sexta-feira, 3 de junho de 2022

Uma vitória contra os hipócritas

Nesta semana, a história de Amber Heard contra Johnny Depp desmoronou e expôs, mais uma vez, a perigosa espinha dorsal do movimento Me Too

Ana Paula Henkel

Vários anos atrás, a atriz norte-americana Amber Heard escreveu sobre uma experiência angustiante em que, sem citar nomes, relatava ter sido abusada pelo ex-marido e ator Johnny Depp. Ela alegou graves abusos físicos e emocionais durante todo o casamento, incluindo alegações de que ele havia chutado e espancado seu rosto. Quando eles se divorciaram, após menos de dois anos de casamento, ela se tornou uma voz importante no movimento feminista Me Too, quando as mulheres das indústrias do entretenimento, música e mídia resolveram denunciar tratamentos abusivos, quase sempre de natureza sexual, que sofreram de homens poderosos. Amber protocolou um pedido de medida protetiva contra ele, e, em decorrência disso, Depp foi prontamente excluído de todas as produções das quais participava, assim como teve todos os contratos cancelados de produções pré-agendadas para o futuro. Seu milionário contrato em Piratas do Caribe foi cancelado, e o ator foi excluído da sociedade, da mídia e de eventos da indústria do entretenimento. A imprensa não poupou esforços para seguir alimentando a demonização de Depp acerca da suposta violência doméstica que havia cometido.

Foto: Michael Reynolds/EPA-EFE/Shutterstock

Nesta semana, a história de Amber contra Depp desmoronou e expôs, mais uma vez, a perigosa espinha dorsal do movimento. Ainda em 2018, Johnny Depp processou Heard, dizendo que ela o difamou ao acusá-lo de abuso doméstico e, com as falsas alegações, fez com que ele perdesse contratos importantes e, principalmente, seu nome. No julgamento, iniciado há seis semanas, ele precisou provar não apenas que nunca agrediu Heard, mas que o artigo que a atriz escreveu para o Washington Post o difamava. Também teve de comprovar que Heard escreveu o artigo com malícia real, e, para reivindicar danos, Depp afirmou que o texto causou severos prejuízos à sua reputação.

A batalha judicial acalorada e televisionada entre Johnny Depp e Amber Heard finalmente acabou na última quarta-feira, e um júri de sete membros no veredito afirmou que Heard o difamou e que prevaleceu a vitória do ator nas três reivindicações do processo. A atriz terá de pagar ao ex-marido a quantia de US$ 10 milhões em danos compensatórios, além de danos punitivos de US$ 5 milhões. O caso, no entanto, vai além do que mais um mero show hollywoodiano comentado enfaticamente pelos fãs de ambos. O episódio mostra as vísceras do vil movimento atual feminista, que não está interessado em pautas pertinentes e justas para as mulheres, mas no ganho político e financeiro à custa das reais vítimas de abusos e da demonização de todos os homens.

Como pessoas de diferentes esferas, experiências diversas e pontos de vista variados convivem pacificamente dentro de uma sociedade civil? Qual é o principal ingrediente necessário para a democracia prosperar? É claro que nada se resume a um ponto apenas, mas acredito que podemos resumir em uma palavra: confiança. Uma sociedade civil saudável é construída sobre relacionamentos, amizades e associações que promovem a confiança no próximo. A liberdade e uma comunidade forte florescem em uma cultura de confiança, e, infelizmente, estamos perdendo isso há algum tempo. Vemos esse cenário não apenas na paisagem norte-americana em vários graus, mas no mundo de forma geral.

O politicamente correto, instaurado no Ocidente pelos globalistas fãs de Marx, prega que os pobres não devem confiar nos ricos, os negros nos brancos, os filhos nos pais. Na vida real, atualmente os eleitores não confiam nos políticos e os cidadãos não confiam na mídia. Sentimos tanta desconfiança que ficamos insensíveis a ela. Por muitas vezes, alimentamos esse sentimento sem pensar. Afinal, não achamos que a desconfiança gerada “lá fora” na política e nas mídias sociais pode afetar nossa vida diária. Mas afeta e está se expandindo. Como uma doença, essa desconfiança está infectando nosso relacionamento mais fundamental, o alicerce de uma sociedade civil livre — o relacionamento entre homens e mulheres.

Guerra dos sexos

A quebra de confiança entre os sexos é o legado trágico do vazio movimento feminista moderno — ou pelo menos a tentativa avassaladora de silenciar dissidentes que não rezam a cartilha hipócrita das feministas. A campanha do movimento Me Too assumiu um novo fervor que se alimenta da crescente acusação de que a masculinidade é vil, tóxica e inerentemente predatória. O medo dos homens é legitimado, pois qualquer acusação é tratada como fato, e os homens são vistos como “o inimigo”, um desvio incorporado que deve ser remodelado na imagem de uma mulher. Sua sexualidade é assumida como naturalmente brutal, uma ameaça a ser controlada e reduzida para que o homem individual seja considerado “seguro”.

Embora a disposição das mulheres de responsabilizar os homens por qualquer comportamento sexual criminoso deva ser aplaudida, a abordagem de terra arrasada que estamos vendo é destrutiva, porque mina a confiança saudável e o mais grave: a própria segurança de todas nós. Quando qualquer coisa, desde um toque ingênuo durante uma sessão de fotos até uma tentativa inocente de beijo, é comparada a estupro e abuso sexual, não estamos curando a sociedade, mas infectando relacionamentos com o veneno da desconfiança. Seja no local de trabalho, em um restaurante, uma igreja ou em casa, a interação entre um homem e uma mulher é única e primordial para todos os outros relacionamentos. Quando uma quebra de confiança acontece, quando o medo do outro sexo se generaliza, a sociedade simplesmente não consegue prosperar.

Em tempos de totalitarismo social e político, o sexo era severamente regulamentado e relacionamentos amorosos entre homens e mulheres proibidos

Tudo o que envolve a dinâmica sexual saudável é essencial para o relacionamento entre homens e mulheres. Para que a confiança floresça, essa realidade não pode ser negada e deve ser tratada com respeito, cuidado e honestidade, e não simplesmente apagados da vida moderna. Não pode haver abuso nessa relação, e uma parte da polaridade — seja masculina seja feminina — não pode ser rotulada como tóxica, brutal ou maligna, inclusive como foi feito no passado por certas religiões totalitárias em relação à sexualidade feminina. Uma vez que esse rótulo é colado, a desconfiança é gerada em detrimento de todos. Se as mulheres acreditam que todos os homens são perigosos, não pode haver confiança entre os sexos. Os homens não vão se tornar eunucos, mudar e se tornar como as mulheres, abandonando sua masculinidade natural. Essa é a identidade e a natureza dos homens, e ela não pode ser expurgada sem destruir quem eles são como indivíduos livres, como homens e protetores.

A destruição da liberdade

O movimento feminista Me Too concedeu uma exceção perigosíssima ao princípio justo de qualquer devido processo legal de inocência até que provem o contrário. O problema, não apreciado pela gritaria das atuais feministas, é que, se todos os homens são vis, tóxicos e abusadores, ninguém é. Se toda masculinidade é apenas o compartimento de um estuprador em potencial, os reais abusadores conseguem se dissipar na multidão e seus crimes passam a não ter o peso que merecem. Quando nossos relacionamentos mais íntimos e fundamentais são governados pelo medo e pela desconfiança, a liberdade que constrói relações sólidas e saudáveis entra em colapso. Quando você não confia mais em outras pessoas e elas precisam ser monitoradas, controladas e incansavelmente investigadas ou observadas, como o atual feminismo prega com todos os homens, a própria liberdade é destruída. É por isso que o totalitarismo prospera na desconfiança.

A dicotomia “confiança versus medo” sempre prosperou em regimes totalitários. Como tem sido amplamente documentado em milhares de livros, a estratégia geral é induzir a desconfiança entre cidadãos comuns, vizinhos e até mesmo entre familiares. Além disso, os regimes totalitários instituem a perseguição e a punição arbitrária dos cidadãos, deixando-os em permanente estado de incerteza. Sob tais regimes, ninguém sabe se, quando e por que eles serão chamados a se apresentar no que pode ser tranquilamente chamado de “tribunal da injustiça”. Como isso se aplica a homens e mulheres em um ambiente de suspeita, eles nunca sabem quando serão apresentados nos tribunais da injustiça como “abusadores sexuais”. Os homens serão cautelosos com cada palavra, cada ação e viverão com medo da acusação de uma mulher. A comunicação limpa será interrompida ou restringida. Ninguém será real um com o outro. O flerte inofensivo já é sufocado e as sementes da intimidade esmagadas. O amor é erradicado e o medo toma seu lugar.

Bullying e egoísmo

A mulher ganhou espaços espetaculares na sociedade ocidental. Apesar de os atuais movimentos feministas fingirem cegueira, somos ouvidas no mundo livre. O que está faltando, no entanto, é a grande responsabilidade que vem com esse poder recém-descoberto. Seria excelente para encorajar e inspirar meninas a buscarem a excelência e a realização, mas as mensagens feministas modernas falham em combinar essa mensagem com apoio e compaixão pelos outros. É mesquinho e ressentido. Com demasiada frequência, o tal empoderamento feminino e a liberação tornam-se sinônimos de bullying e egoísmo.

Nós, como sociedade, precisamos parar e dar uma olhada séria em nós mesmos. É preciso restaurar a confiança por meio da responsabilidade — criminalidade e abuso de qualquer forma, seja mentira, roubo, assassinato ou estupro, são ataques à sociedade civil, e indivíduos devem pagar por isso. Estamos indo além de meramente responsabilizar indivíduos por comportamento criminoso ou abusivo para policiar a masculinidade. O que estamos perdendo não é a liberdade sexual, mas a liberdade relacional e a confiança que a sustenta.

Em tempos estranhos de totalitarismo social e político — por isso temos citado tanto George Orwell, em 1984 —, o sexo era severamente regulamentado e relacionamentos amorosos entre homens e mulheres proibidos — um código que o protagonista Winston Smith violou quando se apaixonou por Julia. Para “reprogramar” Winston em conformidade com o Estado, um dos membros do partido interno do Big Brother quebra a confiança entre eles através da tortura: “Nunca mais você será capaz de amor, amizade, alegria de viver, riso, curiosidade, coragem ou integridade”, diz o torturador O’Brien. “Você será oco. Vamos espremê-lo e depois enchê-lo com nós mesmos.” Sim, é assustador.

Isso é o que estamos fazendo ao criar desconfiança a ponto de homens e mulheres não poderem viver autenticamente uns com os outros. Estamos nos esvaziando de nossa humanidade, tirando nossa confiança um no outro e roubando o afeto mútuo. Tenho medo de que um dia vamos acordar e sentir o vazio interior, descobrir que estamos sozinhos e sacudir a gaiola que construímos ao nosso redor porque escolhemos o medo e o silêncio.

A tensão sexual entre homens e mulheres sempre existirá, e se as mulheres assumem que a sexualidade de um homem é uma ameaça em vez de um poderoso complemento à sua própria sexualidade, elas sempre estarão em guarda. Nesse ambiente de suspeita, não pode haver privacidade entre um homem e uma mulher. Se houver qualquer interação, mesmo que não seja sexual, o homem vai desconfiar que a mulher se voltará contra ele — então a comunicação é silenciada. O medo é gerado em ambos os lados, e o medo é a morte da confiança e também a morte do amor.

Título e Texto: Ana Paula Henkel, Revista Oeste, nº 115, 3-6-2022

Um comentário:

  1. JÁ PASSARAM 3 ANOS, que escrevi que um dia, um homem iria a um prostíbulo, sair com uma rapariga, e ser acusado de assédio sexual, mesmo pagando por seus serviços.
    Um verdadeiro homem não bate em cachorro ferido, aguenta seus latidos ou vai embora.

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