Estado de S. Paulo
O agravamento da crise
política provocado pela queda de mais um ministro de Michel Temer por suspeita
de conspirar contra a Operação Lava Jato coloca o País diante de uma questão
vital: afinal, o que queremos? Não se trata, obviamente, de saber se os brasileiros
estão convencidos de que a situação econômica é caótica e exige mudanças
radicais. Tampouco se questiona o que – exceto para quem tem o rabo preso – é
unanimidade nacional: o combate sem tréguas à praga da corrupção no trato da
coisa pública. Mas permanece a questão que não deveria existir e que,
existindo, é vital: afinal, quem tem a responsabilidade de governar o País
neste momento crítico?
Afastada provisoriamente a
presidente da República, está no exercício do cargo o vice-presidente Michel
Temer. Isto é o que determina a Constituição. Mas a solução constitucional não
pacifica o País, por duas razões principais. Primeiro, porque o grupo político
afastado do poder não reconhece a constitucionalidade do processo de
impeachment, que resolveu chamar de “golpe”, e simplesmente partiu para a
retaliação, questionando tudo, não apenas a legitimidade do atual Poder
Executivo, como também a do Judiciário e a do Legislativo. Em segundo lugar,
porque o apoio da esmagadora maioria dos brasileiros ao impeachment não se
transferiu automaticamente para o presidente em exercício, seja porque o
partido interinamente no poder, o PMDB, foi o principal aliado do PT nos
últimos 14 anos, seja porque o Ministério de Michel Temer tem negligenciado
bandeiras relevantes para a opinião pública, em especial a questão da
intocabilidade da Operação Lava Jato.
Embora não haja dúvida de que
a maioria dos brasileiros não deseja a volta de Dilma Rousseff à Presidência, a
opinião pública parece dividida quanto a dar o necessário apoio ao governo
provisório. Na verdade, essa divisão é mais aparente do que quantitativamente
significativa, uma vez que se manifesta nas ruas por meio da multiplicação bem
orquestrada de pequenos grupos militantes de organizações sociais e entidades
controladas pelo PT e pelos aliados que lhe sobraram. E também ecoa na mídia, a
partir dos argumentos oferecidos de bandeja pelo governo provisório, pela voz
de intelectuais, acadêmicos e artistas no mais das vezes historicamente
apoiadores do lulopetismo.
Assim, se Temer não serve,
quem vai governar o País? Dilma de volta? O próprio PT, Lula à frente, treme
diante dessa hipótese, porque não quer correr o risco de acabar afundando de
vez no repúdio dos brasileiros. Novas eleições presidenciais? Como? Isto sim seria
um golpe contra a Constituição, a não ser na hipótese absolutamente improvável
de que o Congresso aprove a tempo uma emenda constitucional, a partir de uma
mais improvável ainda renúncia de ambos ou cassação simultânea dos mandatos de
Dilma e Temer. E é bom ter sempre em mente que – a não ser que a tal emenda
constitucional resolva isso –, se a vacância da Presidência da República se der
a partir do próximo 1.º de janeiro, a eleição será indireta, por senadores e
deputados federais. Como se vê, toda essa discussão é, no mínimo, esdrúxula. No
entanto, ela serve às mil maravilhas para quem quer manter o Brasil em estado
de constante instabilidade. E não faltam pessoas de bem, mas desinformadas, a
alimentar essa situação que, no fundo, todos querem evitar.
Tem toda razão, portanto,
Eliane Cantanhêde em sua coluna de terça-feira no Estado: Ruim com ele, pior
sem ele. De fato, o governo chefiado por Michel Temer é a solução
constitucional para o impasse político criado pela incompetência e pelos crimes
de responsabilidade praticados por Dilma Rousseff. Mas está, inegavelmente,
longe de ser a solução sonhada pela maioria dos brasileiros para os graves
problemas que herdamos do lulopetismo.
Michel Temer, contudo, é o que
temos para reverter o pessimismo que um PT revanchista tenta incutir nos
brasileiros. É um grande desafio, mas a equipe econômica é reconhecidamente
competente e parece saber o que fazer para tirar o Brasil do fundo do poço em
que foi jogado pelo populismo irresponsável. Se o governo interino contar com o
apoio do Congresso, brevemente o País poderá ter as primeiras boas notícias no
longo e espinhoso caminho que tem pela frente. O que não resolve nada, só piora
a situação, é torcer contra.
Título e Texto: Editorial, Estado de S. Paulo, 2-6-2016
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