domingo, 7 de junho de 2020

[As danações de Carina] Sem relevos e saliências

Carina Bratt

Acredito que não exista coisa mais chata na nossa vida, que aturar, no convívio do dia a dia, com uma pessoa chata. Chata, queridas amigas, no sentido de uma criatura aperreadora, vazia de idéias, um estorvo enjoado, como bem poetaria Drummond, se encontrasse, em seu tempo, um desses empecilhos entediantes aqui na Terra.

Certamente seria como “uma pedra no meio do seu caminho”. Um bêbado, por exemplo, vocês com certeza concordarão comigo, um cachaceiro é um chato em potencial. Aliás, um duplo azucrinante em potencial. Ele consegue tirar do sério, a um só tempo, quem está ao lado, e, de roldão,  enfadar com requintes de crueldade a si mesmo, e acreditem, age dessa forma só para fazer raiva à sua própria inconveniência.


Imaginem amigas leitoras, três chatos num ambiente pequeno, esmagando idêntico pedaço de chão. Certamente esses maçantes fariam a coisa degringolar, ou dito de forma mais chata, quero dizer, mais insípida, ultrapassariam decididamente os limites do adensamento da saturação.

Se eles, por acasamente,  não se entendessem, ainda que um se mostrasse mais sacal que o outro, o terceiro seria considerado o obtuso perfeito, mais aprimorado que os outros dois. A chatice cresceu tanto, se solidificou e se incorpou em meio ao nosso cotidiano de forma tão pegajosa e grudenta, que descambou para proporções imensuráveis.

Ser chato, hoje em dia, se tornou coisa natural. Quem não é chato, não sobrevive e quem não tem um chato ao alcance das mãos, acaba morrendo da síndrome da deschatice anunciada. Esta síndrome mata mais que o covid-19. Mesmo pontapé no pau da barraca, não ficamos um minuto sem um  sujeito literalmente chato ou “cacete”,  ainda que a sua falta do ridículo brutesco e caricático seja, por nós, absolvido como uma enorme mala sem alça.

Não sei o que a mala sem alça tem a ver com o assunto... De qualquer forma, dizem que o chato carrega consigo o seu dia de ser inteiramente amolante, e dentro das suas maluquices, ser a  glória ao contrário, ou ao avesso  de alguém. Aí ele se torna verdadeiramente o chato de todas as horas, pelo menos enquanto o sol estiver presente brilhando no firmamento.

Millôr Fernandes, entende que chato é aquele indivíduo que tem mais interesse em nós, do que nós nele”. Diferente dos chatos existentes em pessoas que  trabalham com linhas e barbantes. Como assim, linhas, e barbantes? Calma, amigas leitoras, eu explico:  Uma linha reta, ou trilho que não faz curva,  é a distância mais chata entre dois pontos.

Raciocinem. Notadamente quando esses dois pontos estão longe um do outro e não  podemos (só para chatear), nos aproximarmos deles, sem não ficarmos ou pior, sem não sairmos chateados em face dos esforços empregados em tamanha empreitada.

Chato pode ser também, e, de fato é -, segundo o humorista Bert Leston Taylor - , “aquele filho da mãe que quando você indaga como ele está, ele conta”. Diante desta torre de babel, existe alguma fórmula perfeita,  solução, ou mágica eficazes para se livrar de um camarada extremamente inaturável?  A resposta é sim. O chato, o xaroposo de verdade, é aquele que nos castiga os ouvidos.

Grosso modo, o que nos “pega pra pato”, o que  adora sacanear, todavia, detesta ser chateado. Quer ver um chato em apuros, basta pegar a criatura “pra cristo”. Pegar (“pra cristo”, ou “pegar pra pato”, aproveitando o gancho, se resume em perturbar a paz e a tranquilidade do indivíduo, só para futricar os ouvidos dele, ou seja, tirar seu sossego e fazê-lo sair do estado normal, até que perca o foco, o bom senso e, logicamente, o fio da meada).

Existe uma outra alternativa bem mais cômoda. Ao ver um chato se aproximando e sabendo, de antemão, que ele só apareceu ali, ou aqui, num momento inoportuno, ou segundo desfavorável, somente com o intuito de chatear, ou mangar a nossa paz com alfinetadas, façam como eu fiz. E como foi mesmo que eu fiz?

Coloquem, em prática, ato continuo, e sem mais delongas, aquele célebre  pensamento de Oscar Wilde, autor de O retrato de Dorian Gray. Gritem berrem, se preciso for: “Infelizmente devo declimar da sua amável e querida pessoa, e, igualmente, do seu convite para batermos um papinho, em função de um compromisso assumido posteriormente”.

Dito isto, fujam. Não deixem o cara tomar fôlego, menos ainda pensar em responder. Caiam fora. É tiro e queda. Segundo Wilde, Dorian Gray não se constituia num chato comum, num indigestozinho qualquer, que as pessoas se livravam dele, tipo assim, a maneira Chico Anysio, num “vapt-vupt”.

Tanto é verdade, que o escritor Irlandês, para se ver fora e longe do alcance do ilustre abestalhado, precisou jurar, de pés juntos e ainda cruzar os dedinhos, que escreveria a história dele. Foi, portanto, em decorrência de tal inconveniente, que Wilde morreu de meningite. Enquanto a caravana segue passando ao largo, eu continuo por aqui com minha vidinha simples comungando, caras amigas e leitoras, do aprendizado de Noel Coward.

Noel Coward, entre outras coisas, se embrenhou por vários seguimentos enquanto vivo. Foi ator, compositor e roteirista. Depois que morreu, deixou de sê-lo. É dele a mimosidade preciosa aqui transcrita: “Eu gosto de longas caminhadas, especialmente quando elas são feitas por pessoas que não me perturbam”.

Está claro que ele se referia aos chatos. Em seu tempo, percebam, 121 anos passados, os  aderentes, os pastosos e aziagos já abundavam em profusão, de maneira a tirarem qualquer cristão por mais espírita que fosse, do  austero e inabalável compenetramento. Descobri que existem vários passos  para se concluir quando um cara  é chato. Relacionei apenas dez. 

1) Eles não pensam nos outros; 2) gostam de corrigir as  pessoas;  3) sabem de tudo; 4) só falam e não ouvem; 5) fazem piadas de tudo; 6) riem alto, tagarelam cuspindo e exageradamente acima do tom nornal da voz; 7) são inconvenientes em grupos de WhatsApp; 8) compartilham sem parar nas redes sociais; 9) criticam sem pensar nas consequências e 10) reclamam de tudo, a todo momento.

O chato não sabe o que é ter consenso. Numa discussão, só ele decide. Numa corrida entre chatos, notadamente os chatos de galocha (mesmo aqueles participantes que venham a se sagrar vencedores (não importando se da mesma panelinha, ou de outra, esses desgraçados continuarão sendo inqustionavelmente uns chatos. Embora ainda jovem, aprendi que o único chato inteligente e que se usasse chapeu tiraria o abrigo da cabeça para ele seria o Fernando Morais.

Fernando Morais?   Ele mesmo! Além do cidadão pesar “Cem quilos de ouro”,  livrar a fogosa e pacífica “Olga” dos Corações sujos”, dos homens sem vergonha, deu uma de  “Mago”.  Nada a ver com Paulo Coelho. Fernando Morais arranjou uma “Ilha”, ajustou um chato como  seu empregado particular e construiu, nesse pedaço de terra cercado de água por todos os lados, um CHATÔ.
Título e Texto: Carina Bratt, de Vila Velha, no Espírito Santo.  7-6-2020

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5 comentários:

  1. Em quase todos tópicos de CARINA, deita e rola o relacionamento.
    Depois de 37 anos de casado sou perito nisso.
    O TOC(transtorno obsessivo crônico)existe uns 100 mas todo mundo tem pelo menos um deles.
    Minha esposa tem aquele de deixar tudo retilíneo ou um ao lado do outro ou de colocar clips em folhas soltas.
    O meu é DESORGANIZAÇÃO ORGANIZADA DO MEU JEITO.
    A falta de tolerância obsessiva é o mais CHATO dos sintomas de TOC.
    Já fui magro, gordo e hoje dentro do peso ideal.
    Já tive 1,67m, 1,65m e hoje tenho 1,62 efeitos temporais.
    Não ligo para aparências exceto a mais chata de todas que é OS DENTES.
    Quem não cuida de seus dentes ou é pobre ou é porco.
    As aparências são uma questão de grana, por isso não as resumo.
    Dizem que tem mulheres com TOC sexual, well! se querem sexo diário, a qualquer hora precisam de 3 ou 4 homens por semana.
    O chato de PERRENGUE tem sempre uma opinião composta de descomposturas.
    Minha esposa é tão chata com organização que esquece onde guarda as coisas.
    Eu só fico chateado quando tenho que procurar com ela.
    Os atributos físicos nunca os detalho. A natureza tem contrapontos.
    Sempre fui contra a miscigenação, apesar de ser fruto delas.
    As raças transmitiram doença comuns para outras.
    Parece que hove outro caso agora de casal negros que tiveram filho branco.
    Está escrito nos DNAs passados.
    Como não ligo para essas CHATICES porque sou HEDONISTA.
    CADA UM SEJA FELIZ COM O QUE GOSTA.
    Apenas duas coisas me incomodam, viciados em drogas e VAGINISMO.
    Bom domingo aos comuns como eu...

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  2. EU SOU UM CHATO!

    Muita gente é ,mas não assume!
    Ou falta auto critica!
    Sou daqueles chatos que às vezes nem consegue ficar sozinho.
    Não aguenta a companhia!
    Por vezes, uso a chatice como escudo, preciso me proteger, dos chatos especializados!
    O que o chato menos atura é outro, contrapondo e rivalizando!
    A humanidade sempre esteve repleta de chatos, uns envelheceram e viraram gênios ,outros continuaram apenas chatos.
    Entre os chatos gênios, meu favorito é Fernando Pessoa!
    Imaginem conviver com este?
    Outro que gosto é Raul Seixas!
    Vide a música dele e do Paulo coelho,ouro de Tolo ,embora seu parceiro nem chato consegue ser.
    Tem de melhorar um pouco!
    Chato não dá bom dia!
    Ele tem coisas mais interessantes para dizer,na maioria são coisas que a gente podemos passar ignorando , são desimportantes e indiferentes ao giro do mundo.
    Se alguém souber como deixar de ser chato , gostaria de saber!
    Mas sei que só os chatos fariam isto.
    Falar sobre chatos, requer conhecimento e exercício do ofício.
    Então ficamos assim , vivam os chatos !
    ,Eu os tenho aversão , mas convivo com um incorporado, e que vive me dizendo o que fazer.
    Por exemplo agora!
    Lá dentro ouço-o ,...mas bah, que assunto chato!
    Encerro aqui...

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  3. Bom dia a todos. Especialmente ao meu leitor Roccha.
    Discordo do meu simpático e querido amigo Roccha, a quem antecipadamente agradeço pela leitura e claro, pela assiduidade aos meus humildes trabalhos. Fico lisonjeada com isso. E muito alegre, tendo em vista que toda pessoa que escreve gosta de ver seu trabalho comentado e na berlinda.

    Em seu comentário ao meu texto do dia 07 de junho p.p., ele afirma que em quase todos os meus tópicos “Deita e rola o relacionamento”. Nem sempre. Procuro escrever sobre tudo, inclusive assuntos que nada tem a ver com a minha formação. Sou uma simples curiosa no meio literário e nem tenho pretensões de ser famosa.

    No texto “Sem relevos e saliências”, faço referência aos chatos, aquelas pessoas que gostam de aparecer não pelo que são, mas unicamente pelas chatices que carregam dentro de si. Citei o bêbado, que sai do sério e tira a gente do eixo, e, numa visão geral, procurei bailar sobre as inconveniências das pessoas que fazem questão de se “aparecerem” presentes, sendo inconvenientes. Meu patrão Aparecido, por exemplo, é um chato. De galochas, o que o transforma no pior dos chatos existentes. Por exemplo. Ele tem mania de dar meia dúzia de pulinhos antes de sair de casa.

    Guarda a dentadura no forno de microondas e sempre esquece os óculos no congelador. Sem falar que gosta de entrar no meu carro pela abertura do porta malas. Uma amiga minha, a Deise, vai mais longe nas suas chatices. Exige que seu marido, o Walter, antes de entrar em casa, corra até a janela e cuspa três vezes para baixo.

    Essa imbecilidade da Deise já acarretou problemas sérios. Dias atrás, o Walter, numa dessas cuspidas, acertou a careca do seu Moisés, o síndico, que subiu até o apartamento deles furioso. A coisa só não tomou proporções maiores, porque as faxineiras que cuidavam da limpeza entraram no meio e dissolveram a confusão.

    O chato é pior que o sujeito que tem o TOC. Um vizinho meu, o Borba, tem o tal do TOC e além desse transtorno, é chato, tão chato que os elevadores, quando dão com ele, seja subindo ou descendo, de birra, de raiva, não param no seu andar, ou melhor (no nosso pavimento). O infeliz sempre que precisa ir à rua, faz uso das escadas.

    Acredite, amigo Roccha, é a octogésima vez que a escada do prédio enguiça. Sem falar nos corrimões, que ao vê-lo, se escondem nas caixas onde ficam acondicionados os extintores e as respectivas mangueiras de incêndio. Nessas horas, ponha fé, o vaginismo aflora.
    Com carinho, sempre,
    Carina.
    De Vila Velha, no Espírito Santo

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  4. Meu amigo Paizote em seu comentário ao meu “Sem relevos e saliências”, mesmo dia, se diz chato. Não acho. Chato, amigo Paizote, é o cara indubitavelmente piolho, no verdadeiro sentido da palavra.

    De outro modo, o chato é aquele sujeito que fica escondido dentro de si mesmo e não se mostra publicamente. Não que não se assuma, mas que, ao pensar em fazê-lo, acha que todo mundo o taxará de inconveniente.

    Chato é ainda o indivíduo que, ao ir ao banheiro fazer a barba, ao olhar para si mesmo, e no espelho, a figura que o contempla não ser a dele, mas a do vazio de ideias, aquele grosso hipócrita, falso e dissimulado, que está grudado dentro de sua alma, ele se enfurece. Chato é ainda o oculto que não se mostra, que não se deixa ver e tem por mania chatear a si mesmo.

    Acredite, amigo Paizote, o cidadão que é chato por natureza o faz com tanta precisão e destreza, que a própria chatice que carrega, acaba indo parar nos quintos. O chato-chato, não consegue ficar sozinho, porque o “Sozinho” se chateia com as chatices dele.

    O chato, ao contrário do que o prezado escreveu, gosta de dar bom dia. E quando a gente responde, ele indaga, ato contínuo: “E ai, tudo bem?” Se você responde, “Graças a Deus, tudo na santa paz” - , ele quer saber o motivo. O chato não conta, soma. Não divide, multiplica. O chato, por mais que ande, será sempre um chato. Com todo meu carinho e respeito, agradeço a sua leitura.
    Carina
    Ca
    De Vila Velha, no Espírito Santo.

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  5. EU sou chato , Carina...me deixa eu ser chato ...que coisa chata!
    Eu me conheço !
    O chato do meu tipo...tem dificuldade e pouca paciência com chatice,principalmente as próprias.
    Quando eu estou mais chato...bebo vinho!
    Só assim para aguentar a chatice , e chato não consegue ficar sozinho,a companhia fica insuportável!
    Só conseguimos ficar mais chatos quando ficamos velhos.
    Nada mais chato do que ...um velho chato.
    E se tiver opinião politica então...é o suprassumo da chatice!
    ABS

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