Paulo Polzonoff Jr.
Enquanto no Catar a seleção francesa vai perdendo para a australiana, recebo uma mensagem de uma amiga. Ela informa que, como esperado, a campanha do presidente Jair Bolsonaro protocolou no TSE (Tribunal Socialista Eleitoral) uma representação pedindo uma investigação que, se levada adiante, em tese (e bota tese nisso!) poderia mudar o resultado da eleição. E o destino de um país por ora condenado à tragédia de um terceiro mandato presidencial de Lula.
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Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil |
Aí teve início uma conversa
igualzinha àquela que deve estar até agora ecoando entre você e seus amigos e
familiares nos lares, bares e redes sociais da vida. “E você por acaso acha que
isso vai dar em alguma coisa?”, pergunto. Logo me arrependo do “por acaso”.
Soou agressivo, como se a esperança insistente da amiga no "devido
processo legal" fosse um sinal de loucura. Não é. A amiga é inteligente e
sabe que a representação não vai prosperar. O Tribunal Soberbo Eleitoral jamais
admitirá qualquer problema com o sistema de votação brasileiro.
O diálogo ganha outros
contornos quando, menos agressivo (espero), confesso não estar sabendo lidar
com todos as promessas de reviravolta eleitoral que pontuaram o noticiário
desde o começo de novembro. Por um lado, me incomoda a sensação de estar
alimentando nos leitores uma esperança falsa de que as circunstâncias como um
todo mudarão de um dia para o outro, graças a uma bala de prata, uma carta na
manga, uma representação no TSE ou um gesto tresloucado. Por outro, quem sou eu
para tirar a esperança das pessoas?! Ninguém.
Além disso, confesso agora, no
exato momento em que a França empata o jogo, que parte de mim quer que eu
esteja errado. Muito errado. Ridiculamente errado. Parte de mim quer que você,
leitor, possa zombar deste texto desesperançado num futuro bem próximo, dizendo
algo como: "perdeu, seu fracassomaníaco mané". Mas claro que você
seria incapaz de uma indelicadeza dessas.
Fiapos de esperança
Penso no desespero que leva pessoas a se apegarem a qualquer fiapo de esperança diante dos quartéis, nas estradas e nas redes sociais. É admirável e ao mesmo tempo preocupante. Muita gente se manifesta apenas porque quer que sua ideia de mundo prevaleça. Mas entre os manifestantes também há muitos (entre os quais me incluo) cujo desespero tem outra tradução: medo de que o Brasil se transforma numa Argentina, numa Nicarágua ou numa Venezuela.
É um medo legítimo de quem
teme ser incapaz de legar às gerações futuras a riqueza atual. E aqui não me
refiro somente à riqueza financeira. Penso também na tradição e nos valores morais
que correm, sim, risco num governo petista em conluio com o Judiciário. E sem
data para terminar. De volta às dúvidas, porém. Como reconhecer e amenizar esse
medo que assola milhões de brasileiros sem alimentar esperanças falsas e
teorias da conspiração? Como ajudar as pessoas a não caírem num desespero que
pode facilmente se transformar numa revolta crônica – inclusive uma revolta
contra Deus?
Não tenho pretensão alguma de
resolver este dilema com um único texto. Até porque eu mesmo não raro me pego alimentando
esperanças ridículas – pelas quais ainda sou obrigado a ouvir colegas me
chamando de “golpista”. Seria mesmo mais fácil e sobretudo mais prazeroso
acordar e descobrir que a bala de prata atingiu o alvo ou que a carta na manga
era a mais alta do baralho ou que Alexandre de Moraes caiu do cavalo.
Mas talvez Deus, em sua
infinita sabedoria, esteja dando ao povo brasileiro aquilo de que precisamos, e
não o que queremos. Talvez de nós, neste momento conturbado da nossa história,
Deus esteja exigindo o sacrifício da luta incansável e cotidiana pelos próprios
quatro anos – ou enquanto durar aquilo que já considero um regime ditatorial
socialista de facto.
(Até o fim deste texto não só
a seleção da França virou o jogo para cima da Austrália como também Alexandre
de Moraes respondeu cinicamente à representação da campanha de Bolsonaro,
argumentando que as urnas usadas no primeiro e segundo turnos foram as mesmas e
dando 24 horas para a coligação apresentar a auditoria do primeiro turno. Do
contrário, a representação será simplesmente ignorada. Isso se Alexandre de
Moraes não decidir que o pedido de investigação é um ataque antidemocrático às
instituições, claro).
Título e Texto: Paulo
Polzonoff Jr., Gazeta do Povo, 23-11-2022, 7h05
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