Gustavo Nogy
"Em seus próprios termos,
muito particulares termos, não se pode negar que Jair Bolsonaro saiu-se bem no
embate com William Bonner e Renata Vasconcellos, no Jornal Nacional. Se as
entrevistas são batalhas, o candidato do PSL venceu a sua. Ciro Gomes perdeu a
dele.
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Foto: Antonio More/Gazeta do Povo |
Com Jair Bolsonaro foi
diferente. Méritos à parte, e os leitores desta Gazeta sabem o que penso sobre
seus méritos, ele deu o que em futebol chamamos de “nó tático” na bancada do
JN. Ele e sua militância queriam que lhe fossem feitas aquelas perguntas. E os
apresentadores fizeram exatamente aquelas perguntas.
Fiquei impressionado.
Perderam-se na selva selvaggia da
argumentação bolsonariana. Como João e Maria à procura de doces, trombaram com
a bruxa. No caso, o bruxo.
Porque se você quer arrumar
problemas para Jair Bolsonaro, não lhe faça perguntas sobre diferenças
salariais entre homens e mulheres, homofobia, racismo, violência policial. Seu
público espera pelo brilhareco oratório transformado em meme. As respostas mais
ríspidas, as frases de efeito mais explosivas, as simplificações mais
elementares. Quanto mais simples, melhor.
Não quero dizer com isso que o
eleitor do Bolsonaro é, necessariamente, o pior eleitor que existe. Não afirmo
que seu eleitor seja um maluco sexista, um supremacista branco, um saudoso da
ditadura militar. Alguns são, porém não se trata apenas disso.
Trata-se do seguinte: entre a
absoluta liberdade de costumes e o mais rigoroso moralismo, entre o machismo
empedernido e o feminismo fanatizado, há nuances, claros-escuros, que parecem
não ser captados pelo radar do mainstream
jornalístico e intelectual.
O eleitor do Capitão pode não
ser misógino, mas já não aguenta mais o artificialismo do discurso de igualdade
de gêneros; quem vota nele não é o agressor de mulheres, mas aquele que já não
quer saber de ressocialização de bandidos num país de 60 mil homicídios por
ano; e também já aprendeu que direitos trabalhistas não significam mais
trabalho, e sim menos.
Ele manipula muito bem certo
capital simbólico e um conjunto de crenças e urgências que fazem sentido para
muita gente. Fazem sentido porque de fato têm sentido. De certa maneira, a intelligentsia burguesa e universitária,
liberal e progressista, perdeu o fio da meada cultural – e moral – da política.
Não somente no Brasil, a propósito.
Transformar as pautas
quentíssimas de Bolsonaro em declarações de guerra termina por confundir a
visão de quem o tenta compreender e, portanto, neutralizar. Sua candidatura não
é a melhor, os meios que imagina para resolver os problemas me parecem
estúpidos ou vagos, mas seu sucesso indica problemas e demandas existentes.
Você não entrevista Jair
Bolsonaro confrontando-o com o que, na sua opinião, ele tem de pior, porque
onde você vê o pior, ele e seus eleitores veem o melhor. Não é o meu caso,
sinto muito, concordemos em discordar sobre isso.
Para “matar” Bolsonaro, a
entrevista deve ser fria. As pautas devem ser frias. Candidato, o que o senhor
pretende fazer com a pequena margem orçamentária à disposição do presidente?
Privatizaria mesmo todas as estatais? Qual é sua visão sobre a reforma tributária?
Na reforma da previdência, quais são os critérios? Como se dará a negociação
com o Congresso? O que tem a dizer sobre o voto distrital?
Perguntas assim forçariam Jair
Bolsonaro a pensar um pouco, a ponderar para responder, a refletir sobre as várias
possibilidades em jogo. E pensamento, ponderações e reflexão não costumam ser
suas atividades desportivas prediletas.
Aconteça o que acontecer,
Bolsonaro é um fenômeno político tão poderoso quanto Lula. Cada um à sua
maneira, ambos souberam falar com seu público, manejar seus valores, alimentar
suas expectativas, identificar seus inimigos.
O getulismo – nosso
sebastianismo sem transcendência – ainda tem muito o que oferecer à história do
país."
Título e Texto: Gustavo Nogy, Gazeta do Povo, 29-8-2018
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