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Luís Roberto Barroso, foto: Folhapress |
Ai, ai, ai… Alguns ministros
do Supremo Tribunal Federal falam demais. E, tudo indica, isso não vai mudar
com a chegada de Luís Roberto Barroso, tão logo assuma a sua cadeira na corte.
Ele nem está lá ainda e, vejam só, já está movimentando o noticiário com opiniões.
Nesta segunda, decidiu criticar o ativismo judicial, conforme informa
VEJA.com. E é evidente que o fez se referindo a decisões tomadas por seu
futuros parceiros de corte. Não assumiu ainda, mas se comporta como ombudsman
do tribunal do qual fará parte. É bem verdade que expressou uma opinião num
seminário, que já estava agendado. Mas o convite feito por Dilma antecedeu o
discurso que tinha pronto. Teria dado tempo de arrumar as coisas para não
passar a impressão de que chega à Corte como um juiz dos juízes. E o que disse
ele no tal seminário? Prestem atenção:
“Em uma democracia, decisão
política deve tomar quem tem voto (…) O Judiciário deve ser deferente às
escolhas feitas pelo legislador e às decisões da administração pública, a
menos que — e aí, sim, se legitima a intervenção do Judiciário — essas decisões
violem frontalmente a Constituição. Aí, sim, por exceção e não por regra, o
Judiciário pode e deve intervir.”
Analisar discursos é a minha
praia. Submeter a literalidade ao contexto é a minha obsessão. Se saio por aí a
dizer que é preciso ter mais respeito pela Lei da Gravidade, ninguém há de
achar que sou louco por acreditar nela, mas minha fala só fará sentido se
estiver em curso alguma tentativa de burlá-la, certo? Se anunciou em praça
pública: “Todos os homens públicos devem ser honestos”, é fato que ninguém
divergirá do conteúdo, mas a proposição só encontrará a devida recepção se nem
todos os homens públicos estiverem sendo honestos.
Assim, ainda que Barroso tenha
dito o óbvio, é certo que está dizendo, por contraste, que o Judiciário não
está sendo “deferente” às escolhas feitas pelo legislador, o que até pode ser
uma crítica pertinente, mas já descabida para quem vai ocupar uma cadeira já
reservada. Seria simplesmente inconcebível que um candidato à Suprema Corte nos
EUA se desse a tal desfrute. Num momento em que forças não exatamente
iluministas do Congresso se insurgem contra o Supremo, a crítica é, para dizer
pouco, inoportuna.
Casamento gay
No post acima, trato, entre outras questões, da função do jornalismo: aplaudir ou se apegar aos fatos? Apego-me aos fatos. Barroso foi, por exemplo, um dos militantes, na área do direito, para que se reconhecesse como “constitucional” a união civil entre homossexuais e em favor do aborto de anencéfalos. Então falemos um pouco de “ativismo judicial”. Então é o caso de debater se vamos definir como “ativismo judicial” a prática do Poder Judiciário que invade a competência do Poder Legislativo ou se ativismo judicial é aquilo que cada um de nós acha que seja.
O parágrafo 3º do Artigo 226
da Constituição estabelece, por exemplo:
“§ 3º – Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”
“§ 3º – Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”
Parece que o doutor Barroso,
como advogado — e certamente assim seria se membro da Corte já fosse —,
considerou que a vontade do legislador não tinha sido suficientemente clara,
não é?, ao considerar, e não tenho modo menos tautológico de escrever isto, que
“homem é… homem”, e “mulher, mulher”. Vários saltos triplos carpados
hermenêuticos levaram o STF a considerar que, não existindo normas contraditórias
na Carta, se o Artigo 5º garante a igualdade de direitos, então o Parágrafo 3º
do Artigo 226 ou foi revogado ou não vale. À época, fiz uma pesquisa bastante
extensa. Não encontrei corte nenhuma no mundo democrático que fosse dada a
interpretar a Constituição CONTRA A SUA PRÓPRIA LETRA. Recentemente, num abuso
que me parece espetacular, o Conselho Nacional de Justiça obrigou (?) os
cartórios a celebrar o casamento gay propriamente.
Que se note: sou favorável,
sim!, ao casamento gay. Mas, não sendo a união civil ou casamento direitos
naturais, e sim pactos socialmente definidos (a exemplo de boa parte das leis e
normas), há o Poder que deles se encarrega, não? E entendo que esse Poder é o
Legislativo. Sem que uma emenda fosse aprovada pelo Congresso, mudando a
Constituição, parece-me óbvio, evidente, que o Supremo invadiu uma área de
competência do Legislativo. Da mesma sorte, afiguram-se como escancaradamente
inconstitucionais as cotas raciais, com as quais, estou certo, doutor Barroso
concorda. Ou todos os homens são iguais perante a lei ou não são. Corrigir
eventuais desigualdades de fato com leis suplementares de reparação para
determinados grupos, vá lá. Mas suprimir direitos de uns para fazer justiça a
outros (é o caso das cotas), aí me parece um estupro constitucional e moral.
Brancos estão sendo punidos, sob o pretexto de corrigir desigualdades, porque
brancos. É uma Justiça bastarda! Não obstante, doutor Barroso não vê nisso
ativismo judicial, mas matéria de justiça apenas.
Aborto de anencéfalos
Pergunto ao jurista, futuro ministro: o Legislativo também não deixou clara a sua vontade, no Código Penal, ao definir as hipóteses de aborto legal? Lá está: em caso de estupro e de risco de morte da mãe. E só. Mas doutor Barroso foi um dos patrocinadores da legalização do aborto de anencéfalos. Nesse caso, ele militou ferrenhamente para que o Supremo emendasse, por sua conta e sem competência para tanto, o Código Penal. A nossa Constituição, como ele sabe, protege a vida sem reservas, deixando para a lei as exceções que estão… na lei. Nesse caso, no entanto, ele achou que estava tudo certo e ainda fez peroração sobre a decisão em sua página na Internet. Mais do que isso: em sua página na Internet, diz que é chegada a hora de debater a questão sem preconceitos. Ele certamente é favorável à descriminação do aborto e acha que quem discorda dele é preconceituoso.
Advogado capaz ele é, sem
dúvida. Burro não é, de modo nenhum, daí que tenha aberto a janela, em sua
fala, para o ativismo judicial. Ele seria inaceitável “a menos que — e aí,
sim, se legitima a intervenção do Judiciário — essas decisões violem
frontalmente a Constituição.” Entendi… Então voltamos à vaca fria: EU
ENTENDO QUE VIOLA FRONTALMENTE A CONSTITUIÇÃO O QUE SE CHOCA COM O CONTEÚDO
EXPLÍCITO DA CONSTITUIÇÃO OU COM O SEU ESPÍRITO, NO CASO DA NÃO EXPLICITAÇÃO.
- a Carta é explícita ao
definir os termos da união civil;
- a Carta é explícita ao
declarar a igualdade dos homens diante da lei;
- a Carta é explícita ao
defender a vida.
No entanto, nesses três casos,
doutor Barroso preferiu o caminho do “ativismo judicial”. Não me parece
correto, prudente ou ético acusar o “ativismo judicial” quando a gente discorda
do Supremo e aplaudi-lo quando a gente concorda, não é mesmo? “E você,
Reinaldo? É coerente?” Se quiserem, até me desculpo por isto, mas sou, sim. Eu,
que chamei de bolivariana e fascista a proposta petista de submeter decisões do
Judiciário ao Congresso ou a referendo, não obstante, já critiquei severamente essas invasões de competência. Está
lá, nas páginas 313 a 318 do livro “O País dos Petralhas II”. Meu alinhamento
automático é com a Constituição e com as leis. Não sou do tipo que transforma
em princípio universal aquilo com que concorda e em mero preconceito aquilo de
que discorda.
O “progressista”
Podem procurar na Internet. Fui o primeiro a classificar a escolha de Barroso como a opção por um “progressista”. Dilma tinha decidido, afirmei, afrontar os “conservadores”. Não tratei seu currículo com menoscabo, é evidente. Apenas cumpri uma das minhas tarefas de jornalista, que é investir na compreensão crítica. Quem aplaude ou vaia é plateia. Eis que, nesta sexta, pego os jornais e vejo lá: Dilma, dizem, escolheu um progressista — e a palavra nem trazia aspas, nada! Progressistas, por certo, querem progresso. Logo, discordar do doutor Barroso, doravante, passará a ser manifestação de atraso.
Vou encerrando. Reitero a
minha restrição à fala impertinente do futuro ministro, que, parece-me, pode
ter sido bastante apreciada por algumas alas brucutus do Congresso. E deixo as
minhas questões ao “progressista”: quando o Supremo legisla e aprova cotas,
união civil gay e aborto de anencéfalos, Vossa Senhoria, futuro Vossa
Excelência, não vê ativismo judicial? Ou ativismo judicial só existe quando Vossa
Senhoria discorda da decisão?
Como vocês veem, quem me
obriga a fazer tais indagações é a lógica, são os fatos.
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, 25-05-2013
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