segunda-feira, 28 de novembro de 2022

Fora, Lula!

O PT sonha com a união de todos os brasileiros em torno do ex-presidiário que dividiu o Brasil

Em Brasília, manifestantes contra o governo FHC pedem a saída do presidente. Foto: Roberto Stucker Filho, 26-8-1999

Augusto Nunes

Fruto do acasalamento de dirigentes sindicais que achavam leitura pior que exercício em esteira, intelectuais que só viam pobres de perto nas fotos de Sebastião Salgado e veteranos da luta armada que caíram fora do país antes que aprendessem a diferença entre coronha e gatilho, o Partido dos Trabalhadores nasceu em 1980 caprichando na pose de detentor do monopólio da virtude. A chegada ao governo federal em 2002 apressou o fim da farsa. E o Brasil decente não demorou a espantar-se com a multidão de messalinas aglomeradas no templo das vestais que o PT fingira existir por mais de 20 anos.

Fora do partido ninguém prestava, recitaram as virgens de bordel durante 20 anos. Em 1985, por exemplo, Lula ordenou à bancada no PT que se abstivesse de votar no Colégio Eleitoral formado para escolher o primeiro presidente civil desde 1964. Para o chefe, não havia diferenças entre Paulo Maluf — ele mesmo — e Tancredo Neves. Três deputados federais entenderam que Tancredo era infinitamente melhor. Foram expulsos do partido.

Impedido pela morte de assumir o cargo, o titular foi substituído pelo vice José Sarney. “Fora, Sarney!”, gritaria a companheirada nos cinco anos seguintes. (“Sarney é o maior ladrão do Brasil”, afirmou Lula em 1988, num comício em Vitória. Hoje os dois casos de polícia são amigos.) No mesmo ano, o então deputado Lula, líder do PT na Assembleia Constituinte, determinou que a bancada assinasse o texto com uma ressalva: todos rejeitavam “uma Constituição que ignora os direitos da classe trabalhadora”. 

Os presidentes brasileiros Itamar Franco, Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando Henrique Raposo e José Sarney, durante o funeral do papa João Paulo II, no Vaticano, em 2005. Foto: Agência Brasil

Na eleição presidencial de 1989, um Lula derrotado no primeiro turno vencido por Fernando Collor negou-se a pedir apoio aos demais perdedores. Sempre avessos a demonstrações de altivez, líderes do PSDB foram por conta própria a um comício do PT nas imediações do Estádio do Pacaembu. Vaiados na chegada, figuras como Fernando Henrique Cardoso e Mário Covas se enfurnaram por duas horas no fundo do palanque. Nenhum deles foi convidado a discursar. Se algum topasse, não escaparia da tempestade de apupos.

Até 1992, quando o inimigo foi afastado da Presidência, a companheirada berrou “Fora, Collor!”. Consumado o impeachment, os bucaneiros incansáveis colocaram na alça de mira o vice que acabara de assumir. Disposto a cauterizar ao menos algumas feridas abertas pela polarização feroz, Itamar Franco convenceu a petista Luiza Erundina a aceitar uma vaga no ministério. Erundina foi suspensa pelo PT. E os gritos de “Fora, Itamar!” só cessaram quando o substituto de Collor repassou o gabinete no Palácio do Planalto.

“Fora, Fernando Henrique!”, atualizou-se o coro dos descontentes profissionais depois da derrota de Lula no primeiro turno da eleição de 1994. Ignorante em economia, o chefão não consultou ninguém do ramo para qualificar de embuste o conjunto de medidas que domaria a inflação selvagem. Político presunçoso, Lula sempre acreditou ser um intuitivo genial. Continuou desdenhando do plano econômico mesmo quando plateias eufóricas já brandiam cédulas do novo dinheiro nos comícios do adversário. Lula não acordou nem mesmo quando Fernando Henrique Cardoso se tornou tão popular que virou sigla: FHC.

Entre 1994 e 1998, os deputados federais do PT tentaram sepultar todos os projetos, propostas e ideias que tivessem o endosso do presidente da República. Isso mesmo: TODOS. A bancada do partido na Câmara votou contra — para ficar em três assombros — o Plano Real, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a privatização de mastodontes que sangravam com perversidade os cofres da nação. Em outubro de 1998, Fernando Henrique reelegeu-se de novo no primeiro turno. O segundo mandato mal começara quando, em janeiro de 1999, a direção do PT resumiu em duas palavras, uma vírgula e um ponto de exclamação o programa eleitoral do partido para os quatro anos seguintes: “Fora, FHC!”.

A face escura começou a exibir suas dimensões siderais antes mesmo do triunfo de Lula em 2002: o PL recebeu do PT R$ 4 milhões em troca da cessão do candidato a vice, José Alencar, e da promessa de apoio parlamentar. A expansão da “base governista no Congresso” custaria uma bolada multimilionária e se transformaria no primeiro grande escândalo da Era PT. Julgado em 2012 pelo Supremo Tribunal Federal, o mensalão mostrou o rosto do partido reduzido a bando. Ao longo de 13 anos, a roubalheira seria institucionalizada por gente que jurava só pensar na pobreza. Pensava tanto que tratou de enriquecer primeiro, e muito.

Como o janismo, o getulismo, o ademarismo, o brizolismo, o lulismo morrerá com a morte física do único deus da seita

Só poderia dar no que deu: o Petrolão. A roubalheira banalizada pelos governos de Lula e Dilma fez do Brasil o berço do maior esquema de corrupção desde o Dia da Criação. E transformou a Lava Jato na maior e mais bem-sucedida operação anticorrupção de todos os tempos. O povo espantou-se com a novidade: a lei agora valia para todos, e sobravam celas à espera de bandidos da primeira classe. Antes que Lula fosse para a cadeia, o impeachment mandou Dilma para casa. 

Nem assim faltaram gargantas para o “Fora, Temer!” Em 1º de janeiro de 2019, começou o “Fora, Bolsonaro!”, com o patrocínio do consórcio de imprensa, das lojinhas de porcentagens, das bestas quadradas de distintos setores, de banqueiros sensíveis e, sobretudo, dos ministros do Supremo Tribunal Federal. É a conspiração dos democratas que odeiam a liberdade.

Como o janismo, o getulismo, o ademarismo, o brizolismo, o lulismo morrerá com a morte física do único deus da seita. Como em todas as ramificações do populismo, o chefe não tem programa administrativo, ideário político, opção ideológica — nada disso. E por isso mesmo não tem herdeiros. Sem Lula, o PT logo será apenas uma má lembrança. Em contrapartida, o partido liberal-conservador que vai tomando forma tem o que falta aos devotos de um ex-presidiário. As urnas identificaram vários líderes da direita democrática qualificados para garantir a sobrevivência das ideias libertárias defendidas por milhões de eleitores de Bolsonaro.

Apesar de tais e tantas evidências, seguem zanzando por aí sabujos de Lula que reincidem na exigência desvairada: o país deve engolir sem engasgos um demagogo que mistura vulgaridade, insolência, estupidez e presunção, fora o resto. Que esperem sentados esses surdos à voz das ruas. As palavras de ordem já enunciadas pela multidão serão condensadas em quatro vogais e quatro consoantes: “Fora, Lula!”

Título e Texto: Augusto Nunes, Revista Oeste, nº 140, 25-22-2022

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