Era uma vez uma reforma do
Estado. Esta podia ser uma bela história, mas não é. É a história de um Governo
de pessoas diferentes, que não se escolheram como parceiros e que a História –
para o bem e para o mal – resolveu juntar para cumprir uma missão: tirar
Portugal do colete de forças da troika. Chamemos-lhe o regresso à normalidade.
Quase dois anos depois do projecto
ter começado, PSD e CDS embrulham-se na conjuntura: queixam-se uns dos outros,
refugiam-se nas suas convicções, hesitam nos caminhos. Apetece-me citar uma
frase que Luís Amado dizia com frequência: «Que isto é lixado sei eu, mas como
é que se resolve?». Agora digo eu: resolve-se com pulso e com um consenso – o
interno. E não, não é tarde demais.
Primeiro, Pedro Passos Coelho.
Sempre que o ouço, hesito na reacção. É tão frio que não parece um líder; é tão
racional que me apetece acreditar nele. Uma imagem: o apoio que dá a Gaspar
seria quase heróico, não fosse o trabalho de um primeiro-ministro muito mais do
que isso.
Em síntese, diria que dois
anos é tempo suficiente para eu ter mais certeza sobre algumas coisas. Que a
política não é o que nós queremos, é a arte do possível; que não se pode
reformar contra todos ao mesmo tempo; que a liderança de uma coligação exige
negociação interna permanente e colectiva – não individual. Já agora, que
cumpridos estes passos (e só depois disso), é preciso ter pulso firme na
decisão.
Quanto a Paulo Portas... bem,
quanto a ele contaram-me uma frase: «Rigor não é um Excel». Seria um belo lema
de campanha. Mas o tempo das campanhas foi em 2011.
Lembro-me de que nessa altura
Portas foi muito veemente enquanto corria as feiras. Seria o factor de
bom-senso do Governo, mas também o líder que sabia o que queria.
Hoje, Portas tem na mão um
guião para isso. E estou certo de uma coisa: ninguém mais voltará a acreditar
nele se não assumir o risco de escolher caminhos – mesmo que isso implique
perder popularidade no imediato.
Sim, Portas tem de ser
ministro de Estado. Isso implica sentar-se à mesa com Passos Coelho e Vítor
Gaspar, o homem do Excel, e ajudá-los nesse trabalho.
Sejamos claros: não tenho
nenhum problema com parceiros de coligação que explicam ao seu eleitorado, no
fim de um processo de negociação interna, que fariam algo de modo diferente.
Isso há em todo o lado. Mas não acredito em ninguém que não apareça nas
fotografias dos momentos difíceis, para explicar ao país que está lá para
assumir a sua quota parte de responsabilidade.
Quando, no meio deste filme,
ouço as habituais críticas a Vítor Gaspar, pergunto-me só se os outros, dentro
do Governo, não lhe podiam facilitar um bocadinho a vida – na coordenação política,
mas também nas pastas sectoriais. Talvez assim tivesse de recorrer menos ao
Excel para justificar uma das suas frases preferidas: «Tudo vai acabar bem. E
se não estiver bem é porque ainda não acabou». Podem chamar-lhe determinismo.
Ele chama-lhe determinação.
O que espero deste Governo,
agora que Miguel Relvas já saiu e que entrou alguém com bom-senso para o seu
lugar, é que faça esse trabalho interno com sentido de missão e igual dose de
bom-senso. Mas sem hesitações, porque já lá vão quase dois anos.
O filme desta semana, para
esse efeito, não é brilhante: subsídios que, afinal, já vão ser pagos em Junho
e Julho, mas apenas parcialmente; uma nebulosa sobre que medidas já se
aprovaram e têm de se aprovar para fazer face ao chumbo do TC; um plano para a Economia
sem que exista um mínimo de estabilidade para alguém querer investir.
Acreditemos, para nossa paz interior, que é um intervalo para reajuste.
Tenho para mim que se Passos,
Portas e Gaspar funcionassem como um todo fariam uma boa equipa, precisamente
por serem tão diferentes uns dos outros. Depende deles fazerem disso uma
virtude. Só deles.
Título e Texto: David Dinis, Sol,
30-04-2013
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Vítor Gaspar, Pedro Passos Coelho e Paulo Portas. Foto: Hugo Correia/Reuters |
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