quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Ziraldo

Plínio Sgarbi

"Muitos pais não percebem, mas seus filhos se tornaram idiotas", disse Ziraldo na Bienal Internacional do Livro de São Paulo.
Aos 80 anos e em sua 16ª Bienal, o pai do Menino Maluquinho não cessa de enfatizar a importância de feiras literárias e do próprio livro para enfrentar o que ele considera em “emburrecimento” endêmico da sociedade.
A culpa delas serem idiotas é de seus pais, tão ou mais idiotas que seus filhos, uma vez que o hábito da leitura costuma brotar dentro da própria família, incentivado pelos pais.
Por serem censurados no Pasquim na época, Ziraldo e Jaguar foram indenizados pelo bolsa-ditadura em R$ 1 milhão e mais uma pensão mensal de R$ 4 mil.
Já foram pagos mais de R$ 3 bilhões de indenizações e pensões aos perseguidos pela ditadura, incluindo o Lula que ficou um ou dois dias na cadeia, e hoje ganha por mês mais de R$ 5 mil.
Outrora defensor das causas populares, Ziraldo poderia ter a dignidade de resistir à bolsa-ditadura, mas preferiu mamar nas tetas gordas alimentadas pelo dinheiro público.
O Millôr Fernandes tem razão: "Quer dizer que aquilo não era ideologia, era investimento?
O Bolsa Ditadura transformou-se numa catedral de voracidade, privilégios e malandragens.
Mas, consta que 27% dos brasileiros são analfabetos funcionais e que apenas 26% são alfabetizados plenos. Isso seria consequência de um sistema medíocre de educação, e, pode ser que os pais, na colocação de Ziraldo, também estão os leitores do Pasquim, que escrachava com o regime militar. O semanário carioca vendia tanto que encheram de dinheiro os bolsos dos seus donos, entre eles Ziraldo e Jaguar.
Como muito bem disse o jornalista Alexandre Garcia em recente artigo, o Pasquim surgiu em junho de 1969 – em pleno AI-5, portanto. Gozava, criticava, ironizava o regime militar. E sobreviveu a ele. Mas fechou em 1991, em pleno sistema democrático e civil. O que houve com o Pasquim parece ter acontecido com outros setores da intelectualidade brasileira.
Naquela época brilhavam o talento, a criatividade e a independência. E não foi só no Pasquim. Foi uma época áurea da música popular. A partir de 1966, Caetano, Gil e Gal tocavam e cantavam o Tropicalismo. A Bossa Nova cintilava com Tom, Vinicius, Sérgio Mendes, João Gilberto; os festivais nos palcos das TVs, com auditórios lotados, consagravam Ellis, Edu Lobo, Jair Rodrigues, Geraldo Vandré, com A Banda, Ponteio, Margarida, Sabiá, Fio Maravilha. Nunca mais tivemos aqueles talentos. Hoje são letras idiotizantes em músicas com um máximo de três notas. E tudo aquilo a despeito da censura. O teatro foi o que mais sofreu com a censura, mas se dirigia a um público de elite. Ainda assim teve peças como Liberdade, Liberdade – que nos fazia sair do teatro com um desejo de Bastilha.
Aí, não há como não perguntar: O que castrou a criação e o talento? Aparentemente a censura do governo militar não conseguiu isso. Antes os estimulou pelo desafio. Depois a criação e o talento estiolaram, como estiolou o Pasquim. Quando Geisel foi eleito pelo Congresso, por 400 votos contra 76 de Ulysses e declarou que viria a abertura democrática, de forma “lenta, gradual e segura”, parece ter plantado uma paradoxal seta em direção à mediocrização lenta, gradual e segura.
Incompreensível que a liberdade da democracia torne as mentes preguiçosas.
Texto: Plínio Sgarbi, 15-8-2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-