(Lucas Mafaldo, filósofo,
professor e pesquisador no Canadá)
1. Uma coisa importante sobre essa nomeação de Moro é que ela
revela uma qualidade enorme do próprio Bolsonaro que está passando
desapercebida.
2. Cesar Maia alertou para o risco de indicar alguém que você não
possa demitir -- uma observação tão certeira quanto reveladora de uma cultura
problemática. Cesar Maia está certo no seguinte sentido: Moro, tanto por sua
história como por vir de fora da política, tem uma reputação ainda mais forte
do que o próprio Bolsonaro em termos de respeito às instituições e luta contra
a corrupção.
3. Portanto, embora Bolsonaro seja o chefe, Moro tem tanto capital
social que não pode ser demitido facilmente. Por isso, ao nomeá-lo, Bolsonaro
diminuiu o próprio poder: ele colocou deliberadamente no governo alguém que ele
não pode controlar.
4. Em termos de pura estratégia pessoal, seria uma decisão
equivocada. Porém, em termos do que é melhor para o país, é algo certíssimo: é
como se Bolsonaro estivesse amarrando o próprio governo ao combate a corrução.
Ele está se diminuindo para que sua equipe possa subir mais alto.
5. E aí volto ao problema da cultura brasileira que, infelizmente,
incentiva exatamente o contrário: o rapaz estudioso é objetivo de piada, a moça
competente não é contratada porque a vaga vai para um puxa-saco. Como se
comentou mais cedo, há uma dose imensa de pose na cultura brasileira: as
pessoas "importantes" mostram sua importância no modo de se vestir,
na linguagem utilizada, na repetição das opiniões chiques e nas frases de
efeito -- e raramente por meio de alguma competência específica.
6. Essa falta de competência gera líderes fracos, inseguros, que
precisam sempre recrutar pessoas que estejam abaixo de si próprios. Elas não
percebem que o bom líder é justamente quem sabe escolher e motivar pessoas com
talentos complementares: o bom líder é o centro de aglutinação de pessoas de
alto nível, capazes de superar o próprio líder nos seus respectivos campos de
atuação.
7. E é exatamente isso que estou começando a enxergar em Bolsonaro.
Ele fez algo muito parecido ao convidar o General Heleno e Paulo Guedes. O
primeiro tem muito mais experiência militar e administrativa do que ele,
enquanto o segundo tem muito mais conhecimento de economia. Em vez de ficar
intimidado, ele adicionou outro peso-pesado à sua equipe: um cara com uma
excelente reputação e ampla experiência no combate à corrupção.
8. Se esse padrão continuar, o
país irá recuperar muito do terreno que foi perdido nos últimos anos.”
Título e Texto: Cesar Maia, 7-11-2018
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