Reinaldo Azevedo
Ai, ai…
“Lupus pilum mutat, non
mentem” O lobo muda de pelo, mas não de ideia, de caráter, de personalidade. Em
português, já escrevi aqui, outra versão se popularizou: “O lobo muda de pelo,
mas não de vício”.
O senador Fernando Collor
(PTB-AL), um dos investigados da operação Lava-Jato, fez nesta quarta um
discurso de 18 minutos na tribuna do Senado contra Rodrigo Janot,
procurador-geral da República — que certamente lhe será grato, já digo por quê.
Apontou o que considerou desmandos dos procuradores — duas vezes se referiu à
força-tarefa como “grupelho”, defendeu-se das acusações que lhe faz a turma,
discursando com aparente serenidade, de forma pausada.
Mas sabem como é a natureza do
escorpião — ou, sei lá, do lobo. Ao sustentar que os carros apreendidos em sua
casa pertencem a suas empresas e têm origem lícita, fez uma pausa, não se
conteve e, entredentes, mas de forma muito clara, disparou contra Janot: “Filho
da puta!”. Vejam aí. O palavrão é pronunciado aos 5min04s.
Transcrevo o trecho:
“As empresas têm
contrato social, estão devidamente registradas na Junta Comercial, têm
atividades de acordo com o que define a legislação. Se existem parcelas em
atraso, é uma questão comercial que diz respeito a mim e ao credor, não podendo
jamais, em tempo algum, sob risco de uma grave penalização judicial a quem
afirma, que tal atraso se deva ao não recebimento de recursos escusos.
Afirmações caluniosas e infames! Filho da puta”.
Pois é…
Não se pode cassar de
ninguém, nem de Collor, o direito de se defender também politicamente, que é o
que ele faz na tribuna do Senado. Mas é aceitável que se manifeste desse modo?
Ele reclama, por exemplo, de uma indústria de vazamentos de informações que
teriam origem na Procuradoria. Que exponha lá, afinal, os seus motivos. Mas, ao
partir para a baixaria, fala mais de si do que de seus desafetos. É lamentável!
O senador reclama, por
exemplo, que, nesta terça, seus assessores receberam telefonemas de jornalistas
às 10 da manhã para saber se ele diria alguma coisa sobre parecer de Janot, que
se opunha à devolução dos carros, que ele, Collor, havia solicitado ao Supremo.
Emenda, então, o senador:
“Às 15 horas de ontem,
meu advogado foi recebido pelo Ministro Teori Zavascki, a quem deveria ser
dirigido o parecer e dado conhecimento exclusivo. Disse o ministro que, até
aquele momento, não havia recebido nenhuma comunicação do procurador-geral”.
E então conclui o
senador: “Portanto, vejam os senhores que informações que correm sob ‘segredo
de justiça’ foram vazadas seletivamente, de forma criminosa, pelo
procurador-geral da República aos meios, antes mesmo que o ministro relator do
Supremo Tribunal Federal tomasse delas conhecimento!”.
Collor acusa a
existência de um conluio entre a Procuradoria e veículos de imprensa e diz que
Janot contratou uma empresa de comunicação, a Oficina da Palavra, para
organizar os vazamentos. Ele diz haver irregularidade na contratação dessa
empresa e afirma que a imprensa se nega a apurá-las. Em socorro de sua tese, lê
trechos de uma carta que servidores da Secretaria de Comunicação Social do
Ministério Público Federal encaminharam, no dia 6 de março deste ano, a Janot
(leiam o trecho citado por Collor no pé deste post). De fato, há lá uma serie
de acusações contra a Oficina da Palavra.
Collor não escondeu o
objetivo de sua intervenção. Quer que seus pares rejeitem o nome de Rodrigo
Janot. Afirmou:
“Pois bem, senhor
presidente, volto então a perguntar, como tenho feito há meses desta mesma
tribuna: há ou não há uma sórdida estratégia midiática promovida pela
Procuradoria-Geral da República? Por tudo isso, a responsabilidade
institucional do Senado Federal, quando da apreciação do nome indicado pela
presidente da República ao cargo de procurador-geral da República, será ainda
maior. É preciso que todos, parlamentares, mídia e população, abram os olhos
para muitos dos aspectos que estão por trás dessas investigações.”
Desde quando era
presidente da República, Collor é um de seus principais inimigos. A questão é
saber se, com o discurso desta quarta, arranjou mais aliados ou mais
adversários para a sua causa. A resposta, depois da grosseria inaceitável, me
parece óbvia.
*
Trecho da carta que
servidores da Secretaria de Comunicação Social do Ministério Público Federal
enviaram a Janot, em que reclamam da atuação da empresa “Oficina da Palavra”,
reproduzido por Collor em seu discurso.
“Em dezembro
de 2014, em conversa com o Procurador-Geral da República, manifestamos nossa
preocupação com o cenário que se projetava com a contratação da Oficina da
Palavra e com a forma como as mudanças vinham sendo implementadas, mas julgamos
que era possível dar um voto de confiança à Administração. Contudo, nossas
expectativas foram frustradas.
(…)
A análise que
fazemos é de que a estratégia adotada tem redundado em uma série de ações
questionáveis, que prejudicam a imagem e a reputação institucional. Essas ações
também se revelam contrárias aos princípios constitucionais, como o da impessoalidade
e da publicidade; aos preceitos da comunicação pública; e às diretrizes
institucionais, em especial da transparência e do profissionalismo.
É
perceptível, e nos causa perplexidade, o descontrole sobre as informações
decorrentes da Operação Lava Jato, que redundaram em vazamentos e, segundo a
imprensa, colocam em dúvida a legitimidade da atuação institucional e dão
margem a questionamentos acerca do tratamento diferenciado que se tem concedido
a determinadas empresas de comunicação.
(…)
Mesmo nos
mais diversos círculos de convivência, a instituição tem sido ridicularizada e
sua isenção questionada, por conta de declarações e imagens consideradas
demagógicas e personalistas.
Este não é o
primeiro período turbulento e de grande repercussão pública que assola a
instituição. Podemos lembrar os acontecimentos decorridos durante os trabalhos
do mensalão. Naquela ocasião não ocorreram vazamentos nem a imagem
institucional foi denegrida como está acontecendo no momento presente.
(…)
Não podemos
esquecer que o Ministério Público Federal é uma instituição pública e
fundamental para a democracia e a cidadania. Portanto, suas ações não podem
prescindir de uma comunicação pública baseada na ética, na transparência e na
verdade. Portanto, gostaríamos de saber se é estratégia:
a: dar acesso
a informações extremamente sensíveis para uma empresa privada cuja finalidade
precípua é obter lucro?;
b: vazar
informações para os grandes veículos de comunicação?;
c: fornecer
informações em off e privilegiar determinados veículos de comunicação?;
d: não
divulgar antes nos canais de comunicação do próprio Ministério Púbico Federal
informações de grande interesse público, como o envio ao Supremo Tribunal
Federal a lista dos ocupantes de cargos públicos suspeitos de envolvimento na
Lava-Jato?;
e: é correto
priorizar a quantidade em detrimento da qualidade da exposição?;
f: é correto
desprestigiar a comunicação pública e substituí-la por barganhas e estratégias
próprias da comunicação mercadológica a fim de conseguir capas de jornais e
destaques em jornais televisivos?”
Título e Texto:
Reinaldo Azevedo, veja,
6-8-2015
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-