A saída de Alberto Gonçalves
do grupo de colunistas do Diário de Notícias, que teve lugar nesta “refundação”
do jornal e tem passado praticamente despercebida, parece uma coisa vulgar, a
não merecer grandes comentários. No fim de contas, comentadores políticos e
jornalistas vão e vêm, e não será a primeira nem a última vez que o DN troca de
colaboradores. É? Não é. Ou melhor, poderá não ser. Vejamos porquê.
AG era dos poucos colunistas
regulares da imprensa portuguesa a criticar violentamente o governo. E era um
dos mais lidos, senão mesmo o mais lido, do jornal que prescindiu da sua
colaboração. Estes dois factos conjugados demonstram que houve, não uma
intenção comercial, mas um propósito político na demissão de Gonçalves. Esta
poderá ter tido uma de duas motivações possíveis: ou alguém no DN quis agradar
ao governo ou alguém ligado ao governo pediu ao DN este agrado. A primeira
hipótese é lamentável, mas não é excessivamente grave, porque apenas compromete
um grupo de comunicação social; a segunda será lamentável e gravíssima, porque
compromete o governo do país.
Evidentemente que, sem factos,
permanecemos nas teorias da conspiração. Todavia, existem alguns sinais
preocupantes que não podem ser desconsiderados. O primeiro é que não existe, na
comunicação social portuguesa, ninguém que diga o que dizia AG sobre o governo,
com a contundência e a assertividade com que o fazia. Evidentemente que –
dir-se-á – existem mais jornais e revistas em Portugal, e nada aparentemente
impedirá que AG escreva nalgum deles. Aliás, já o faz na Sábado, pelo que
poderá fazê-lo noutro lugar. Contudo, há uma lição deste caso, que ficará como
exemplo: uma coluna de opinião contrária ao governo e com anos de existência e
sucesso, foi encerrada por decisão editorial dos responsáveis do jornal. Fica
um aviso, e um aviso muito claro de que só a opinião mansa, a que não faz ondas
nem causa mossa, é tolerada. A outra é mal vista e, assim que possível,
silenciada.
Um aviso que não pode ser dissociado das crónicas dificuldades de António Costa em lidar com a comunicação social que lhe é crítica: com José Rodrigues dos Santos; com o e-mail remetido a João Vieira Pereira; com as entrevistas azedas, nas televisões, sempre que é posto em causa, com o voltar de costas a jornalistas que o interpelam sobre assuntos que não lhe agradam. Depois recordem-se os episódios, ainda recentes, do envolvimento de Sócrates com a comunicação social – desde as tentativas de compra e silenciamento da TVI e de Moura Guedes, aos negócios ruinosos de Joaquim Oliveira, feitos à custa da Caixa e do BCP, passando pelas ingerências nas redacções, a criação paga de blogs amigos, etc. – e fica composto um cenário que se espera não volte a repetir-se. Infelizmente, não é isso que augura esta demissão de Alberto Gonçalves e é por isso que ela é importante.
Título e Texto: Rui A., Blasfémias,
3-1-2017
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ResponderExcluir"Só para evitar confusões: saí do DN por vontade da direcção."