Mário A. Florentino
Já muito foi dito e escrito
sobre o resultado das eleições de 30 de janeiro, que deram a maioria absoluta
ao Partido Socialista e uma grande vitória a António Costa. O que poderemos
então esperar para esta legislatura de quatro anos?
Nem tudo é mau. Na vertente
econômica, é possível que as coisas melhorem um pouco. Estando o PS liberto da
pressão (o ministro Santos Silva chamou-lhe chantagem) dos partidos da extrema-esquerda
e da esquerda radical, poderá aplicar uma política econômica mais favorável às
empresas e ao crescimento. A escolha dos ministros nas áreas econômicas já
poderá dar uma indicação nesse sentido. Aguardemos pelos nomes.
Já nas empresas e outros
organismos públicos, as coisas tenderão a piorar. Se, mesmo sem maioria
absoluta no Parlamento, o PS tendia a colocar nos lugares-chave os seus amigos,
sendo acusado de atuar como “dono disto tudo”, então imagine-se o que poderá
fazer com maioria absoluta. Conseguirá Marcelo refrear o ímpeto de assalto ao
poder dos “boys” e “girls” socialistas?
Na Assembleia da República
deu-se uma viragem à direita, com o aumento do número de deputados do Chega e
da IL, de dois para vinte, em contraponto com a redução do BE e do PCP, de trinta
e um para onze. Assim, apesar da maior estabilidade governativa resultante da
maioria, o ruído do debate parlamentar será refletido na sociedade, pelo que
não se julgue que serão tempos demasiado calmos em termos de conflitualidade e
pequenas crises. Não serão.
Um partido com as
características do Chega, com doze deputados eleitos pelo povo, tenderá a criar
muitas polémicas mediáticas. Temas que até agora têm estado fora dos principais
debates, como a imigração, a ideologia do gênero, a cultura de cancelamento,
etc., passarão a estar no centro do debate. Como, de resto, já acontece em toda
a Europa.
Noutras áreas, como a educação, a saúde ou a segurança social, é previsível que a Iniciativa Liberal marque a agenda e o debate político (como até aconteceu já um pouco na campanha). Isso será muito positivo para os portugueses, porque estas áreas precisam de uma mentalidade menos estatista e mais liberal. Os portugueses devem poder fazer as suas escolhas livremente, como acontece no Norte da Europa. A este nível, poderemos tornar-nos mais europeus. O próprio PS, com a sua ala mais moderada (que felizmente ainda existe, apesar dos seis anos de geringonça), poderá aderir a algumas destas ideias mais liberais e favoráveis a uma escolha livre e responsável.
Finalmente, o papel do
Presidente da República. Marcelo, o grande jogador político, o homem que prevê
antecipadamente todos os cenários e contra-cenários, nem ele deve por um
momento ter imaginado que o PS teria maioria absoluta. Que nada o favorece.
Sentirá mais responsabilidades, e terá de abandonar o seu papel de “Presidente das
selfies”. Precisará de muita criatividade. Com ou sem vichyssoise.
Aguardam-se tempos
interessantes, a nível político e social. Aqui estaremos para acompanhar.
Fica BEM 👍
A eleição de oito deputados
pela Iniciativa Liberal. Se, com apenas um deputado, a IL conseguiu trazer
muitos temas importantes – sobretudo nas áreas econômicas – para o debate
público, e inclusivamente definir a agenda da campanha, então imagine-se o que
será capaz com oito deputados na casa da democracia. Ainda por cima, oito
quadros muito competentes e bem-preparados. Já ninguém parece ter dúvidas que a
IL veio para ficar. Com mais liberalismo econômico, ganham todos os
portugueses, sobretudo os mais desfavorecidos.
Fica MAL 👎
Rui Rio. A certa altura,
parecia que a campanha lhe estava a correr bem, e até que poderia ganhar.
Afinal saiu-lhe tudo ao contrário. Perdeu votos para a direita, e não
conquistou o centro, o seu objetivo obsessivo (contra tudo e contra todos). Não
é que a campanha tenha sido má, mas tudo o que fez antes, ao longo de quatro
anos de oposição, não foi apenas mau, foi péssimo. Deixa o PSD com contas
certas, mas de rastos.
Título e Texto: Mário A. Florentino, Benfica, 3 de fevereiro de 2022
Relacionados:Ontem, foram as eleições. Foram, eu disse. Mas o amor pela TERRA, esse, foi, é e sempre será!
Portugal: Eleições legislativas
Anteriores:
A última semana da campanha
As eleições de janeiro de 2022 – ponto de situação
Professor Rebelo comenta os debates
Resumo do ano de 2021: Vacinas. Testes. Cabrita.
Professor Rebelo comenta Presidente Marcelo
Até onde sei, esta foi a segunda vez que o PS vence com maioria absoluta. A primeira foi em 2009, com o senhor Sócrates. Dois anos depois, Portugal mendigava. Curioso como a maioria do povo português carece de amor-próprio; não lhe causa nenhum embaraço depender de dinheiro que vem do estrangeiro.
ResponderExcluirEssa ausência de orgulho patriota lembra um vírus, todos sabemos quem o criou e dissemina. Faz lembrar o livro “A 25ª Hora”, de Virgil Gheorghiu, narrando a história de Iohan Moritz, alude a um verme que a União Soviética inoculara nos cérebros dos romenos…
E este status ou way of life vai perdurar, tristemente.
Veremos como se comporta agora este novo PS, os momentos históricos são, apesar de tudo, diferentes desse tempo de Sócrates. Mas não estou tão pessimista como alguns. Afinal de contas, no total de número de votos a direita subiu e a esquerda desceu.
ExcluirSó uma correcção de pormenor: a primeira foi em 2005. Em 2009, ganhou de novo mas sem maioria absoluta - e isto apesar de (ou talvez graças a), à porta das eleições, aumentar os funcionários do Estado acima da inflação esperada
Excluir👍
ExcluirSobre o senhor Rui Rio: muito provável que muitos simpatizantes do PSD não tenham esquecido o comportamento desse senhor perante o seu correligionário, Pedro Passos Coelho, enquanto este foi primeiro-ministro.
ResponderExcluirEm meu entender, o decisivo para a maioria absoluta do PS foi o voto útil da extrema-esquerda. Mas sobre isso falarei no meu texto desta semana. Abraço.
ExcluirEstou convicto de algo semelhante ter acontecido com o PCP e alguns dos seus militantes e eleitores ocasionais. Muitos militantes não compreenderam que o partido tenha permitido a degradação dos serviços públicos e dado o silêncio nas ruas em troca de alguns favores políticos quase simbólicos. E o PCP perdeu muitas câmaras porque perdeu muitos eleitores ocasionais que costumavam votar CDU nas eleições locais apesar de serem eleitores habituais do PSD ou até CDS em eleições nacionais: até à geringonça, estes eleitores, mesmo se não partilhavam nenhuma da ideologia comunista, respeitavam a coerência do PCP em não ceder nos seus valores e o seu trabalho nas autarquias.
ExcluirCaro João Sousa. Obrigado pelo seu comentário. Sim, tem toda a razão. O PCP perdeu essa coerência histórica e isso ter-lhe-á custado muitos votos. O mesmo poderá ter acontecido com o BE (não que seja coerente como o PCP, mas também perdeu por ter apoiado o PS). Um fenómeno interessante de seguir será o novo Parlamento, em que PCP+BE têm 9 deputados, ao passo que os novos partidos Chega e IL têm mais do dobro.
ExcluirAgradeço a interação com os comentaristas.
ResponderExcluir