sexta-feira, 31 de maio de 2013

PSDB na TV: Por enquanto, ainda longe de uma mudança da gramática do poder e da política

Reinaldo Azevedo

O programa do PSDB foi ao ar nesta quinta. O vídeo segue abaixo. Não foi exatamente o melhor dia para isso, em pleno feriadão de Corpus Christi. São Paulo, por exemplo, está vazia. Quando as pessoas viajam, a tendência é que se desgrudem um pouco da TV. Esboçaram-se ali algumas linhas do que pode vir a ser a campanha eleitoral do senador Aécio Neves (MG) à Presidência da República. Assistam. Volto em seguida.


Foi um programa apresentando um candidato. Em novembro de 2009, já estava claro, por exemplo, que José Serra seria o nome do PSDB em 2010. Mesmo assim, Aécio exigiu uma divisão salomônica do programa. Menos de um mês depois, ele anunciou que “renunciava” à disputa. Da forma como fez, o óbvio se tornaria fatal: a parcela do eleitorado mineiro que simpatizava com ele passou a hostilizar Serra. Ficou a impressão que este havia usurpado o que lhe pertenceria por direito.

Desta feita, Aécio não teve de dividir o programa com ninguém. Falou sozinho. Como ele mesmo lembrou, os tucanos administram oito Estados, mas só se falou de Minas, apresentado como exemplo de eficiência. Ficamos sabendo, assim, que dona Juracy Borges, de Galheiros, era “depressiva” e se curou graças ao incentivo oficial ao artesanato. O seu Armando da Silva, de Unaí, um produtor de leite, também contou com o apoio do governo do estado, venceu as suas dificuldades e nos convida a comer um pão de queijo porque “o mineiro gosta de um pão de queijo mesmo”… Então tá.

Aécio participa ainda de uma conversa, com consumidores dispostos em círculo, sobre a inflação e diz que o governo tem de ter tolerância zero com esse mal. Aí aproveita para lembrar que o PSDB é que fez o Plano Real. Exalta o investimento de Minas em estradas e diz ser preciso melhorar a infraestrutura do país, com mais rodovias, ferrovias, hidrovias, portos e ensina: “O setor privado não é inimigo”. Sobra uma crítica ligeira ao Bolsa Família: “Eu não acho que a melhor herança que um pai pode deixar para o seu filho seja o cartão do Bolsa Família”.

O programa chega ao fim com declarações de Geraldo Alckmin, José Serra e FHC feitas na convenção do partido. São falas genéricas sobre a unidade partidária, mas soaram, no contexto, como se fosse apoio ao “candidato”. Nos segundos finais, Aécio, em tom de comício, fala em construir um “Brasil mais justo e mais solidário”.

Das restrições
– Ainda que, desta feita, a “estratégia” do PSDB seja antecipar um nome para a disputa presidencial (por que essa proposta é boa agora e era ruim em 2009?), faz sentido usar apenas o estado de Minas como exemplo da eficiência tucana? Eu acho que não, mas os tucanos devem, como sempre, saber o que fazem, certo?
– Há alguns indicadores, convenham, que não fazem de Minas um exemplo a ser seguido, razão por que poderiam buscar exemplos de eficiência em outros estados. E isso não impediria Aécio de continuar como âncora do programa.

– O PSDB governa o estado de São Paulo há quase 19 anos. Não há um só caso virtuoso a ser exibido? “Ah, mas aí teria de falar de todos…” Entendi. Para não deixar Roraima com ciúmes, então se ignora o governo do maior colégio eleitoral do país.

– As escolhas para exaltar as virtudes de Minas me pareceram um tanto prosaicas, bisonhas até. Há um certo tonzinho de populismo amoroso nos exemplos apresentados, com aquela música ao fundo nos convidando à emoção.

– Aécio, como viram, não fez críticas diretas ao governo ou ao PT. Preferiu o caminho propositivo — os marqueteiros não abrem mão… “Precisamos disso, precisamos daquilo, precisamos do que se fez em Minas…” As palavras mais duras foram ditas contra a inflação. E só.

– O que Aécio está dizendo é que pode fazer melhor do que Dilma, sem, no entanto, explicar o que ela faz de errado. Vai funcionar? Para torná-lo mais conhecido, sim. Vamos ver se consegue mobilizar o eleitor.

Efeito
O número de eleitores que gostaria de apear o PT do poder é certamente maior do que aqueles que, por enquanto, se mostram dispostos a votar no mineiro, segundo apontam as pesquisas. O programa não falou com esse público. Os “especialistas” tendem a achar que uma peça publicitária como essa não pode ser dirigida aos já convertidos. Ele tem de ser especialmente pensado para o eleitor que poderia ou não votar no PT, que poderia ou não votar no PSDB. Isso explica aquele tom sereno, amoroso, boa-praça, até reflexivo às vezes.

Entendo a estratégia, mas acho que não dá certo. Essa coisa, assim, melíflua, docinha, num tom fraternal, ignora o que me parece essencial: uma campanha eleitoral tem de confrontar valores. Assim se faz no resto do mundo democrático. A exceção tucana, até agora, não aconteceu, certo? “Mas isso não é campanha eleitoral, Reinaldo! Aécio está se apresentando ao grande eleitorado.” Eu sei disso. Mas essa preocupação, creio, deixou o programa chocho demais. O PT vive um dos seus piores momentos em quase 11 anos de poder. Não entendo como a dona Juracy e o seu Armando — a metafísica do artesanato casada à do pão de queijo — mobilizem esperanças novas.

Aécio fez, como se viu, um esboço de crítica ao Bolsa Família. Onde, tenho a certeza, parte considerável do tucanato pode ter visto um erro, eu vi um eventual acerto. Mas a fala foi tão breve que não dá para saber se o PSDB terá a coragem de enfrentar também os valores que o petismo foi construindo nesses 11 anos.

Sei que alguns tucanos vão ficar furiosos com este escriba “paulista”, mas sabem como é… Só me resta dizer o que penso. O programa, tecnicamente excelente, foi, no seu conjunto, fraco. Nem deu para perceber direito por que Minas é um exemplo a ser seguido pelo resto do Brasil, inclusive pelas sete outras gestões tucanas, que foram solenemente ignoradas.

Acho que a derrota do PT em 2014 faria bem ao Brasil e à democracia. Mas ainda não dá para vislumbrar esse belo horizonte. E tenho, de resto, uma dúvida: um programa com essas características, une o PSDB? Acho que não…

Para encerrar: como vivo aqui a criticar apedeutismos, não dá para deixar passar. É ruim ter de ouvir e de ler na tela: “Você vai conhecer o jeito do PSDB cuidar das pessoas”. Ou se escreve “Você vai conhecer o jeito DE O PSDB cuidar das pessoas” ou “Você vai conhecer o jeito do PSDB DE cuidar das pessoas”. Das três alternativas possíveis, o partido escolheu o jeito errado de cuidar da língua portuguesa.
Frescura? Eu não acho! É preciso mudar também a gramática do poder e da política.
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, 31-05-2013

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