Carina Bratt
SEGURAMENTE sou, e, sempre serei, aquela que lhe estancará a exaltação colérica, o ímpeto da valentia insânia, a exacerbação indomável nascida no berço do seu ‘eu’ interior. Em igual passo, o reflexo apaziguador da sua vontade; a sombra amiga que se esgueirará nas águas lhe poupando das dores fortes que machucarão seu coração. Em algumas ocasiões, é possível, me entremearei ao sossego moderado, ou na sua tranquilidade serena e, obviamente, nos seus piores momentos tormentosos, serei o seu porto de estada segura. Posso ser também, e reafirmo, serei, o eco sem som. O sinal vermelho que parará você na turbulência do trânsito. A campainha estridente que tocará na sua porta quando algo não acordado ousar em se fazer presente.
Me transmudarei na onda forte
que explodirá na areia, ou no rio de águas turvas que desaguará no grande mar
da sua paixão. Viverei, a bem da verdade, para matar meu tempo e dar vida ao
seu. Alimentarei seus pesadelos de presságios edificantes e imorredouros. Na
verdade, buscarei, em tempo integral, o sempiterno que poderá (por qualquer
motivo), estar ou se fazer adormecido dentro do seu ‘escondidinho’. Reavivarei
o imarcescível fora das vistas das pessoas más e ociosas e lhe pouparei dos
dissabores e das desesperações. Minha mente não parará. Se expandirá junto com
a sua. Equilibrarei, sempre que necessário, a ‘linha-base’ da sua vida, para
que esteja sobejamente esticada de ponta a ponta em prol dos seus desejos mais
prementes.
Tudo farei, possível e impossível, para que você não perca o equilíbrio e caia, subjugado, no minuto seguinte, sem ter como regressar do abismo imensurável que, vez em quando, rondará ao seu derredor. Serei, mesmo norte, o farol no escuro do oceano, ou melhor dito, no seu mar de dúvidas e equívocos, embaraços e enojamentos. Restabelecerei, em contínuo, as agruras do seu ego, se, porventura, qualquer empecilho não programado tentar lhe escabujar o espírito. Sem que você se dê conta, me acenderei inteira, me iluminarei em luzes fortes que não se apagarão quando cansado da lida, fechar os olhos e adormecer. Lembra sempre que já fui a causadora do fim da carência intransigente e severa que açoitava seu corpo em tempos remotos.
Não se olvide, jamais, que me
fiz na espectadora microscópica que se sentou na plateia e assistiu ao seu show
de alma solitária. Agora, serei um pouco mais. Além da sua segurança, cuidarei
do seu porvir. Amanhã, posso ser a sua chegada, ou o seu adeus. Depois de
amanhã..., depois de amanhã, possivelmente, me esgueirarei por entre o seu
talvez, ou qualquer dia da semana (que ainda não se decidiu a coroar), e me
fartarei do seu triunfo insofismável. Por todas essas loucuras que você carrega
em seu peito, me esparramarei como alma nua em esquinas abandonadas ao deus
dará. Será nestas horas, acredite, será nestas ocasiões que me preocuparei
duplamente e me abrirei radiosa e augusta por pensar (só por pensar) que no
instante à frente, você poderá vir a sucumbir num vale de lágrimas e se ocultar
numa redoma de rosto e feições intransponíveis.
Por vezes, ainda que não me
sinta ao seu lado, me quedarei, veja que ironia, por vezes me quedarei estirada
no frio gélido do seu chão. Me acostarei ao relento, sem cobertura, contudo,
imbuída da visão beatificante de Deus. Tudo em face de ter me condensado em
quimeras visando enfeitar de alegrias e encantos o seu trilhar de flores de
brilhos celestiais. Consequentemente, para que seus olhos não vejam as
tristezas da próxima parada, eu me farei invisível aos seres humanos. Meu todo
se desfigurará. Meus instintos se afrouxarão, minha voz se fará exilada. Meus
movimentos se inverterão. Deixarei de ser ‘euzinha’, de carne e osso, para me
metamorfosear em seu novo começo de vida. Isso mesmo: seu novo começo de vida.
Imbuída desse dom divino, lhe
assevero agora, recebi, faz tempo, do Pai Maior. Ele me propiciou poderes
mágicos para, em vezes infinitas, lhe conceder benefícios adicionais. Neles,
adicionados no mesmo pacote, lhe protegerei das intempéries, dos altos e
baixos, das sombras negras e escuras, para que não derrame lágrimas pelos
cantos, ou no pior dos mundos, se descubra abraçado à uma existência medíocre e
amarga, ou se desnorteie sem esperanças, à mercê de uma angústia sufocante e
medonha. Esta angústia sufocante e medonha poderá ser a sua própria solidão. Eu
disse, poderá. Nesta hora, eu serei o seu escudo. A sua voz de comando.
Indubitavelmente, com toda pompa e poder, formosura e majestade vindos da mais
alta cúpula das Graças do Todo Poderoso, Ele me fará eleita, por unanimidade, a
sua guardiã. Em outras palavras, a sua ‘ANJA DA GUARDA’.
Título e Texto: Carina Bratt,
da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro. 2-7-2023
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