Henrique Neto
A semana passada
usei o célebre debate de 1975 entre Álvaro Cunhal e Mário Soares para recordar
quais eram as posições do PCP e do Partido Socialista naquele tempo e para
acentuar que o PCP pouco mudou neste quase meio século. Além de ter detalhado
as mudanças políticas que, entretanto, pouco a pouco, ocorreram no PS.
Esta semana, o tema político em debate foi a chegada do diabo, sob a forma do acordo político do PSD com o CDS e o Partido Liberal, destinado a assumir a governação dos Açores com o apoio parlamentar do Chega.
Longe das posições de Mário
Soares, bem claras no debate de 1975, o PS decidiu aproveitar o caso dos Açores
para publicitar um cordão sanitário ao redor daquilo a que chama um partido
fascista, racista e xenófobo, ou seja, tal como Álvaro Cunhal, o PS decide o
que é ou não é aceitável em democracia. Aparentemente, o Chega não é aceitável,
mas as direções dos partidos políticos portugueses escolherem os deputados da
Nação em lugar dos eleitores, já é aceitável. Pontos de vista muito pouco
democráticos, está bem de ver, mas inevitáveis no PS do nosso tempo.
O PS não se preocupa que o
Chega seja um partido cuja constituição foi aprovada pelo Tribunal
Constitucional, tenha concorrido em eleições, que apesar de pouco democráticas
são ao gosto do PS, ou que alguns milhares de portugueses tenham votado no
Chega. Nada disso importa ao PS, António Costa é que sabe o que é ou não é
democrático; e quando a democracia pode prejudicar eleitoralmente o PS, então
os portugueses que votaram no Chega que mudem de país, deveriam ter votado no
PS.
É comovente o esforço que o pessoal do PS faz para demonstrar que o Bloco de Esquerda e o PCP são partidos convertidos à democracia e que nada têm a ver com os milhões de mortes do comunismo, nem com a defesa do não pagamento da dívida portuguesa e da saída da União Europeia e da NATO.
Estou nos antípodas das ideias
do Chega, não perfilho da maioria das suas posições políticas, algumas
demenciais, mas tal como Mário Soares não concordo com cordões sanitários não
escolhidos pelos eleitores, além de ser uma medida estúpida. Em 1975 o PCP pretendia
sanear o PSD e o CDS e hoje o PS pretende sanear o Chega.
Esta posição não tem a ver
apenas com a democracia, mas com a sanidade política que o PS tem vindo a
perder de forma incontornável. O Chega não tem hoje poder suficiente para ser
um partido perigoso no contexto nacional, mas que pode tornar-se
perigoso se crescer eleitoralmente, o que poderá acontecer por duas
razões: primeira, se o PS continuar a governar mal; segunda, se o PS e os
outros partidos continuarem a manipular o sistema político a seu favor, isto é,
se cada vez mais portugueses não tiverem voz ativa na democracia portuguesa e o
PS continuar a via autoritária e insensata que está a seguir, para manter o
poder através da propaganda e da manipulação do sistema político e a promover a
corrupção, tanto económica como política.
O PS de António Costa está a
tornar-se crescentemente insuportável para milhões de portugueses. Cansa nas
televisões, ofende aqueles de quem discorda, não ouve os cidadãos e as
instituições, decide como uma autoridade divina e tem um discurso que está nos
antípodas da realidade. Mais, é a realidade que vai corrigindo os erros
que o PS comete com custos insuportáveis para a economia e para a produção de
riqueza. São as 35 horas de trabalho na função pública, é o porto do Barreiro e
a ferrovia em bitola ibérica, o aeroporto do Montijo, o hidrogénio, o Serviço
Nacional de Saúde e a ausência de investimento produtivo.
Basta de um PS errático,
palavroso, autoconvencido, autocrático e pouco sério, é o que pensam muitos
portugueses.
A segunda fase da pandemia
Na primeira fase da pandemia o
PS atrasou-se a tomar algumas medidas, nomeadamente em relação aos lares, a
negociar com as empresas privadas uma possível colaboração para o caso de ser
necessário, no fecho das fronteiras e na disponibilização dos testes. A
desculpa foi que se tratava de uma situação completamente nova e imprevisível.
Durante esse período o Governo
e as autoridades científicas falaram frequentemente da possibilidade de haver
uma segunda vaga, o que acabou por se verificar e que agora estamos a viver.
Infelizmente, o Governo voltou a ser apanhado com as calças na mão: não há
acordo com os privados; o número de testes continua insuficiente; os lares,
agora as prisões, transformaram-se em centros de infecção e de morte; o pessoal
médico queixa-se de todo o tipo de insuficiências e da incapacidade de resposta
dos hospitais; não existe informação capaz de ser usada cientificamente e a
ministra da Saúde faz de conta que está a resolver os problemas. Faz pena, mas
o primeiro-ministro diz que são as circunstâncias muito difíceis.
Para quem conheça o Partido
Socialista e a sua aversão histórica a todas as formas de organização, bem como
a sua tradicional tentação de tapar buracos com medidas avulsas de curto prazo,
saberá que o problema não são as circunstâncias, mas a má qualidade do pessoal
político que António Costa chamou para governar, para combater a pandemia, ou
para combater os fogos de 2017. É da natureza do partido.
Aliás, basta olhar para as
últimas medidas. Depois de os restaurantes e cafés terem feito investimentos
para permitir o chamado distanciamento, o Governo agora mandou-os fechar. Ao
sábado e ao domingo, pelas 13.00 horas e não pelas 15.00 horas como seria
sensato para poderem servir, pelo menos, o almoço. A pandemia não depende
daquelas duas horas, mas se os proprietários e os trabalhadores não
compreenderem as regras levam com a polícia, sendo que no caso de uma
manifestação da CGTP, trata-se do direito sagrado dos trabalhadores. Os
portugueses são mantidos em casa, gostem ou não, mas não se podem encontrar com
a família num concelho vizinho, porventura porque os carros em que se deslocam
estarão infectados, ao mesmo tempo que os transportes coletivos funcionam como
se nada acontecesse.
Nada disto tem grande
importância porque o primeiro-ministro António Costa está atento, vive nas
televisões onde gasta o seu precioso tempo a explicar o inexplicável. No
entender do PS não há nenhum problema que uma boa hora de propaganda na
televisão não resolva. Para mais, o pessoal de José Sócrates anda por perto
para tratar da maquilhagem.
Faz pena, mas é por estas e
por outras que os países do cabo-vassoura da União Europeia nos passam à
frente, um a um. Deve ser do vírus.
Título e Texto: Henrique
Neto, o
Diabo, nº 2291, 27-11-2020
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-