéria básica ,que formou todo o universo , num tempo e num espaço inexistente , e da qual tudo se origina,estrelas planetas cometas ,águas ,ar ,etc..
E especialmente nós, que somos a menor parte deste todo, mas que utilizamos este para existir!
Mas existir “hoje”!
Paizote
Excelente o texto acima!
ResponderExcluirA eterna dúvida do ser humano ,se resume a mortalidade e ao seu destino final.
Nos interessa especialmente - e isto forjou todas as religiões - qual o caminho que seguiremos após a estada neste planeta.
Temos que analisar inicialmente ,quanto é o tempo, de nossa estada !
Pode ser eterna , ou enquanto o universo for expansivo!
Primeiro, teriamos que nos concientizar de nosso tempo!
Nosso tempo é hoje!
E somente hoje !
Vivemos tudo, mas só o que nos atinge é o hoje!
O que foi vivido na passado ,já não interessa, principalmente e pela simples razão de que ,quando vivenciamos , o tínhamos como o “hoje”.
O futuro igualmente !
Quando este futuro chegar estaremos vivendo o “hoje”.
O passado já terá ido, e o futuro ainda não terá chegado!.
Então não temos um tempo plural -nem o universo tem- , nosso tempo é agora e não existe nada mais !
Não morremos, nem nascemos!
Apenas nos formamos, e nos desintegramos conforme o tempo evolui , e a matéria reaproveitável, estiver disponível no universo
E está aí desde a formação inicial!
E isto vale, inclusive para as estrelas!
Pois nada mais somos do que uma ínfima parte deste universo múltiplo , em que acordo Lavoisier “nada se perde ,tudo se transforma!”
O universo ,dos qual somos parte, está em permanente expansão , desde o Big Bang!
Qualquer referência entre o tempo e o espaço , terá que levar em consideração o ponto de vista do observador.
Tal qual um viajante , numa astronave, na qual somente se observa o movimento externo , enquanto para nós -viajantes- tudo parece imóvel!
E Einstein , teoriza sobre isto nos estudos sobre a relatividade.
Mudamos ,enquanto universo expansivo , sem alterar o tempo individual e sem nos deslocarmos , permanecendo diferentes e sendo os mesmos, enquanto a matéria é reutilizada pelo universo.,para formação de outros seres.
Os líquidos de nossos corpos decompostos são absorvidos pela natureza e aproveitados na formação de novos elementos , seja na esfera animal ou vegetal ou mineral, num eterno retorno!
Podemos ,enquanto matéria líquida , chegarmos e “chovermos” no amanhã!
E que, quando isto acontecer, será o hoje destes elementos dos quais fomos compostos.
Não existe morte definitiva!
Nem separação entre elementos do universo!
Os bons e os maus são feitos do mesmo “barro”!
Existe transformação , e perda de identidade , integrando-nos, misturados ao universo ,eternamente !
Mesmo que o eternamente se resuma ao hoje!
Inclusive o sexo, é determinado na junção dos elementos ( cromossomos X e Y) , de forma aleatória , conforme a disponibilidade no universo!.
Na origem não somos nem machos nem fêmeas, pela simples razão de que ,ainda nada somos!
Estando em formação!
E os bons e os maus se diferenciam ,pela crença - bendita crença!- na possibilidade de mudar os destinos e tornar mais confortável a viagem.
Ou até que o universo pare de expandir-se ,e contraia-se voltando ás origens!
Os Deuses e os entes mágicos sobrenaturais , são criados pela nossa dificuldade em aceitar, que tudo é tão simples!
Os mesmos líquidos que circulam nos corpos dos maus ,circula nos nossos, pois acreditamos todos que somos bons!
E com a transformação , seriam unidos.
Sei que é uma teoria controversa!
Para evitar este questionamento, e não aceitando esta hipótese , o homem criou as divindades, e as encarregou de selecionar-nos acordo o que fizermos no nosso tempo. (hoje!)
Destinando uns ou outros, de acordo com conceitos filosóficos , impossíveis de comprovar , mas extremamente necessários que neles acreditemos e tenhamos conformidade.
Para nos diferenciamos , e nos tornar “escolhidos” ,pelo universo e pelo “tempo”!
Não temos um tempo antes, nem um tempo depois , somos enquanto integrantes de um universo mutante ,apenas o “hoje” em transformação.
PS.:Note-se que ao enviar o comentário , acabei invertendo a ordem e a segunda parte seguiu primeiro. Leiam a segunda parte que aparece acima e depois a primeira , para que faça sentido.
ExcluirGrato Desculpem !
OBA,OBA!!! VOU TER QUE CONCORDAR COM O PAIZOTE.
ResponderExcluirISSO É ATRIBULAÇÃO.
AH, O TEMPO;
Algo que o homem inventou para os ciclos universais.
Algo inexistente, que peço mas sei impossível.
Meu ciclo, teu ciclo vossos ciclos se encerrarão, em prováveis "tempos" diferentes.
Astrólogos buscam explicações em eventos temporais que talvez não existam mais.
O homem faz viagens interplanetárias baseadas em ciclos, cujas previsões passam a ser temporais.
Sem a transformação da matéria em energia, nunca atingiremos a velocidade da luz. O mistério é que para ver-se a luz é necessário a refração na matéria.
A AMEBA tem o MAIOR DNA do universo.
Uma combinação orgânica que depende a composição química da água.
H2O que compõe 70% de nosso corpo.
Nosso HOJE nada mais é que o FUTURO se esvaindo a cada milésimo de segundo.
GAIA NOSSO GRANDE DEUS sendo destruído pelos humanos.
O TEMPO É APENAS UM ALARME DE EMERGÊNCIA SEM PROCEDIMENTOS ALTERNATIVOS, APENAS PROTELATÓRIOS.
Para finalizar o tempo é nosso céu em vida e nosso inferno na morte.
Me sinto feliz ao ler o comentário perfeito.
fui.
Mas bah!
ResponderExcluirMeu ego disparou ...bateu tambor e subiu!
RSRSRS
Paizote