Em setembro último, os
argentinos realizaram maciças passeatas em todo o país para protestar contra os abusos autocráticos, fracassos
econômicos, e corrupção desenfreada da presidente Cristina Kirchner. Dois meses
depois, eles fizeram manifestações ainda maiores. E em 18 de abril, eles fizeram os maiores protestos de
todos, com cerca de dois milhões de pessoas marchando por cidades e vilas em todo o país, incluindo,
ainda mais de um milhão delas só em Buenos Aires.
A Cristina Kirchner não basta o poder de administrar o país; o seu neoperonismo exige que ela consiga o poder de fazer as leis e de controlar a justiça e, em suma, se tornar uma ditadora em seu país. |
"Fui para a rua porque
supostamente vivemos numa democracia e que corre o risco de se transformar em
ditadura", declarou um estudante universitário argentino à Reuters.
"Mas este governo não quer ouvir ninguém. Todos os dias, nos tornamos mais
como reféns e, de alguma forma, temos que tornar isso conhecido".
O estopim imediato dos
protestos de 18 de abril foi uma proposta
de Kirchner para abolir a independência do Judiciário, mas os manifestantes
também expressaram preocupações sobre quase tudo, desde a inflação estratosférica e a criminalidade violenta aos ataques governamentais à liberdade de imprensa. Nas semanas que se seguiram aos
protestos da população argentina, ela recebeu uma boa e uma má notícia. A boa
notícia foi a de que o sistema judicial da Argentina rechaçou à guerrinha
particular de Cristina et caterva contra a liberdade de expressão. A má notícia
fia a de que os legisladores aliados do governo promulgaram
suas "reformas" judiciais, o que significa que o partido terá agora o
controle majoritário sobre o conselho legal que nomeia e (se necessário e a
critério da Casa Rosada) remove juízes federais. Não é difícil antever o que
isto significa na prática: o Poder Executivo da Argentina será capaz de
aparelhar os tribunais federais com magistrados cupinchas e também será capaz
de impugnar qualquer juiz que não seguir a linha do partido.
Não causou surpresa o fato de
muitos grupos e instituições do exterior terem condenado a ‘revisão judicial’
de Cristina Kirchner, considerando-a como uma agressão violenta à democracia.
Tanto José Miguel Vivanco dos Direitos Humanos como a relatora especial da ONU, Gabriela Knaul disseram que a revisão "compromete
seriamente” a independência do poder judiciário da Argentina, e a ONG
‘Transparência Internacional’ alertou que isto poderá "ameaçar o estado de
direito do país, concentrando muito poder nas mãos do Executivo",
praticamente transformando-o num poder ditatorial. A Câmara Nacional de
Apelações Civis da Argentina disse que "a revisão judicial viola o
princípio da independência do poder judiciário", e a Associação
Empresarial argentina chamou o descalabro legislativo de "uma séria ameaça
às garantias constitucionais e o equilíbrio entre os poderes, característica do
processo democrático". Em Buenos Aires, o prefeito Mauricio Macri e
membros do Legislativo da cidade tomaram medidas para afirmar seu apoio à
liberdade de expressão.
Tamanha apropriação indébita
do poder judiciário pelo executivo de Kirchner, com a cumplicidade de um
legislativo altamente corrompido, ocorre num momento em que muitos juristas
argentinos estão envidando seus esforços para resistir à criação na Argentina
de uma autocracia ao estilo venezuelano. Por exemplo, apenas algumas semanas
atrás o Senado da Argentina aprovou as tais ‘reformas judiciais’, e um tribunal
de apelações determinou que partes dessa da lei "antimonopólio" da
mídia de 2009 são inconstitucionais. Esta é a lei que Kirchner usou para exigir
a dissolução do Grupo Clarín, o maior
conglomerado de mídia da Argentina, que publica o principal jornal do país, o El Clarín. O império Clarín representa o maior adversário
jornalístico de Kirchner e é por isso que ela lutou tanto para desmantelá-lo.
Após a recente decisão de segunda instância, o caso vai para o Supremo Tribunal
da Argentina.
Mas Cristina Kirchner não
gosta de perder tempo. No início deste mês, sua base aliada (‘alugada’, melhor
dizendo) no Congresso entrou com um projeto de lei que permitiria o governo se
tornar, por decreto, o acionista majoritário na única empresa fabricante de
papel de jornal da Argentina. Tal providência seria, obviamente, para atingir
jornais que se manifestem contra Kirchner, como o Clarín e o La Nación,
especialmente tendo em vista os controles cambiais rígidos da Argentina e as
restrições à importação. Tais papéis de rotativas já enfrentam uma luta para
lidar com a guerra de publicidade não declarada de Kirchner, como relatou o jornal americano The Wall Street Journal em fevereiro, “as empresas de supermercados varejistas da
Argentina e os eletrônicos que foram encomendados pelo governo para parar a
publicidade nos principais jornais do país".
As novas ‘reformas judiciais’
vão tornar ainda mais difícil para os jornalistas apelarem à justiça em face
das agressões inconstitucionais à sua liberdade profissional, porque liminares
contra a política do governo valerão no máximo por seis meses.
Título e Texto: Francisco Vianna (da mídia
internacional), 31-05-2013
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