Mário Florentino
Talvez já não se lembrem, mas
em 2015, houve um golpe na nossa democracia. Um golpe contra as regras não
escritas que regiram o nosso regime democrático desde 1976. Quando o PSD ganhou
as eleições, sem maioria absoluta, o seu governo foi derrubado, e o PS decidiu
aliar-se às forças não democráticas de esquerda para conquistar o poder. Isto
representou um golpe, porque até então existia o chamado "arco da
governação", no qual que os partidos extremistas e radicais não entravam.
Todos os governos anteriores tinham sido sempre do PS ou do PSD (sozinhos,
coligados, ou em coligação com o CDS). Foi, portanto, em 2015 que, pela
primeira vez, partidos não democráticos entraram na esfera do poder. Nessa
altura, muitos analistas consideram esse movimento de António Costa como um
"golpe" perigoso, que o país pagaria caro. Hoje, passados seis anos,
estamos a sofrer na pele as consequências desse golpe.
Em 2019, quatro anos volvidos
sobre o golpe, era já evidente a ausência de estratégia, a falta de resultados
e a incompetência do PS para governar o país, aliado aos seus novos parceiros.
A pandemia de 2020, no entanto, colocou tudo em suspenso, e durante estes
últimos dois anos houve apenas um assunto que concentrou todas as energias do
governo e da sociedade: a pandemia e a gestão do medo do vírus Covid-19.
Terminada a pandemia, que
coincidiu temporalmente com as eleições autárquicas, todo o fracasso deste
governo contranatura, ficou por demais evidente. Como escreveu João Miguel
Tavares no seu artigo de sábado no Público, "o dique rebentou e a
enxurrada não para de abrir telejornais". São demissões nos hospitais,
professores por colocar, manuais por entregar, comboios e barcos parados,
greves em todos os cantos, preços da energia a disparar, etc., etc... Parece
que de repente a sociedade acordou para o caos em que vive. Esta insatisfação
generalizada teve já um primeiro reflexo nos resultados das eleições
autárquicas, em que o partido do poder, e os seus aliados extremistas, sofreram
pesadas derrotas (face às expectativas, no caso do PS, e derrotas evidentes em
votos e mandatos nos casos do PCP e BE).
Na última semana, três
acontecimentos mostraram que estamos mesmo perante uma mudança de ciclo
político, como alguns anteciparam. O primeiro é a forma como todos os partidos
têm gerido as negociações para o orçamento de 2022. Ao contrário da negociação
fácil que se antecipava, a situação é a de perigo de chumbo do orçamento, com
PCP e BE a "esticarem a corda".
Marcelo perdeu-se nas suas múltiplas e desesperadas declarações (às vezes mais que uma por dia), e com a ameaça de dissolução do Parlamento caso os partidos não se entendam e chumbem o orçamento. No entanto, ninguém parece querer eleições (eventualmente com a excepção de Costa, mas, mesmo ele, atrever-se-á a correr esse risco?).
O segundo acontecimento foi o
artigo de Cavaco Silva no Expresso da semana passada. O ex-PR agitou as águas
ao revelar, de uma forma certeira, o triste estado do país no empobrecimento,
na decadência das instituições, e na ausência de uma oposição eficaz.
O terceiro acontecimento,
relacionado com os anteriores, foi o anúncio da candidatura de Paulo Rangel à
liderança do PSD.
Na passada sexta-feira (e
depois de uns episódios rocambolescos no Conselho Nacional do dia anterior),
Rangel apresentou formalmente a sua candidatura à liderança do partido, com um
discurso brilhante. Tendo já aparentemente o apoio de grande parte do partido,
Rangel propõe uma agenda para o país, centrada na oportunidade de mobilidade
social, que esteve ausente nos últimos vinte anos.
Propõe unir todas as forças não-socialistas no designo necessário de libertar a sociedade civil da asfixia estatal para onde o PS o empurrou com o apoio dos dois partidos de extrema-esquerda radical, com resultados desastrosos. Propõe "abertura, alternativa e esperança", como afirmam várias figuras do partido num outro artigo publicado ontem. Numa palavra, o que Paulo Rangel nos propõe é libertar o país e a sociedade do golpe de 2015.
Fica MAL 👎
Segundo as notícias desta
semana, o ex-banqueiro em fuga João Rendeiro mudou de advogado, que agora é o
secretário-geral da Antram, que por sua vez é
presidida pelo pai do motorista (conhecido por "rei dos taxis"), que
por sua vez comprou o apartamento onde agora vive a mulher do ex-banqueiro, que
por sua vez mostrou à Justiça as obras de arte que tinha em sua casa, sendo que
15 delas eram falsificadas, mas que entretanto algumas dessas 15 já foram
encontrados os respectivos originais na garagem...
Se não é uma novela mexicana,
parece. Aguardam-se os próximos episódios.
Fica BEM 👍
Miguel Pinto Luz. Um dirigente
do PSD que já há uns anos se apresentou como candidato a líder do partido, escolheu
um bom timming para apresentação do seu último livro "Voltar a Acreditar
na Política". Nesse evento estiveram reunidos, e sentados lado a lado,
Carlos Moedas, que hoje toma posse como Presidente da Câmara de Lisboa, Paulo
Rangel, provável candidato a primeiro-ministro, e Pedro Passos Coelho, possível
e desejável candidato a Presidente da República.
Título e Texto: Mário
Florentino, Benfica, 11 de outubro de 2021
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