sábado, 12 de dezembro de 2020

[Diário de uma caminhada] «Chegofobia», «Chegofóbico» e «Chegófobo»: três palavras novas da Língua Portuguesa. Linguagem comum contra parasitas irresponsáveis


Gabriel Mithá Ribeiro
 

O que têm em comum ciganos, negros, islâmicos e Chega? São minorias. Uma étnica, outra racial, outra religiosa e a última política. Existem diversas minorias nas sociedades ocidentais, todavia as quatro referidas são relevantes não necessariamente por serem minorias, acima de tudo por serem minorias arrastadas para a órbita das disputas políticas. 

É o poder que gera barreiras entre as minorias, não é a conceção da condição humana em qualquer delas. De um lado, situa-se a minoria Chega, o movimento cívico e político antissistema e, do outro lado, as minorias cigana, negra e islâmica cuja discriminação positiva serve de escudo de legitimação do atual regime. 

Importa clarificar os pressupostos da moral social subjacentes, uma vez que é esta que determina o sucesso ou o fracasso de indivíduos, grupos, comunidades ou sociedades. A moral social joga-se entre o primado da autorresponsabilidade (de matriz judaico-cristã e filosófica milenares) e o primado da vitimização (de matriz revolucionária francesa, de 1789, e sobretudo soviética, de 1917). Eles são incompatíveis entre si e geradores de modelos de sociedade substantivamente distintos. 

O ideário do Chega é antissistema por reintroduzir a universalidade social do primado moral da autorresponsabilidade recusando-se distinguir maioria e minorias, perspetiva que não deixa de valorizar a solidariedade social, mas apenas de forma subsidiária. Esse posicionamento colide com a orientação moral do regime vigente que segue a lógica inversa ao atribuir primazia à solidariedade social e apenas subsidiariamente admitir a universalidade social da autorresponsabilidade, daí instigar sentimentos de culpabilização na maioria branca, heterossexual e de matriz cristã e sentimentos de vitimização nas minorias. 

Independentemente dos detalhes de linguagem ou da espuma dos dias, a disputa cívica, social e política por um ideal de moral social é hoje tão legítima quanto fundamental para o amadurecimento das democracias ocidentais. Daí que a fuga ou a recusa desse confronto é própria dos inimigos da democracia, da sua vitalidade e capacidade de autorrenovação. 

Se ciganos, negros, islâmicos e Chega são minorias, aquilo que essas minorias foram, são e serão depende da vontade dos próprios, mas acima de tudo do contexto social em que se inserem. No âmago deste está a crítica social livre.

A última é a transformação em senso comum das mais variadas formas de pensamento crítico geradas pela tradição civilizacional do Ocidente ao longo de mais de dois milénios (religiosas, filosóficas, políticas, sociais, humorísticas, institucionais). É justamente a crítica social livre que determina a capacidade das sociedades do mundo ocidental em gerarem fenómenos de coesão, integração, promoção, pacificação e renovação social. 

Nas décadas recentes, essa tradição entrou num ciclo de regressão. A crítica social manteve-se livre quando tem como alvos uns (os pertencentes à maioria identitária) e passou a interditada quando os alvos são outros (os pertencentes às minorias identitárias). Tal perversão da crítica social coloca a minoria Chega num extremo e, no extremo oposto, as minorias cigana, negra ou islâmica. 

Enriqueça o seu vocabulário

Em Portugal, é raríssimo um movimento social minoritário nascer, sobreviver e prosseguir debaixo de uma tempestade crítica impiedosa, inevitavelmente carregada de estereótipos negativos, como tem acontecido com o Chega desde 2019, o ano da sua fundação. 

Daí ser da mais elementar justiça a introdução, nos Dicionários da Língua Portuguesa, de três palavras que traduzem o fenômeno, uma evidência empírica de senso comum rigorosamente tipificável:

«Chegofobia»: aversão ao partido político Chega e ao que se relaciona com essa identidade; em geral, ódio a quem se assume de Direita.

«Chegofóbico»: aquele que revela chegofobia.

«Chegófobo»: o mesmo que chegofóbico. 

Nas suas manifestações quotidianas, a chegofobia está a ter consequências inversas em relação às intenções aniquiladoras originárias. Independentemente do que o Chega possa ser enquanto força política e cívica minoritária, e independentemente da justiça ou da injustiça das críticas de que é alvo, se todos os dias os indivíduos que se filiam a essa identidade se sentirem rotulados como racistas, xenófobos, nazis, extrema-direita, antidemocráticos, populistas, sem orientação filosófica ou ideológica, autoritários, totalitários, o seu programa político é uma aldrabice, ditadores, agressivos, entre outras acusações sentidas pelos próprios como grosseiramente ofensivas e humilhantes, o sociólogo Albert Hirschman explicou, em 1970, o que acontece. Ou os indivíduos abandonam a identidade Chega de tão socialmente desconsiderada e incorrigível que é (o sociólogo designa a atitude por exit), o que tem sido a exceção; ou, pelo contrário, melhoram-na continuadamente criticando-se e corrigindo-se a si mesmos ainda que não se reconheçam nas críticas, mas o ser humano pode sempre melhorar, e desse modo reforçam a coesão interna da instituição e, como consequência, a sua capacidade de afirmação social e cívica (voice e loyalty), a regra a cada dia que passa. 

O que muitos ignoram é que a crítica social sempre teve e terá um valor civilizacional insubstituível nos sistemas livres. Esse é o maior trunfo do Chega. Deixem os adversários inventarem demónios que só existem nas suas próprias cabeças. Deixem-nos agitar a charlatanice apatetada da ilegalização do Chega. Isso nada pode contra os efeitos paradoxais da crítica social absolutamente livre que está a instigar a transformação do Chega de minoria periférica em minoria significativa capaz de impor um novo consenso moral à sociedade portuguesa. A persistência do fenômeno poderá proporcionar ao Chega a possibilidade de se transformar em força política maioritária. 

A mesma sociedade que garante tão grande vantagem à minoria Chega procede de modo inverso com as minorias cigana, negra ou islâmica com resultados também inversos. À primeira minoria proporciona-se o confronto com o princípio da realidade e o resultado é a sua afirmação social crescente, às demais minorias anda a oferecer-lhes há décadas a discriminação positiva através da interdição da crítica social que as atinja, presente envenenado cujo resultado tem sido e continuará a ser a perpetuação da marginalização social das últimas. 

A cada português compete avaliar por si o que está errado e quem está errado na relação com os socialmente mais carenciados e vulneráveis. 

Título: Gabriel Mithá Ribeiro, Vice-Presidente do CHEGA!, 12-12-2020

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