Gabriel Mithá Ribeiro
A palavra «colonialismo», por
tudo o que implica, condensa um dos processos mais perversos de lavagem cerebral ocorrido durante a era
soviética (1917-1991), estratégia de guerra
psicológica antiocidental cujos agentes no terreno acabaram por ser os
meios universitários. Estes existem por razões inversas, para defenderem a
sanidade mental dos povos através da socialização do rigor e da qualidade
conhecimento. Para assumir tais características, o conhecimento tem de ser
sustentado em conceitos (ou teorias) de validade universal e em evidências
empíricas (factos integralmente comprováveis). A palavra «colonialismo» representa uma engenharia mental que regou tudo
isso.
Ainda que não existissem outras razões, o que está em causa chega e sobra
para obrigar as ciências sociais e humanas a uma reforma profunda. Todavia,
acadêmicos e intelectuais resistem a tão elementar dever três décadas após o
fim do comunismo soviético. Às pessoas comuns resta, por isso, a dignidade de
recusarem utilizar um termo que as humilha, «colonialismo»,
uma vez que está ao seu alcance a decência e neutralidade do velho termo «colonização». Este trata da mesma
maneira, com justiça, ocidentais e não-ocidentais, ao mesmo tempo capta com
equilíbrio o bem e o mal associados a encontros
civilizacionais entre colonizados e colonizadores ao longo dos muitos séculos
de história nos mais variados continentes.
Um exercício simples ajuda a clarificar a questão, bastando que cada um de
nós construa uma tabela de dupla entrada. De um lado, pode colocar como título «Contributos da herança colonial de romanos
e árabes para a transformação civilizacional dos povos europeus» (século I
a.C. ao século XV). Do lado oposto, pode colocar como título «Contributos dos portugueses/europeus para a
transformação civilizacional dos povos africanos» (finais do século XIX a
finais do século XX, o período da ocupação colonial efetiva de África). Depois,
não é difícil preencher a tabela.
Do lado esquerdo, sobre os europeus enquanto colonizados (os territórios ancestrais de Portugal e Espanha são significativos), proponho alguns tópicos da herança civilizacional romana ou árabe: cultura escrita, ideia de estado territorial centralizado fundado na lei escrita, um modelo de civilização material até aí desconhecido (casas, cidades, estradas e demais edificações), monetarização e complexificação das economias (autoconsumo e troca direta substituídos por troca indireta, produto por moeda, e aparecimento de mercados), cálculo, novos hábitos de vida (como tomar banho e beber vinho), cristianismo (a crença no Deus único não foi indiferente ao desenvolvimento do pensamento conceptual abstrato), os mais variados progressos técnicos e científicos, a imposição da pax romana ou a tolerância religiosa islâmica da época.
O conjunto de heranças históricas referido é valorizado nas interpretações
que os portugueses e outros povos europeus da atualidade fazem do seu longo
passado, incluindo dos seus ancestrais, enquanto colonizados. Tais heranças são
transmitidas à generalidade dos cidadãos europeus ocidentais desde o ensino
elementar para estimular a sanidade existencial das identidades sociais às
quais hoje pertencem. Com isso, as memórias históricas ocidentais não se fixam
na componente negativa dos momentos em que os povos autóctones e os ocupantes
se combatiam, relacionavam e depois separaram-se, uma vez que existe a
consciência social de que a separação física não suprimiu a partilha
civilizacional anterior, pelo contrário, pode e deve reforçá-la. Entre os
europeus, o foco incide, por isso, no que ficou de positivo do legado dos
colonizadores romanos, árabes ou outros.
Em abstrato, não seria difícil proceder do modo idêntico no lado oposto da
tabela, o que corresponde aos europeus enquanto colonizadores (Portugal volta a
ser um caso significativo). Todavia, os termos contributos e civilizacional
no título, aquilo que os europeus legaram aos africanos nos séculos XIX e XX,
neste caso serão a priori condenados
pela academia e pela intelectualidade atuais, assim como a lógica
interpretativa consequente, ainda que essa mesma casta pensante legitime o que
ficou escrito antes, quando os europeus eram os colonizados; ainda que saibamos
que este segundo lado da tabela irá ser preenchido com tópicos na substância
semelhantes aos do primeiro lado em quase tudo; e ainda que africanos comuns
que viveram na época colonial, ou que dela tomaram conhecimento nas suas
relações quotidianas, forneçam dados empíricos bastantes para o preenchimento
semelhante dos dois lados da tabela.
Aquilo que os europeus herdaram como colonizados, e até hoje valorizam na
Europa, não é na substância distinto do que legaram como colonizadores
sobretudo nas Américas e em África. Será até do mais elementar bom senso
admitir que a maior revolução cultural de sempre da África Subsariana, ainda em
curso, foi espoletada pela difusão da cultura escrita pelos colonos europeus.
Nada deve à racionalidade analítica, que deveria ser própria dos meios
universitários e intelectuais, não colher e desvalorizar ou rejeitar evidências
empíricas resultantes de testemunhos vivenciais dos antigos colonizados
africanos que viveram na época, como ainda adulterar o sentido de conceitos ou
teorias. Acontece que à medida que portugueses e demais europeus, e respetivos
ancestrais, passam de colonizados a colonizadores, e quanto mais nos
aproximamos do século XX, mais se invertem os critérios de avaliação
pretensamente científicos sobre os fenómenos sociais e históricos que, por essa
razão, devem ser tratados com base em teorias e conceitos tanto quanto possível
estáveis e universais, aplicáveis a uma mesma categoria de fenômenos
independentemente das variações no tempo e no espaço.
Quando portugueses e demais europeus passam de colonizados a colonizadores,
o fenómeno perde a carga positiva de transformação civilizacional dos povos
colonizados para ganhar a carga tenebrosa de crime premeditado contra a
humanidade anacronicamente julgado. Para cumprir tal desígnio, o conceito
transita de colonização (os europeus
foram colonizados) para colonialismo (os europeus foram colonialistas), adjetivação apriorística
pejorativa imposta pela máquina de guerra psicológica soviética.
De agora em diante, caro Leitor, espero que compreenda que protege a
dignidade da sua pessoa e da sua inteligência, assim como da sua identidade
nacional sempre que recusar utilizar a palavra «colonialismo» e, em vez dela, preferir a palavra «colonização». A opressão mental sempre
se fez por via da manipulação e controlo do vocabulário, e é tempo de pôr cobro
a tal violência psicológica imposta aos povos ocidentais pelas suas próprias
elites académicas, intelectuais ou da comunicação social. André Ventura e o
CHEGA existem, entre outras razões, para travar esta guerra.
Título e Texto: Gabriel Mithá Ribeiro, Vice-Presidente do CHEGA!, 29-12-2020
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