Tavares Moreira
1. Um
dos mais curiosos episódios relatados na imprensa internacional, sobre o
momento especial que se vive na política grega, foi naturalmente omitido ou
passou despercebido à grande maioria dos “media” lusos, tomados por um
encantamento infantil em torno do PFEC em curso na Grécia (o equivalente ao
nosso velho PREC, agora em versão financeira).
2. Esse
episódio tem a ver com a queda acentuada das receitas fiscais do Tesouro grego,
nas semanas que antecederam as eleições, em resultado de muitos milhares de
gregos terem começado a alimentar a expectativa de que, com a vitória do
Syriza, pudesse ser decretada uma amnistia fiscal ou algo de muito parecido…
3. Tal episódio
é bem revelador de como a mensagem económica e financeira do partido vencedor,
cheia de exigências em relação ao resto do Mundo – uma espécie de ajuste de contas
financeiro com o resto do Mundo, muito em especial com os seus credores
internacionais – foi capaz de passar para o eleitorado ao ponto de acreditarem
num grande alívio/perdão fiscal pós eleitoral…
4. Em suma, o Syriza conseguiu convencer uma
boa parte do eleitorado grego de que seria capaz de:
- Repor os vencimentos dos
funcionários públicos e as pensões de reforma para níveis iguais ou muito
próximos dos que se verificavam antes da intervenção da malfadada Troika;
- Impor aos credores
internacionais uma reestruturação da dívida em termos altamente penalizantes
para eles (termos ultra-concessionais), obviamente facilitando o serviço
da dívida ao devedor República Helénica de modo a permitir a restauração dos
benefícios supra indicados;
- Sem prejuízo do que
antecede, continuar a merecer a confiança e a disponibilidade dos credores
internacionais para continuarem a financiar a República Helénica nos termos por
esta escolhidos e, desnecessário será acrescentar, altamente concessionais
também.
5. Qualquer
cidadão minimamente esclarecido compreende que este programa envolve um nível
de utopia considerável – equivale a comer um bolo várias vezes e mantê-lo como
se não tivesse sido comido – mas a verdade é que uma boa parte dos gregos
acreditaram nele e votaram naqueles que o prometeram.
6. Subjacente
a todo este estranho enredo e esta ilusão financeira está uma noção central do
ideário dos dois partidos que formam a nova coligação governamental na
Grécia: ambos estão profundamente empenhados (“passionate”, diz o F. Times na
sua edição de hoje) na restauração da soberania nacional sobre a política
económica.
7. Mas
isso só será possível ou viável com um novo regime económico, muito
especialmente com a restauração da autonomia monetária perdida aquando da
adesão ao Euro, como é evidente…mais concretamente, isso implicará o
abandono do Euro, seguindo um modelo financeiro do tipo argentino ou
venezuelano…coisa que os gregos têm esmagadoramente rejeitado nos inquéritos de
opinião!
8. Confesso as minhas sérias
dúvidas quanto à possibilidade de tudo isto não acabar numa enorme frustração
para os gregos; esta ilusão financeira/monetária em que confiaram ainda lhes
pode sair mais cara que o Programa de Ajustamento…muito sinceramente não o
desejo, mas com igual sinceridade antevejo um enorme risco de tal acontecer.
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