José António Saraiva
Logo na noite eleitoral, António Costa
disse que iria ter contatos com vários partidos, mas quando lhe perguntaram se
entre estes estava o Chega disse qualquer coisa como: «Não temos nada a ver com
o Chega».
No dia seguinte, Rui Rio fez
uma afirmação semelhante, não incluindo o Chega no radar dos futuros
interlocutores. E recentemente Luís Montenegro, opositor de Rio, falou do CDS,
mas excluiu o Chega dos partidos com quem iria falar. Com os comentadores
passa-se um fenómeno idêntico.
Todos malham no Chega e
referem-se a ele com desdém, como se tivesse peçonha. Mesmo os comentadores
mais próximos da direita (que são poucos) não querem confusões com o Chega. E
os partidos da extrema-esquerda chamam-lhe ‘fascista’ ou mesmo ‘nazi’.
Ora, onde já vimos isto?
Exatamente: em França, quando surgiu Jean-Marie Le Pen. No país da Revolução
Francesa, Le Pen entrou na política a ser marginalizado por todos, a ser
atacado a torto e a direito, mas foi crescendo, esteve à beira de ser eleito
Presidente da República – e hoje a filha perfila-se como uma fortíssima
candidata ao Eliseu.
Os políticos e os comentadores
não percebem que, ao marginalizarem alguém, ao atacarem alguém
sistematicamente, estão a contribuir para a sua notoriedade. André Ventura, que
fundou o partido há um ano, tem já uma enorme visibilidade por quê? Em boa
parte, pelos ataques e desfeitas de que tem sido alvo.
Devo dizer que, ao contrário
de muitas opiniões, não considero Ventura um homem de extrema-direita e muito
menos um fascista. Se ele fosse fascista, então Portugal estaria cheio de
fascistas – pois Ventura limita-se muitas vezes a dizer alto aquilo que muitos pensam,
mas têm medo de dizer. Basta ver as redes sociais para perceber isso.
Há muita gente descontente,
que acha os políticos ‘todos iguais’, que está indignada com a corrupção, que
não percebe o pagamento de rendimento mínimo a pessoas que não querem
trabalhar, que discorda do fim dos chumbos no ensino básico, que se choca com o
casamento gay, as mudanças de sexo ou as salas de chuto, que contesta a vaga de
imigração descontrolada para a Europa – e não havia até hoje quem corporizasse
este descontentamento. André Ventura percebeu esse vazio e preencheu-o.
Constatando que havia um nicho
de eleitorado que ninguém representava, compôs uma personagem para o seduzir.
Mas nunca o vi elogiar Mussolini, nem Hitler, nem sequer Salazar. E, no
entanto, já vi muitos comunistas elogiarem Estaline, Lenine, Trotsky ou Mao.
E aí está uma coisa difícil de
entender: a extrema-esquerda é recebida em toda a parte com boas maneiras,
dispõe sempre de grande espaço nas TVs, mas quando a extrema-direita quer falar
‘aqui d’el rei que vem aí o fascismo!’ Ora, pergunto: Ventura representa maior
perigo para a democracia do que Catarina Martins? Não creio. Por todas estas
razões, julgo que o Chega vai crescer muito em próximas eleições.
Até agora, havia em Portugal
uma direita medrosa. O PSD nem sequer se diz de direita, mas de
centro-esquerda, o CDS também é ‘centrista’ e Santana Lopes idem aspas. Este
exemplo é paradigmático. Santana não percebeu que, depois de sair do PSD em ruptura
com Rui Rio, o único caminho que tinha para se afirmar era assumir-se ‘de
direita’ sem meias palavras – ou seja, falando sem complexos da imigração, da
corrupção, dos privilégios dos políticos, dos temas fraturantes, do
patriotismo, do politicamente correto, da União Europeia numa perspetiva
eurocética.
Mas não fez nada disto. Logo
nas europeias ‘matou-se’, ao apresentar um candidato perfeitamente integrado no
sistema. O que vinha ele acrescentar ao que existia? A política não se faz com
medo – e é isto que muita gente ainda não percebeu. Fazem política para ‘não
perder votos’ – quando o caminho é exatamente o oposto: é usar a política para
‘ganhar votos’. Ventura está a fazer aquilo de que o CDS e Santana Lopes
tiveram medo: assumir-se como de direita, num país onde parecia só haver
esquerda.
E há outra razão para o Chega
crescer. Nas últimas eleições, achava-se que o voto nele era um voto perdido,
que não servia para nada. Mas agora sabe-se que um voto no Chega pode
multiplicar o número de deputados. Pode dar-se um fenómeno parecido com o que
sucedeu com o PAN. Para já não falar do crescimento do Vox em Espanha. É que as
histórias políticas de Portugal e Espanha sempre andaram a par...
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