Situações de estresse aumentam chances de "efeito porta"
Alana Gandra
Quem nunca passou pela situação de ao entrar em outro ambiente esquecer o que ia fazer ali? Esse lapso de memória é chamado de “efeito porta”, termo criado pelo professor de psicologia e ciências cognitivas da Universidade de Sheffield, na Grã-Bretanha, Tom Stafford. Ele considera que a memória falha, literalmente, ao se cruzar uma porta.
De acordo com a psiquiatra
Danielle H. Admoni, a memória recente está ligada à atenção. “Se a gente está
focado em muitas coisas, a nossa atenção diminui e, consequentemente, a nossa
memória recente também”, explica a professora da Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp).
Segundo Danielle, o simples
fato de a pessoa sair de um ambiente e pensar em outros assuntos vai fazendo
com que ela tenha vários focos de atenção. Com isso, acaba esquecendo o foco de
atenção primária. Para ter esses lapsos de memória, não é necessário que a
pessoa esteja em um estado cognitivo vulnerável, com a mente muito
sobrecarregada, mas que haja uma interposição de focos de atenção.
Situações de estresse ou
quando a pessoa está com muitos problemas na cabeça para resolver, entretanto,
aumentam as chances do “efeito porta”. “A gente está com a cabeça em mil outras
coisas, tirando a nossa energia, e aquilo diminui a atenção para o que a gente
está fazendo, com mil problemas, e não consegue focar no que está fazendo ali,
naquele momento”.
Estudos feitos na Universidade de Notre Dame, nos Estados Unidos, e na Bond University, na Austrália, comprovaram que quando passamos por uma porta, podemos ter lapsos de memória em relação a objetos, a coisas materiais. Um exemplo típico é aquele em que a pessoa está na cozinha lavando louça e pensa em ir ao quarto pegar um fone para ouvir música. Ao chegar no quarto, contudo, ela esquece por completo o que ia pegar naquele ambiente. Desiste e volta para a cozinha, onde continua a lavar a louça, sem ouvir a música que desejava.
“O simples ato de entrar ou
sair por uma porta representa uma espécie de limite de evento na mente. Quando
você muda de ambiente, muda também o foco de atenção, compartimenta a memória e
a lembrança se torna mais difícil”, explica o psiquiatra pela Unifesp, Adiel
Rios, pesquisador no Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (USP).
Mantendo o foco
Segundo a psiquiatra e
professora da Unifesp, há maneiras indiretas de se manter a atenção naquilo que
era primário.
“Um bom jeito é anotar, seja
em uma agenda virtual ou de papel, colocar um alarme, por lembretes de cores
diferentes para os compromissos. Porque, ao bater o olho, a gente lembra que
tem que pagar a conta xis, levar o filho a tal hora na escola. A nossa cabeça
já não dá mais conta de guardar tanta informação. Então, a gente tem que ter um
recurso externo para isso, para justamente lembrar. Na hora que você olha
aquilo, você lembra de alguma coisa que esqueceu, porque teve outros focos de
atenção”.
De maneira geral, para manter
a saúde mental em dia, é preciso procurar diminuir o estresse e ter tempo para
coisas prazerosas. “Quando a gente está só pensando em trabalho, problemas que
não consegue resolver, isso vai tirando a nossa energia. A gente tem que ter
focos de distração também, como hobbies”, enfatizou Danielle.
A melhora da atenção e da
memória também está fortemente ligada à atividade física e a uma boa noite de
sono. “Ter um estilo de vida saudável, tentar não se sobrecarregar e recorrer a
recursos externos. Tudo isso acaba ajudando a gente a não esquecer as coisas no
dia a dia”.
Ainda segundo Danielle, a forma de ver o mundo e de responder aos conflitos tem grande influência na saúde mental. Quanto mais foco a pessoa dá a um determinado problema, mais o corpo responde com sintomas de estresse. Portanto, uma maneira de amenizar os problemas é desenvolver formas saudáveis de lidar com as próprias emoções. “Nesse sentido, a psicoterapia surge como uma aliada para o autoconhecimento, o autocontrole e a inteligência emocional”, destacou.
Técnicas
Para trabalhar tanto a atenção
como a memória recente, especialistas indicam várias técnicas para evitar os
lapsos de memória. Fazer uma lista do que deseja lembrar ou ainda agrupar
informações importantes em uma sequência temporal, com começo, meio e fim. É
importante evitar que outro pensamento ocupe sua mente enquanto você estiver
realizando uma tarefa. Jogos como xadrez, quebra-cabeça e atividades como
palavras-cruzadas proporcionam uma melhora perceptível à memória.
Outra técnica interessante é
assistir a um episódio de uma série ou um filme e anotar em seguida o maior
número de detalhes que lembrar ou ouvir uma história e contar a alguém da forma
mais fiel possível.
Ler também é uma atividade
importante, já que a leitura proporciona exercitar a imaginação, o raciocínio e
a memorização. Também é possível resumir em texto o que foi lido ou estudado.
“A meditação também desempenha
um papel importante no equilíbrio pessoal e contribui para o relaxamento e o
descanso em um nível mais profundo, podendo ser praticada em casa, inclusive
numa pausa do trabalho”, afirmou Adiel Rios.
Doença mental
Para a professora da Unifesp,
os lapsos de memória, ou “efeito porta”, não significam que a pessoa tenha uma
doença mental. “Mas é algo para ficar de olho, porque é incômodo quando você
não consegue lembrar as coisas. Isso traz ansiedade e angústia”, completa.
No dia a dia, as pessoas
costumam ficar expostas a uma grande quantidade de estímulos, o que leva a
realizar várias tarefas simultaneamente. Entretanto, segundo Danielle, o
cérebro não está acostumado a receber tantos estímulos e a processar inúmeras
informações de uma vez só.
“O resultado é o esgotamento
mental, podendo saturar o córtex cerebral, gerando uma mente hiper pensante,
agitada, impaciente, com bloqueio criativo, baixo nível de tolerância e, claro,
prejuízos na memória”.
Quando se tem uma situação de
sobrecarga recorrente, é preciso pensar em novas estratégias e procurar um
profissional de saúde mental. Terapeutas e psicólogos podem ajudar em casos
mais brandos. Em casos mais graves, como o de pessoas com idade avançada, isso
pode ser um sinal inicial de demência, e é necessário o auxílio de um
psiquiatra.
Título e Texto: Alana Gandra; Edição: Lílian Beraldo – Agência Brasil, 18-6-2022, 10h55
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