Enquanto a festança “sócrateana”, tive a visão de um José Gomes Ferreira
(SICN) como coisa ingénua, ou, mesmo totó. Afirmações do estilo: “antes de
discutir o que é mal gasto pelo Estado, discuto os que não pagam…” – palavras
que eram tónico capilar para a peluda gastança dos amanhãs inexistentes. Haverá
sempre quem não pague: delinquência fiscal é problema de “polícia”… mas a
gastança é problema político de quem manda na polícia e motivador de
delinquência fiscal.
Quem não paga, arrisca-se a ser apontado; quem gasta, restringe a nossa
liberdade de… o apontar.
Mas… dou a mão à palmatória: nos últimos meses, talvez liberto da canga
do Governo saído, caíu num banho de realidade. Só espero que os deuses o
protejam dos inimigos que pululam pela Impresa
E eis um texto do meu novo herói…
Alberto de Freitas, 10-06-2012
A Tragédia à vista e quase ninguém a quer ver… de
novo!
José Gomes Ferreira
Esta sexta-feira, Barack Obama disse, nos Estados
Unidos, que a Economia Americana não está bem e que é preciso tomar medidas
para acelerar o crescimento.
Como?, pergunto eu na minha surpresa de europeu de um país em austeridade! Ouvi bem? Como disse, senhor Obama?
Depois de tantos biliões de dólares injectados pelo Tesouro americano numa política de estímulos à economia com dinheiro criado pela FED? Afinal a economia americana não cresce o suficiente com essa receita?
Como?, pergunto eu na minha surpresa de europeu de um país em austeridade! Ouvi bem? Como disse, senhor Obama?
Depois de tantos biliões de dólares injectados pelo Tesouro americano numa política de estímulos à economia com dinheiro criado pela FED? Afinal a economia americana não cresce o suficiente com essa receita?
Esta quinta-feira, numa audição no Congresso, o
presidente da Reserva Federal reconheceu que, de facto, é preciso tomar medidas
para reduzir o défice americano e que este défice, de quase dez por cento ao
ano, pode comprometer o crescimento a médio e longo prazo nos EUA. Mas Ben
Bernanke recusou-se a dar sugestões sobre a forma de o reduzir – se por via do
corte de despesa, de aumento de impostos, ou de ambos - e acrescentou que o problema
não é premente. A médio prazo sim, os EUA deverão começar a pensar nisso…
Os dois senhores citados, e também Timoty Geithner, secretário de Estado do Tesouro, são os mesmos que nos últimos dois anos se têm multiplicado em declarações sobre a política alegadamente errada que a Europa do Euro e, em particular a senhora Merkel, têm seguido no Velho Continente. Os maiores responsáveis políticos e financeiros americanos vão mais longe: dizem mesmo que o maior risco para a economia americana vem da Zona Euro e da ameaça de desintegração provocada pelas políticas restritivas de Berlim e Bruxelas.
Não vale a pena teorizar muito sobre duas visões
completamente diferentes da mesma realidade, a realidade do declínio económico
da Europa e dos Estados Unidos no mundo globalizado, provocada pelos excessos
do sistema financeiro e a alavancagem geral das famílias, das empresas e do
Estado.
A senhora Merkel tem razão e o senhor Obama não
tem razão.
A senhora Merkel, com a sua teimosia, está a
conduzir a Europa a uma urgência de reforço da união monetária, financeira e,
por consequência, a uma União Política que pode conduzir ao Federalismo. Venha
ele. Com novos mecanismos de controlo orçamental, depois de aprovado o Tratado
Intergovernamental ou revisto o próprio Tratado de Maastricht, o Euro será
reforçado, os países gastadores vão corrigir os seus excessos e os Governos dos
países mais ricos, como a Alemanha, poderão assim justificar perante as suas
opiniões públicas, as ajudas que vão continuar a dar aos países periféricos. Ao
contrário do que se escreve, que a Alemanha não quer ajudar a Grécia, a verdade
é a contrária. A Alemanha, pela primeira vez em muitos séculos, quer ajudar a
Grécia. Noutras alturas de facto não ajudou e, até há poucas décadas, a Grécia
viveu sempre em incumprimento, na bancarrota ou lá próxima. O que a Alemanha
quer é garantias de que a ajuda vale a pena.
Do outro lado do Atlântico, os riscos são cada vez
maiores. A estratégia, não sendo explícita, é simples: a emissão contínua de
moeda pela Reserva federal é uma forma de baixar o valor da moeda e, por
consequência, baixar o valor da dívida externa. Entretanto, a economia vai
sendo alimentada por dinheiro injectado pelo Governo em gastos públicos
insustentáveis. O mecanismo funciona desde que haja procura externa para as
notas de dólar e para as bonds, títulos de dívida dos EUA. Perante uma Europa
do Euro que prece desagregar-se, os investidores procuram bonds, fazendo subir
o preço, baixando as yields, ou os juros, e alimentado cada vez mais o monstro
insaciável.
A história recente mostra que o pensamento único é
perigoso. Em 2007 eram poucos os que diziam que o mercado financeiro estava
contaminado por produtos estruturados com base num mercado imobiliário
insustentável. Os poucos tinham razão. Os muitos que criticavam as vozes de
alerta não tinham razão.
Em 2012, muitos dizem que a senhora Merkel está a
esmagar a Europa e que a austeridade é uma política fatal e que é preciso estímulos
orçamentais ao crescimento económico.
Eu arrisco dizer que a senhora Merkel tem razão; o
que os mercados financeiros querem é que os Estados, isto é, os contribuintes,
paguem a totalidade dos prejuízos do dinheiro que emprestaram. Arrisco dizer que
os analistas e os políticos que querem uma solução política imediata para o
Euro e os países em dificuldades, que pedem mais estímulos orçamentais estão,
sem o saberem, a fazer o jeito a esses investidores – querem que os Estados se
endividem ainda mais e que o BCE comece a imprimir dinheiro como a FED. Estão
errados.
A fronteira entre a confiança aparentemente
ilimitada dos investidores mundiais nas bonds e no dólar, e a desconfiança
súbita, é mais fina que as asas de uma abelha. Por este caminho não faltarão
muitos anos para o dólar começar ter menos procura e as yields das bonds
americanas começarem a subir, tornando a dívida externa insustentável.. A
declaração do senhor Obama sobre o verdadeiro estado da economia dos EUA
arrisca-se a ser um princípio.
Fica escrito assim, preto no branco, para memória
futura.
Não só o actual modelo económico americano,
baseado nos estímulos públicos e numa política monetária expansiva, é
insustentável, como é insustentável a exposição dos dez maiores bancos
americanos a derivados financeiros que enxameiam os seus balanços e os mercados
em geral. Para se ter uma ideia aproximada, o PIB americano é de 14 biliões
(trillion) de dólares; o PIB de todo o mundo é de 70 biliões. A exposição dos
bancos americanos a estes produtos derivados é de 350 biliões, num mercado
mundial de derivados de 700 biliões. Isto é, só os dez maiores bancos
americanos têm metade do problema em mãos.
Por estas razões, a senhora Merkel quer regular os
mercados financeiros, quer aplicar uma taxa sobre as transacções financeiras,
quer pôr os estados e os povos europeus a gastar menos e a produzir mais. Quer
ajudar, mas quer garantir antes, que a ajuda é bem utilizada.
Tem todo o meu apoio.
Declaro toda a minha simpatia e solidariedade com
a sociedade americana, o seu dinamismo, a sua cultura, os valores de
criatividade e de liberdade que defende. Os seus políticos estão errados.
Profundamente errados.
José Gomes Ferreira, Subdiretor de Informação SIC,
09-06-2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-